Esculturas em condomínios: Lei Municipal determina a presença de obras de arte nos edifícios
Em Fortaleza é obrigatória a colocação de obras de arte de artistas plásticos cearenses nas praças e edificações públicas e de uso público de FortalezaPautadas no equilíbrio, simetria, racionalidade e clareza, esculturas neoclássicas e modernas tornaram-se frequentes na entrada de edifícios residenciais. Em Fortaleza é obrigatória a colocação de obras de arte de artistas plásticos locais nas praças, imóveis e edificações de uso público.
Conforme a Lei n°7503 de 1994, de autoria dos deputados estaduais Artur Bruno (PT) e Chico Lopes (PCdoB), imóveis que possuam área igual ou superior a dois mil metros quadrados e praças com cinco mil metros quadrados devem ter um espaço reservado para a instalação de obras de arte.
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Conforme consta no site da Câmara Municipal de Fortaleza, a lei está em vigor e não houve alterações posteriores à data da publicação.
O documento foi publicado em 18 de janeiro de 1994 e orienta que “as praças públicas existentes com área igual ou superior a 5.000 m2, ao serem reformadas devem obedecer o estabelecido nesta lei, preservando-se as obras já existentes”.
Ainda segundo a peça, o valor a ser destinado para a aquisição e/ou execução de obras de arte não pode ser inferior a 1% do valor da edificação, corrigidos pelos indicadores da época do pagamento do serviço.
Os monumentos destinados ao condomínio devem ser construídos com material durável e, conforme o texto, é obrigatório que o artista plástico esteja devidamente cadastrado junto à Fundação Cultural de Fortaleza.
Para a arquiteta, urbanista e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), Tania Vasconcelos, o cumprimento desta Lei pode transformar o espaço urbano de Fortaleza em um local propício à contemplação da arte junto com a paisagem.
“Enquanto arquiteta e urbanista, pesquisadora da arte no espaço urbano, espero que Fortaleza também caminhe para a edificação do seu Museu a céu aberto, até porque nossa cidade já tem a luminosidade favorável a iluminar tudo de belo que venha agregar valor à sua paisagem”, complementa.
A norma também vigora nos estados de Pernambuco (desde 1961) e Distrito Federal (desde 1999). Os textos determinam que edifícios ou praças com área superior a mil metros quadrados em construção ou que vierem a ser construídos nos referidos estados devem conter em lugar de destaque uma obra de arte ou escultura. O intuito é que as obras sejam produzidas pelos artistas locais.
A aplicação do texto fez com que os dois estados se transformassem em museus a céu aberto.
Apesar de mais comuns, as esculturas não são as únicas obras de arte a serem instaladas nas unidades habitacionais. Conforme a Lei, entende-se como obra de arte, todo painel, escultura, mural, mosaico ou similar que integre o projeto do edifício, não podendo dele ser desmembrado.
"Por ser uma Lei, deveria estar tendo eficácia. À época, houve muita discussão com os artistas plásticos de Fortaleza e chegamos à conclusão que a cidade precisava ser mais bonita, mais criativa. As obras deveriam estar presentes nas praças, logradouros públicos e condomínios”, explicou Artur Bruno, um dos auores do Projeto de Lei.
O atual assessor especial de assuntos municipais reforçou que o texto não determina que a arte seja cara, mas que poderiam ser esculturas, pinturas e obras de arte compartilhadas ou doadas por entidades e empresas.
“Não tenho mais conhecimento de atualização sobre essa Lei, esse debate não voltou, faz 30 anos que essa Lei foi sancionada pelo então prefeito de Fortaleza, Antonio Cambraia. É uma boa ideia ser contemplada pelos candidatos a prefeito de Fortaleza”, complementou.
O professor de História da Arte da Universidade de Fortaleza (Unifor), Carlos Velázquez, explica que a presença dos monumentos no recinto cria um “contraste interessante” entre as estátuas neoclássicas e a arquitetura.
“Ainda entre o século XVIII e XIX foi deixada uma marca muito forte atrelada ao Neoclassicismo que, ao mesmo tempo, é chique, porque é da burguesia girondina, mas também é intelectual porque é da burguesia jacobina”, explicou.
Esse tipo de escultura pode ser identificada pela semelhança com a realidade, como esculturas de silhuetas e rostos. Normalmente as peças são esculpidas em granito, mármore e calcário, materiais que facilitam a lapidação.
A instalação de obras em edifícios residenciais variam de acordo com a proposta arquitetônica do condomínio e vão desde painéis pintados em pastilhas ou azulejos, a esculturas que utilizam aço Corten. Este material é composto por aço rico em elementos que melhoram as propriedades anticorrosivas.
Indiana
Os bons observadores que transitam entre as ruas Leonardo Mota e Pereira Valente, no Meireles, conseguem reparar que, no jardim do edifício Indiana há uma mulher esculpida em fibra de vidro.
A peça está erguida sobre uma estrutura semelhante a um vaso de planta, que está sustentado por um vaso maior. No meio da base menor está uma mulher com braços abertos e esticados para cima.
A obra foi inspirada na romena Nadia Comaneci, prodígio da ginástica que surpreendeu o mundo inteiro ao realizar uma sequência perfeita nas barras assimétricas, o que rendeu a ela o primeiro 10 da história dos Jogos Olímpicos.
O feito ocorreu durante os Jogos de Montreal, no Canadá, quando Nadia tinha apenas 14 anos de idade. A série durou menos de 20 segundos, mas os movimentos precisos deixaram os árbitros admirados.
A posição simétrica, conforme explica o arquiteto e dono da Reata Engenharia, Jayme Leitão, se harmonizava com a linha arquitetônica do Indiana, um projeto de arquitetura pós-moderna inspirado na arquitetura clássica: base, corpo e coroamento.
“Essa arquitetura combinava com a inspiração clássica da figura feminina da Nadia Comaneci. Eu queria ela porque dialoga com o equilíbrio e perfeição. Uma escultura moderna não ia combinar com a linha do projeto”, compartilhou.
A obra foi apresentada ao escultor Walter Monte, que trabalhava com peças em fibra de vidro. A ideia de esculpir a peça com o material se deve à baixa manutenção e a resistência à corrosão. A escultura foi construída em 1995 e permanece no local até os dias atuais.
Inicialmente a estátua atuava como uma fonte de água, contudo, devido à má qualidade do fornecimento de energia.
Paço do Bem
Quem atravessa o hall do condomínio Paço do Bem em direção aos apartamentos erguidos na extensão se depara com uma fonte de água no centro do jardim. A escultura do edifício, localizado no Meireles, foi instalada no terreno em 2010, ano em que a construção do residencial foi finalizada.
O monumento conta com a imagem de seis cavalos agrupados um ao lado do outro em formato de hexágono e, acima deles, uma base no mesmo molde sustenta a silhueta de seis sereias. É possível identificar que a base contém o rosto de leões aplicados à sua volta.
De acordo com o administrador do condomínio, Jonas Fontenele, o monumento foi esculpido especialmente para o condomínio e teve como inspiração a Fonte das Nereidas, instalada em 1929 na Praça da Lagoinha, em Paraipaba, distante 106 km de Fortaleza. No ano de 1984, a fonte, apelidada carinhosamente como “Fonte dos Cavalinhos” foi transferida para a Praça Murilo Borges, mais conhecida como Praça do BNB, onde hoje fica a sede da Justiça Federal.
O responsável por esculpir a fonte de água do condomínio foi o pintor, gravador e escultor alencarino, Átila da Silva Calvet, o Ascal. Suas esculturas são reconhecidas pela presença de metais, pedras, madeiras e resinas. O monumento, contudo, foi encomendado pelo presidente da construtora, Dr. Pio.
“A arte valoriza o ambiente, provoca o sentimento de belo, traz aquele sentimento que você tem quando olha a lua cheia e diz ‘que coisa linda’, por um momento você sai das preocupações diárias”, explica o arquiteto e expert em Arte, Pedro Boaventura.
As características das obras, conforme o arquiteto, variam de acordo com os artistas, contudo, é habitual que os monumentos presentes em áreas residenciais sigam um viés minimalista, voltados à arte abstrata geométrica.
“Se o morador tiver sensibilidade para isso, ele pode ter o sentimento de belo, achar aquilo bonito, ou não, porque nem sempre as linguagens das obras de arte são as linguagens que o público entende ou gosta”, complementa Boaventura.
Jatiúca
“Essa obra é o rosto da Iracema?”, perguntou um dos funcionários que trabalham no Edifício Jatiúca, localizado na esquina entre as ruas Silva Jatahy e Tibúrcio Cavalcante, no Meireles.
O alvo do questionamento do colaborador é uma escultura presente no jardim do condomínio. A peça foi encomendada pelo arquiteto Jayme Leitão e possui cerca de dois metros de altura.
O rosto se assemelha a uma máscara e foi esculpido em cimento armado em concreto. A inspiração surgiu durante uma visita ao Chile, quando Jayme viu o rosto da poetisa chilena, Gabriela Mistral esculpido em uma rocha.
“Nós fizemos um rosto de gesso e procurei um artista que faz esses anões de jardim e falei que queria que ele fizesse um rosto na altura de dois metros. E ele fez”, explicou.
Questionado acerca de quem é o rosto presente na escultura, Leitão revelou que “não é de ninguém, apenas um rosto”. “O feminino me agrada muito, mas não é uma regra que as esculturas sejam mulheres, cada caso é um caso”.
Mirador
Migrando do estilo neoclássico para o moderno, é possível identificar que uma obra abstrata na cor vermelha reside no condomínio Mirador, localizado na rua José Napoleão, no Meireles.
A obra é feita de fibra e foi esculpida para dialogar com o estilo moderno do residencial, construído em 2019.
Fernanda de Castro
Seguindo o viés da modernidade, a escultura abstrata do escultor Walter Monte harmoniza o Edifício Fernanda de Castro, localizado na rua Osvaldo Cruz, no Meireles. A proposta principal do monumento é dialogar com o jardim vertical do edifício.
“Eu queria uma escultura abstrata na forma orgânica, para combinar com o jardim”, explica o arquiteto Jayme Leitão, responsável pelo projeto arquitetônico do prédio.
A obra de arte consiste em dois arcos deformados unidos um ao outro, semelhante a uma corrente. A escultura foi edificada sobre uma pedra e fica no jardim, na entrada do condomínio.