Praticantes de biodança celebram Dia Estadual no Parque do Cocó
Dia Estadual da Biodança foi celebrado pela 1ª vez no Ceará nesse sábado, 19. Para comemorar, praticantes se reuniram neste domingo, 20, no Cocó
18:05 | Out. 20, 2024
Entusiastas e facilitadores se reuniram, na manhã deste domingo, 20, no Parque do Cocó, em Fortaleza, para uma sessão especial em alusão ao Dia Estadual da Biodança, celebrado pela primeira vez no Ceará no sábado, 19.
Entre um chá revelação e crianças se divertindo no parque, o grupo de “bio-dançantes” realizou exercícios físicos, de mentalização e de interação ao som de músicas que variavam de “Hotel California” a Zeca Pagodinho.
A escolha do local não foi aleatória, disse Ruth Cavalcante, que é pesquisadora e professora de biodança. Por meio do projeto Viva o Parque, diversos cidadãos conheceram a prática da biodança no Cocó, ela explicou.
Uma dessas pessoas é Mariza Batista, 28, que começou a frequentar o parque para praticar , depois ioga e, então, biodança. “Eu via o pessoal dançando e uma amiga fez o convite. Eu vim, fui gostando”, contou.
“Mas, eu era muito tímida. As primeiras sessões foram mais difíceis por conta dos momentos de interação. Depois, fui conhecendo o pessoal, ficando mais desinibida, dançando, gostando. E também fui convidando outras pessoas”.
Mariza sublinha que biodança a ajudou a ter menos vergonha para falar. “Às vezes, você precisa interagir com desconhecidos. E você chegar no outro, chamar pelo nome, saber se o outro vai permitir seu toque, sua interação… Tudo isso você vai conhecendo, vai tomando consciência. É interessante”.
Para a fortalezense, praticar biodança foi “um divisor de águas”, porque “a gente sai da nossa bolha. E vai se expandindo, se conhecendo”.
Quem tem visão semelhante é Sandra Gondim, 52, que conheceu a biodança ouvindo a professora Ruth falar sobre. “Foi um divisor de águas, porque à época estava me separando e fui cuidar sozinha dos meus três filhos. A biodança me deu muito suporte, pelo estar em grupo, pelo carinho”.
“Antes eu ficava toda perdida, porque tem que olhar no olho da pessoa, aquela vergonha… A gente não sabe ser ser humano”, disse Sandra.
Sorridente, a assistente social aposentada Fátima Freitas, 68, complementou que, por meio da biodança, “você acaba tendo uma nova visão de mundo. Dia desses, vim um camaleão na rua, além do Cocó, e o ajudei a subir numa árvore. Esse é um dos sentimentos que a biodança ajudou a fluir em mim. É uma coisa de simplicidade que engradence muito”.
Quando soube da programação deste domingo no Cocó, a maranguapense “teve que ir”, afirmou. “Onde tem biodança, eu estou lá. Por conta da dança ser menos ensaiada, de você trabalhar com os sentimentos, verbalizar. Não é aquela coisa de fazer movimentos bonitos”, enfatizou ela.
Fátima pratica biodança desde a década de 1980, a convite de um amigo. “Daí, me apaixonei. Já fiz tanta coisa, viajei tanto com a biodança. Ela trabalha sua mente, sua felicidade, seu ser com o mundo. Não deixa de ser uma terapia”.
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O que é a biodança?
Em termos gerais, a biodança é método de desenvolvimento humano que, por meio da música e do movimento, elabora a relação de um indivíduo consigo mesmo, com os outros e com a natureza.
Ruth Cavalcante explicou que a biodança “trabalha com a sacralidade da vida”, isto é, o lado sagrado. O que “norteia a biodança”, segundo ela, é o princípio biocêntrico, de que a vida deve estar no centro de tudo.
“A gente ultrapassa o princípio antropocênico, de que o homem está no centro de tudo. Quando você traz a vida para o centro, tudo se potencializa”.
Ruth sinaliza que biodança não é terapia, “mas tem caráter terapêutico. Por isso, é preciso que a pessoa decida fazer. Não podemos trazer a pessoa sem ela querer. Há muita resistência, principalmente de homens, em se trabalhar”.
“Às vezes as pessoas ficam, ‘ah, eu não sei dançar’, mas não é isso. ‘Dança’ é um nome poético para o movimento humano. Cada um com seu movimento próprio, sentindo como pode se desenvolver”, narrou Ruth.
Ao se reunir em grupo, praticantes da biodança são conduzidos por um ou mais facilitadores, que têm preparadas rotinas de exercício com música.
Os participantes ficam a dois, em pequenos grupos ou em roda e dançam, sem coreografia, seguindo apenas orientações, anunciadas pelos facilitadores, como “feche os olhos e coloque a mão no coração”.
Uma das facilitadoras da sessão deste domingo foi Marina Aires. Para ela, a biodança “desenvolve potenciais genéticos que já carregamos. E a gente amplia a saúde em movimento. Mediados pela música e pelos exercícios, a gente desenvolve esses potenciais, por meio do encontro humano”.
“É uma oportunidade da gente voltar a se vincular consigo, com todos os seres viventes, e o todo. É lembrar que todos viemos do mesmo lugar. É lembrar do cuidado com a vida, de fortalecer sujeitos individuais e coletivos”, contou.
Na visão da assessora parlamentar, a sociedade atual “valoriza o racionalismo” e “desvaloriza o que vem desse lugar intuitivo, senvível”. Por isso, “a educação biocêntrica valoriza trabalhar com emoções, olhando para o ser humano, saindo da educação bancária, trazendo outras possibilidades”.
Marina concluiu que, por ser “algo vivencial”, a biodança não pode ser “totalmente descrita” por palavras. “Os convites precisam de um tempo, para as pessoas perceberem a profundidade do que é a biodança”.
A ideia foi reforçada por Sandra Gondim e Mariza Batista, que compuseram a roda deste domingo. Para a primeira, “só quem faz biodança sabe, de fato, o que é. Não dá para explicar em pouco tempo. É vivência”.
“Acontece através do corpo, mas é o espírito e a mente que vão se expandindo. Você vai vendo que todo mundo é igual. Todo mundo quer carinho, todo mundo quer conversar. Você tem esse desbloqueio dos outros”.
Mariza concordou: “Sempre que alguém pergunta o que é a biodança, eu digo, ‘tem que vivenciar’. A gente fala, mas não chega nem perto do que a gente vivencia. É pulsante, é movimento. A fala é só um terço do que acontece. Só no meio da roda é que você sente”.
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Como surgiu a biodança?
Pela junção do prefixo “bio” com a palavra “dança”, biodança pode significar “dança da vida”. O método foi idealizado pelo professor e pesquisador chileno Rolando Toro (1924–2010). Na década de 1960, ele pesquisou sobre expansão da consciência e da criatividade com pacientes psiquiátricos.
Nos estudos, Rolando tinha a música e a dança como aliadas. As experiências do psicólogo foram formando o que hoje é conhecido como biodança.
“Quando Roland desenvolveu a biodança, foi após perceber que a sociedade se distanciava cada vez mais do lugar do afeto, de lembrar que somos seres que precisam estar juntos”, comentou a facilitadora Marina Aires.
“Vislumbrando isso, ele criou esse método incrível, para voltarmos aos nossos gestos mais originais. É como se a gente fosse se integrando de novo à vida”.
Na década de 1970, o método se expandiu pelo Brasil, principalmente por meio das contribuições do psicólogo cearense Cezar Wagner de Lima Góis, professor aposentado da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Em 19 de outubro de 1982, aniversário de Cezar, foi fundada a Escola Nordestina de Biodança, com sede no Ceará. “Foi a primeira escola do mundo a formar facilitadores. E foi no Ceará”, enfatizou Marina.
“Hoje, há mais 200 escolas no mundo. Então, o Ceará é muito importante para o desenvolvimento da biodança”. A Escola Nordestina foi eventualmente desmembrada em instituições no Ceará, na Bahia e em Pernambuco.
Desde março de 2017, a biodança faz parte da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), do Sistema Único de Saúde (SUS). A inclusão foi oficializada pela portaria nº 849 do Ministério da Saúde (MS).
Quando foi instituído o Dia da Biodança no Ceará?
O Dia Estadual da Biodança foi instituído em 31 de julho último pela lei nº 18.962, de autoria da deputada estadual Larissa Gaspar (PT). O dia escolhido, 19 de outubro, faz referência à fundação da Escola Nordestina de Biodança.
Para Marina Aires, a existência de uma data no Calendário Oficial de Eventos do Estado “visa fortalecer a biodança enquanto política pública, ampliar o acesso e abraçar isso como algo que vai cuidar da saúde das pessoas”.
Onde praticar biodança no Ceará?
Diretora da Escola de Biodança do Ceará (EBC), Ruth Cavalcante reforçou que “não tem idade, gênero, critério nenhum” para participar de uma sessão. “Basta a sua vontade de evoluir e contribuir para evoluções”, explicou ela.
Segundo a professora, existem pelo menos 22 grupos de biodança em nove municípios do Ceará. Mais informações podem ser obtidas por meio dos perfis, no Instagram, da EBC e da Escola Comunitária de Biodança.