Aprovados em primeiro concurso para professores indígenas do Ceará tomam posse
Atualmente, 800 professores indígenas atuam na rede de 43 escolas indígenas. Com a posse, 18,25% serão concursados
18:18 | Jul. 31, 2024
Cocares e maracás enfeitaram a galeria do Palácio da Abolição nesta quarta-feira, 31, durante a posse de 146 professores indígenas em vagas efetivas da rede pública de ensino do Ceará. Os docentes foram aprovados no primeiro concurso para a categoria na história do Estado, lançado em junho de 2023.
Eles serão distribuídos em 30 escolas de 13 etnias indígenas cearenses. São elas Anacé, Gavião, Jenipapo Kanindé, Kalabaça, Kanindé, Kariri, Pitaguary, Potiguara, Tabajara, Tapeba, Tubiba Tapuia, Tapuia Kariri e Tremembé.
Para conseguir as vagas, os professores passaram por um processo seletivo com três fases, incluindo prova prática, escrita e avaliação de títulos. Todas as fases do concurso foram definidas em conjunto com as lideranças indígenas. Algumas delas participaram inclusive das bancas das provas de didática.
O governador Elmano de Freitas (PT) destacou que esse diálogo foi fundamental para o processo de construção do edital, que prevê a distribuição dos educadores conforme a etnia a qual pertencem.
“O professor indígena é participante e integrante daquele povo. A escola indígena, nesse caso, se constitui também como um instrumento de transmissão da cultura indígena para suas crianças, pros seus jovens”, afirma.
Muitos já lecionavam nas escolas dos territórios com contratos temporários há anos. É o caso de Rochelia de Sousa Vieira, indígena potiguara da aldeia Espírito Santo, em Monsenhor Tabosa.
“É um momento muito rico, único nas nossas vidas. Foi uma luta muito grande. É um marco tanto para a gente quanto para a escola”, afirma Rochelia, que agora será docente efetiva da escola Ybi Pirang. O colégio atende cerca de 160 alunos e terá três professores efetivos.
Além de Monsenhor Tabosa, outros 11 municípios terão professores indígenas concursados: Aquiraz, Maracanaú, Caucaia, Pacatuba, Itapipoca, São Benedito, Canindé, Aratuba, Crateús, Poranga e Tamboril.
A rede pública estadual é constituída de 43 escolas indígenas, com o atendimento de 8.399 alunos. Os professores serão lotados em turmas de Ensino Fundamental Anos Iniciais (1º ao 5º), Ensino Fundamental Anos Finais (6º ao 9º) e Ensino Médio. Atualmente, 800 professores indígenas atuam na rede. Com a posse, 18,25% serão concursados.
A professora Cleidiane Tremembé, indígena da Barra do Mundaú, em Itapipoca, discursou no palco da solenidade sobre a importância histórica do momento. “Estamos dando essa pausa para comemorar, para assumir o cargo público, mas também para reafirmar o nosso compromisso enquanto professoras e professores dos nossos territórios”, diz.
Para a chefe da Secretaria dos Povos Indígenas do Ceará (Sepince), Juliana Alves, a posse dos professores é a “concretização de um sonho coletivo”. Na época em que era professora de escolas indígenas, Juliana admitiu que muitos desacreditavam que o concurso realmente sairia do papel.
Em 2018, uma lei foi aprovada criando mil novas vagas para docentes do Estado. Em um dos artigos, ficou garantido que 20% delas deveriam ser para professores indígenas. Durante os seis últimos anos, a luta para a construção do edital, homologação, publicação e realização do concurso ganhou mais força.
Elmano acredita que o concurso é estratégico para garantir direitos. “É uma consolidação do projeto político de escolas indígenas do Ceará. Considero muito importante para a qualidade, para a segurança, para a melhoria salarial dos professores indígenas”, afirma.
O governador afirma que mais concursos para professores indígenas devem ser realizados, mas os certames ainda estariam em fase de planejamento. Segundo Eliana Estrela, secretária da Educação do Estado, melhorias estruturais nas escolas indígenas também são estudadas.
Posse de professores indígenas: bastidores
Os indígenas presentes na posse, incluindo lideranças como Cacique Pequena, do povo Jenipapo-Kanindé, e Raimunda Tapeba, do povo Tapeba, cantaram e dançaram com o governador Elmano de Freitas antes do início da solenidade.
O governador chegou a se emocionar e chorar enquanto os representantes dos povos discursavam. Ele relembrou no discurso a luta pela realização do concurso junto dos indígenas, quando ainda era deputado estadual.
Após cantar o hino do Brasil e do Ceará, os indígenas quebraram o protocolo e se levantaram para entoar uma cantiga tradicional. Os discursos saudaram os antepassados indígenas que deram origem ao repasse de conhecimento formal e ancestral debaixo de mangueiras e cajueiros, sem acesso a políticas públicas ou ajuda governamental.