Cemitério na Grande Fortaleza promove Missa da Saudade e grupo de apoio ao luto

O grupo oferece encontros mensais e sessões online com foco em apoio emocional a pessoas enlutadas

"É o fim, mas pode ser o começo." A frase da canção Evangelho, de Paulo César Pinheiro e Dori Caymmi ressoa com aqueles que, diante do luto, buscam conforto e força para seguir adiante. Nessa perspectiva, o Cemitério Memorial Fortaleza promoveu mais uma Missa da Saudade, em Maracanaú, nesse sábado, 14.

Na ocasião, ocorreu, ainda, o Grupo de Amparo Emocional Revoar (Gaer), um espaço de acolhimento e suporte aos enlutados. A cerimônia atraiu diversos participantes, como Juarez Valdemir, pedreiro, que se emocionou ao falar sobre a importância de honrar a memória daqueles que partiram.

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"A gente tem aquela memória de ficar se lembrando todo ano. Essas celebrações trazem saudade, mas também nos unem como família. Perder alguém é difícil, mas a gente acaba se tornando ainda mais família nesses momentos", compartilhou Juarez.

Neuma Vieira, manicure, também encontra conforto nesses momentos de comunhão. Ela participa da celebração mensalmente, um hábito que começou há alguns anos após a perda do sobrinho e da mãe. "Todo mês eu venho para a Missa da Saudade. Eu gosto muito de celebração aqui. Sou muito bem recebida", afirma.

Para ela, o cotidiano traz lembranças constantes dos familiares, mesmo com o passar dos anos. "Lá na minha casa tudo é lembrança. A gente vem aqui e aí tem aquele conforto. Quando menos se espera, nos gestos da gente, a gente percebe que tá fazendo um gesto que ela (mãe) fazia", relata.

Lidar com a perda, segundo Neuma, é um caminho longo e doloroso, mas que, com o tempo, a angústia arrefece. "Eu estou começando a lidar com isso. Não é fácil não, mas a gente vai melhorando, vai compreendendo melhor."

Entre gestos miméticos e rituais simbólicos, são muitas as formas de processar a ausência de uma pessoa próxima. Brenda Santiago, coordenadora de marketing, conta que encontrou no trabalho um mecanismo para lidar com a dor, mas reconhece a importância de se permitir sentir e processar a perda.

“Eu vim buscar consolo. A dor é muito forte, mas é preciso viver e continuar. Tem sido difícil, principalmente quando estou sozinha, mas aqui, com o suporte da psicóloga, consigo acalmar meu coração e entender que a vida continua", disse Brenda.

Ela sofreu duas perdas importantes recentemente: a avó, há cinco meses, e outra pessoa próxima há um mês. "Eu preciso entender que isso aconteceu e que pode acontecer com qualquer um, e que é preciso passar por essa dor para continuar seguindo a minha vida".

Elaine de Tomy, psicanalista e vice-presidente do Instituto Revoar, destaca que confrontar a morte é um processo essencial para o luto e os rituais de despedida desempenham um papel crucial nesse processo.

Ela enfatiza que, tanto para adultos quanto para crianças, a integração desses momentos ajuda a compreender a finitude como uma parte natural da vida.

"Nós, ocidentais, tendemos a se distanciar dessa realidade como se ela não existisse e a gente precisa entrar em contato com ela e saber que ela faz parte. Então, quando você vela, presta as últimas homenagens, dá o melhor naquele momento, você dá início a vivenciar o processo de luto", explica.

 

Sobre a morte e morrer e as fases do luto

"É a mesma dor, É o mesmo luto. É a mesma falta", conta a manicure Claudiane Carlos sobre a perda do pai há seis anos, e do marido, mais recentemente, há quatro meses.

"Isso nunca passa. Um dia você tá bem, outro dia você não tá. A gente acorda bem, aí em meia hora a gente se transforma, que o mundo fica escuro de novo", completa.

Desenvolvida pela psiquiatra Elisabeth Kübler-Ross e apresentada em seu livro "Sobre a morte e morrer" (1969), a famosa teoria das cinco fases do luto descreve o processo pelo qual indivíduos enfrentam o falecimento.

Kübler-Ross identificou as fases como Negação, Raiva, Negociação, Depressão e Aceitação, com base em suas observações de pacientes terminais.

A teoria sugere que, inicialmente, a pessoa pode negar a realidade da perda, seguida por sentimentos de raiva e tentativas de negociar com o destino. Em seguida, pode haver uma fase de profunda tristeza e desesperança, até que finalmente, o indivíduo encontre uma forma de aceitar a realidade e seguir em frente.

A vice-presidente do Instituto Revoar explica que atualmente as abordagens na área caminham para incorporar o conceito de "luto dual". Este modelo, diferente do anterior, descreve uma flutuação emocional entre momentos de bem-estar e de sofrimento.

Essa variação é moldada pela estrutura emocional de cada pessoa, pelo suporte que ela recebe e por fatores adicionais, como traumas anteriores e condições sociais.

"A gente passa por todos aqueles sentimentos, não tem uma fase definida onde cada um vai passar. É a oscilação entre estar bem e estar mal. Ora eu me sinto frustrado, ora eu me sinto bem; ora eu estou sorrindo, ora eu estou chorando. E isso pode passar na pessoa que tem um ano, três, cinco, dez anos de luto".

Quando lembrar, quando esquecer

A esposa do José Valdely faleceu há um ano e 11 meses. Eles foram casados por 20 anos. "Eu vim desfazer dos objetos dela, de roupa, essas coisas", conta ele.

De olhar introspectivo e expressão pacífica, ele explica que em meio à gama de emoções que vêm e vão, a atitude é parte do esforço para ajustar a vida à nova realidade. "Quando eu olho para os cantos da casa e não vejo mais ela, ainda é muito difícil. Com 20 anos, você não desapega em dois dias".

A memória desempenha um papel crucial nesse contexto, exigindo a revisão das lembranças do ente querido, mas sem cair em um foco excessivo que pode levar à depressão. É a visão de Elaine de Tomy.

De acordo com a psicanalista, a palavra-chave para lidar o pesar não é superação, é aceitação.

"Sempre vai mexer com você, porque a gente não sabe lidar com a perda. Mas no momento em que você aprende a revisitar aquela emoção e consegue voltar para a sua vida, para o seu eixo, aí é quando você conseguiu ter uma aceitação".

Como participar

A Missa da Saudade é realizada no segundo sábado de cada mês no Cemitério Memorial Fortaleza, em Maracanaú.

O Instituto Revoar, por sua vez, oferece uma variedade de atividades, incluindo grupos de apoio para depressão e ansiedade, além de podcasts.

O Grupo de Amparo Emocional Revoar (Gaer) realiza encontros presenciais após a Missa da Saudade e também oferece sessões online às terças-feiras. Todas essas atividades são gratuitas e os interessados devem se inscrever pelo site https://linktr.ee/institutorevoar.

 

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