Ex-presidente alemão lança livro com sua versão do escândalo que o derrubou

14:51 | Jun. 11, 2014

Após renúncia e posterior absolvição em processo por corrupção, Christian Wulff apresenta à imprensa obra contendo sua interpretação pessoal dos fatos que levaram à sua queda do posto de chefe de Estado. Ganz oben Ganz unten(bem em cima, bem embaixo) é o título estampado em grandes letras azuis na capa do livro. Christian Wulff vivenciou ambos os extremos muitas vezes, tanto como político, como enquanto cidadão comum. Por isso, é compreensível que seja descrita dessa forma sua visão das circunstâncias que levaram à sua renúncia do cargo mais alto do Estado alemão e suas consequências. Mas embora ninguém ainda tenha lido a obra, apresentada nesta segunda-feira (10/06) em Berlim, não demorou para que fossem ouvidas duras críticas ao livro antes mesmo de sua publicação. Ulrich Schneider, presidente da federação que reúne entidades assistenciais alemãs (Der Paritätische), classificou o título da obra como um "erro constrangedor" e "insensível", argumentando que estar "bem embaixo", no caso do ex-presidente, significa "receber 200 mil euros mensais para o resto da vida, com direito a motorista e escritório". Tudo isso pago pelo Estado. "Esse é um padrão fora de qualquer alcance para o cidadão comum", desabafou Schneider, em entrevista ao portal de notícias Handelsblatt Online, afirmando que isso é um insulto para as pessoas que realmente estão "muito embaixo". Schneider se refere especificamente aos mais de seis milhões de beneficiários de ajuda social do Estado. História para filmes e livros Essa primeira reação combina, de alguma forma, com Wulff. Tudo o que ele faz logo se torna motivo de crítica. Mesmo que a pessoa em questão realmente não tenha tido oportunidade de ter o trabalho, já que o livro permaneceu estritamente sob sigilo até a data de apresentação à imprensa. Independente do fato de a crítica ter fundamento ou não, é certo que o livro deve se tornar automaticamente um best-seller. A fama do autor, a queda da presidência em 2012, sua absolvição num processo de corrupção neste ano: esta é uma história digna de filmes e livros. A estação privada de televisão Sat 1 já produziu um docudrama que será transmitido em fevereiro. Wulff teria ficado pouco satisfeito com a ideia. Em seu livro, o ex-presidente retrata como tudo talvez poderia ter sido. O cenário da apresentação foi o prédio em Berlim onde, três vezes por semana, o porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, expõe a política da chanceler federal Angela Merkel. Wulff não pôde utilizar o auditório principal. Mas o comparecimento foi tão grande que o recinto do evento teve que ser ampliado, com a remoção das paredes divisórias de quatro salas de reuniões. Tantos jornalistas assim só aparecem ali quando a chanceler alemã comparece pessoalmente para uma entrevista coletiva. Nem memórias, nem mea-culpa Com a escolha do local, Wulff e sua editora mostraram faro para a recepção que almejam. Porque, claro, as reflexões pessoais do ex-presidente devem ser abordadas pelos cadernos de cultura do país inteiro. Wulff afirma que este é um livro político: "Para a cultura política de nosso país." O autor também ressalta que a obra, de 256 páginas, "não é um livro de memórias, não é uma tentativa de se justificar, nem um acerto de contas". Mesmo assim, Wulff critica o papel dos meios de comunicação, especialmente o poderoso tabloide Bild, para o qual o político de 54 anos concedeu durante muito tempo de sua carreira política uma visão exclusiva de sua vida privada. Quando o jornal parecia se tornar perigoso para o presidente, por divulgar reportagens sobre supostas inconsistências financeiras, veio o rompimento. E Wulff aparentemente se considera uma vítima. "Insisto em me opor a esse poder da mídia", afirmou. Ele admitiu que cometeu erros e citou como exemplo, entre outras coisas, as viagens de férias que realizou com um empresário amigo. Ele admite que em alguns momentos faltou um pouco da distância que seu cargo político requeria. Depois de 45 minutos de discurso, perguntas e respostas, Wulff manifestou um desejo: que seu livro seja lido com mente aberta, sem que se procure alguma coisa específica nele. As primeiras impressões logo poderão ser colhidas pelo ex-presidente nas várias resenhas que, sem dúvida, logo começarão a ser publicadas. A julgar pelo grande comparecimento da mídia, nos próximos dias os jornais estarão cheios delas. Cerca de 250 repórteres, fotógrafos e cinegrafistas, nacionais e estrangeiros, lotaram a sala da apresentação. E ninguém foi embora antes do final: os exemplares para a imprensa só foram distribuídos após o encerramento.