Paquistaneses temem piora do conflito com talibãs após ataque a aeroporto
Investida contra aeroporto internacional de Karachi, o mais importante do país, mostra poder dos islamistas, avaliam analistas. Ataque também teria exposto lacunas no mecanismo de segurança do país.
Com mais de 15 milhões de habitantes, Karachi é a maior cidade do Paquistão. Seu aeroporto, Jinnah, é o mais movimentado do país, tanto para voos domésticos quanto para internacionais, sendo usado por quase 44 mil passageiros por dia. Na noite do último domingo, militantes talibãs invadiram o Terminal 1 do aeroporto, sitiando-o até a manhã desta segunda-feira. Poucas horas depois, nesta terça-feira (10/06), dois homens armados dispararam vários tiros contra uma unidade de treinamento das forças de segurança do aeroporto.
O segundo ataque não deixou feridos, mas no de domingo, quase 40 pessoas morreram na troca de tiros entre os extremistas e as forças de segurança paquistanesas incluindo ao menos 11 guardas do aeroporto, quatro funcionários da Pakistan International Airlines (PIA) e os dez combatentes islâmicos.
Ninguém no país jamais teve dúvidas quanto à capacidade dos talibãs paquistaneses de lançar um ataque fulminante. Os extremistas islâmicos já atacaram bases e instalações militares por todo o país, mas quase ninguém esperava que eles tentassem assumir o controle do aeroporto de Karachi, fortemente vigiado.
"O que nossas agências de inteligência 'onipresentes' estavam fazendo? Elas estavam ocupadas banindo canais de notícias críticos e páginas do Facebook, enquanto negociavam e apaziguavam os talibãs?", criticou um usuário paquistanês do Twitter.
Desde o início, houve dúvidas sobre as chances de sucesso das negociações de paz entre o governo do primeiro-ministro Nawaz Sharif e o movimento Tehreek-i-Taliban Pakistan (TTP). As conversas foram interrompidas um mês atrás: os talibãs não cessaram os ataques e, em retaliação, o Exército lançou uma ofensiva terrestre e aérea na região do Waziristão, no noroeste do país.
Os talibãs têm empreendido um movimento de insurgência no Paquistão há cerca de uma década, com o objetivo de impor uma lei islâmica mais rigorosa no país e também no vizinho Afeganistão. Os radicais islâmicos reivindicaram a responsabilidade pelo ataque ao aeroporto, no último domingo, afirmando que isso seria uma resposta aos ataques militares aéreos paquistaneses nos bastiões dos talibãs perto da fronteira com o Afeganistão.
"O principal objetivo deste ataque foi prejudicar o governo, sequestrando aviões e destruindo instalações estatais", disse Shahidullah Shahid, um porta-voz dos talibãs, num comunicado divulgado poucas horas depois do ocorrido. "Isso foi apenas um exemplo do que nós somos capazes de fazer, e há mais por vir. O governo deve se preparar para ataques ainda piores."
Nesta terça-feira, o Talibã paquistanês também assumiu a autoria da segunda investida, contra a unidade de treinamento do aeroporto de Karachi.
Abdul Sattar, analista político de Islamabad, é da opinião que os combatentes islâmicos enviaram uma "mensagem clara ao mundo de que estão vivos e ativos e podem atacar à vontade", apesar das afirmações das autoridades paquistanesas de que os talibãs teriam sido enfraquecidos e fragmentados.
Superioridade talibã
Sabin Agha, jornalista e documentarista baseado em Karachi, considera que o ataque ao aeroporto foi uma "prova da superioridade dos talibãs, de sua disciplina, de seu planejamento", acrescendo que os militantes "estão sempre um passo à frente" das agências de segurança. "Afinal, como um punhado de terroristas pôde manter o Paquistão isolado do resto do mundo por mais de 13 horas?", acrescenta.
Como muitos paquistaneses de orientação liberal, Agha acha que o ataque de domingo foi a gota d'água num longo conflito armado e que deveria haver uma ação militar decisiva contra os talibãs.
"Eles [os talibãs] ficaram claramente nervosos com a falta de progresso nas negociações, e quando o Exército avançou no Waziristão, eles provavelmente ficaram bastante frustrados", diz Agha. "Eu não acho que eles devam participar de diálogo algum após um ataque tão ousado contra a soberania do Paquistão."
Saleem Asmi, ex-editor do mais influente jornal em língua inglesa do Paquistão, Dawn, afirma que o ataque ao aeroporto teve como objetivo influenciar a opinião pública, para exigir a retomada das negociações de paz.
Danos à economia
O conflito afetou severamente a economia paquistanesa. "Chega de esconde-esconde entre o governo e os talibãs", diz Tahir Ahmed, empresário de Karachi. "Nossos negócios foram arruinados." Apesar das repercussões econômicas, há pessoas que temem que o governo em Islamabad não persiga os talibãs.
"Os talibãs paquistaneses poderiam ter sido eliminados militarmente ou por meio de ações policiais", disse Snehal Shingavi, especialista em Ásia Meridional da Universidade do Texas. "Tudo indica que eles não são tão fortes ou sofisticados. Mas o Exército paquistanês o usou como parte de um jogo estratégico no Afeganistão, e provavelmente vai continuar a fazê-lo."
Analistas como Sattar, de Islamabad, dizem ser improvável que o aparato de segurança paquistanês aprenda uma lição com o ataque ao aeroporto e mude sua política frente aos extremistas islâmicos. "Os generais paquistaneses têm objetivos de longo prazo na região. Se eles não fizeram nada após os ataques às suas bases navais, eles também não irão fazer nada agora."
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