Modelo matemático de marés vai ajudar cientistas a restaurar área queimada do Cocó
Informação é essencial para saber mais sobre a dinâmica do solo, vegetação, enchentes e secas do Rio
17:04 | Dez. 03, 2024
Restaurar o que foi queimado pelos incêndios que assolam o Parque do Cocó ainda é um desafio. Os processos de degradação que resultaram na vulnerabilidade do local são estudados por cientistas que trabalham no programa Restaura Cocó. Uma das pesquisas usa modelos matemáticos da movimentação de marés.
Em 2021, um incêndio de grandes proporções destruiu cerca de 46 hectares do Parque. Em janeiro de 2024, outra vez o fogo se alastrou e queimou 10 hectares.
Em um documento que faz parte do Inquérito Civil Público para investigar o incêndio de janeiro, o Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (CBMCE) relata registros de pelo menos 50 incêndios nos últimos dois anos.
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Em visita ao local de mais um incêndio, registrado nesta segunda-feira, 2, próximo a área da grande ocorrência de 2021, o cientista chefe do Meio Ambiente, Luís Ernesto Arruda, explicou que dois estudos são realizados no local para planejar o restauro ambiental.
São eles a topografia, para ver as condições de elevação do terreno, e a batimetria, realizada para medir a profundidade do Rio Cocó em diferentes áreas, da foz até a BR-116. Os levantamentos foram iniciados em novembro e devem ficar prontos no início de 2025.
Os resultados dos dois estudos serão utilizados para montar um modelo matemático e permitir a projeção em 3D do movimento das marés. Isso deve ajudar os cientistas a entender se a água do mar ainda chega em determinadas áreas do Parque.
A informação é essencial para saber mais sobre a dinâmica do solo, da vegetação e das enchentes e secas do Rio.
“A gente não sabe como é hoje a dinâmica da maré. A gente sabe que um dia a água do mar chegou aqui porque o bairro se chama Lagamar e havia salinas. Mas a gente não sabe se hoje a água do mar continua chegando, porque teve várias intervenções ao longo das décadas, construção de avenidas, de pontes. Tudo isso pode ter feito com que a água do mar não chegue mais ou chegue em um menor fluxo”, explica.
Salinas que funcionavam nos anos 1960 ainda impactam o Parque do Cocó
Uma das atividades que ainda gera impacto no local foi o funcionamento de salinas nas décadas de 1960 e 1970. Na época, foram construídos diques para mudar o curso da água do mar. Mais de 50 anos depois, essas barreiras ainda existem. A vegetação de mangue que existia anteriormente também nunca conseguiu ser restaurada por completo.
Isso pode ter grande influência nas secas do local, segundo Luís Ernesto. “Esses diques impedem que a água entre e torne esse ambiente constantemente alagado”, afirma. Sem esse fluxo, a área sofre secas no segundo semestre do ano, quando não há chuvas.
“O programa Restaura Cocó prevê que a gente recupere essa água para tornar essa área menos dinâmica, deixá-la mais constante. Porque esse dinamismo é o que faz isso acontecer. Vira um lago [no período chuvoso], enche de planta aquática, o lago seca, morre a planta aquática e fica tudo seco, e aí é combustível para incêndio”, explica.
Com o modelo matemático e a informação do comportamento da maré, é possível traçar planos de ação. As medidas podem envolver o rompimento dos diques e a restauração da área de mangue, se a água salgada ainda chegar ao local.
“Se não chegar, você não vai plantar mangue, você não vai plantar vegetação que seja de água salina, porque não chega mais sal. Você vai ter que tornar o lago perene, para que ele não seque, com espécies aquáticas de água doce”, detalha.