Terrorismo se fortalece e ameaça região do Magreb
16:36 | Jan. 23, 2013
Ataque ao campo de gás na Argélia evidenciou o elevado grau de organização dos terroristas que atuam no Magreb. Novos atentados poderão ameaçar os estados nacionais e fomentar uma nova ordem política na região.
Os terroristas estavam bem preparados, de posse não apenas de armas pesadas, mas também de um mapa das instalações do campo de gás In Amenas, no leste da Argélia. Eles haviam espionado detalhadamente a unidade, com o apoio de funcionários.
A ideia inicial era negociar com os sequestradores, afirmou o primeiro-ministro argelino, Abdelmalek Sellal. Mas as exigências dos terroristas, sobretudo os pedidos de libertação de diversos companheiros, não poderiam ser cumpridas, disse o chefe de governo. Sendo assim, optou-se pelo contra-ataque, apesar da amplitude das instalações, que se estendem por uma área superior a quatro hectares. Todo o campo de gás ocupa outros dez hectares.
Operação arriscada
A ação de libertação foi arriscada, e ao menos 37 reféns não sobreviveram a ela. O número pode aumentar, pois alguns cadáveres ainda não foram identificados. A ação deixou também 32 terroristas mortos. Outros foram detidos.
Sellal qualificou a operação de um "sinal claro" ao terrorismo em seu país. Segundo ele, a Argélia provou sua capacidade de conduzir uma ação como essa. "Todos os países do mundo elogiaram essa capacidade e reconheceram a conduta do país em relação aos reféns", completou o premiê.
As forças de segurança da Argélia estavam preparadas, pois esperavam há muito ataques e atentados do gênero. O terrorismo continuou existindo depois da guerra civil dos anos 1990, diz o especialista em norte da África William Lawrence, do think tank International Crisis Group, em entrevista à Deutsche Welle. "Em 2002, a Argélia declarou o fim da década negra, mas os protagonistas de antes continuaram presentes", analisa. Os perigos desencadeados por eles diminuíram, mas jamais deixaram de existir, completa o especialista.
Sahel: reduto de terroristas
Uma coisa, porém, mudou, avalia o cientista político Rachid Ouaissa, da Universidade de Marburg. Segundo ele, a longa guerra contra o terrorismo fez com que ele praticamente desaparecesse no norte do país. "Em vez disso, os terroristas se deslocaram para o sul, para a região instável do Sahel, onde continuaram em atividade", salienta. A região é de difícil controle, ainda mais depois da derrocada do regime de Muammar Kadafi na vizinha Líbia. "Soma-se a isso o fato de o Mali ser um Estado em decadência há dez anos."
Exatamente na região limítrofe entre a Argélia e o Mali, os terroristas encontram um terreno ideal para se instalar, diz Lawrence, pois eles conhecem bem o Saara. "Eles se deslocam muito rapidamente em distâncias de milhares de quilômetros. E fronteiras não têm a menor importância para eles", completa.
Os terroristas se beneficiam do fato de essa região enorme e de difícil acesso ser praticamente impossível de ser controlada pelo Estado, especialmente do lado do Mali. "Eles tiram proveito da fragilidade do Estado para fomentar seus negócios: eles traficam drogas, armas e pessoas. E também sequestram", acrescenta Lawrence. Eles se aproveitam dos problemas sociais e políticos do país para se estabelecer e recrutar adeptos, resume.
Planos para tomar o Norte da África
Mas a criminalidade não é o unico propósito dos islamitas, diz Ouaissa. No mais tardar depois dos atentados do 11 de Setembro, o terrorismo ganhou uma nova dimensão, servindo agora para estabelecer novas relações de poder nos países que circundam a Europa. "Primeiro eles tinham em vista a região antes chamada de 'Terceiro Mundo'", diz o especialista. Depois foi a vez do Oriente Médio.
"No momento, os braços do terrorismo se estendem rumo à periferia, em direção à África", observa Ouaissa, para quem a ordem surgida depois da independência das ex-colônias africanas de suas antigas metrópoles está chegando ao fim. "E uma nova ordem está sendo delineada, na qual os Estados da periferia se esfacelam." Nesse contexto surgem novos protagonistas, que tornam a situação política muito mais complexa. "Não temos agora mais que lidar com um único ditador no Mali, mas sim com uma série de envolvidos", analisa Ouaissa.
Novas estratégias para novos desafios
Isso vai levar a um período de muitos tumultos no Chade, no Mali, no Níger e provavelmente também na Mauritânia. Não é de todo improvável que esses Estados se desestruturem e neles surja uma nova ordem. A Argélia, por sua vez, sai fortalecida do conflito envolvendo os reféns. "O país vai se transformar no Estado que centraliza o poder na região. Pois, com a demonstração de poder em In Amenas, a Argélia deu provas de ser um parceiro confiável do Ocidente", diz Ouaissa.
Por outro lado, a Argélia tem também que responder a muitas exigências. O ataque ao campo de gás evidenciou uma enorme fragilidade, como estampou o jornal argelino Al Fadjr. Segundo o periódico, a tomada de reféns por terroristas mostra como é urgente falar sobre novas estratégidas de combate ao terrorismo. "Entretanto, os militares não vão conseguir solucionar o problema sozinhos. É preciso envolver outras instituições: as escolas, as comunidades religiosas, bem como o governo e o Parlamento. Não é possível defender o Estado somente com armas", conclui Ouaissa.
Além da necessidade de um nova política econômica e social, é preciso acima de tudo argumentos. Pois fica cada vez mais claro que o terrorismo não se sedimenta apenas sobre condições sociais precárias, mas também e talvez principalmente sobre o enrijecimento ideológico daqueles que lutam em seu nome.
Autor: Kersten Knipp (sv)
Revisão: Alexandre Schossler