Exposição Aquavelas transforma orla de Fortaleza em galeria de arte

As velas embelezaram o litoral do Mucuripe até a Barra do Ceará. A exposição faz parte do evento Povos do Mar, promovido pelo Sesc Ceará

17:11 | Jun. 23, 2024

Por: Lara Vieira
A travessia da Aquavelas 2024, do Mucuripe à Barra do Ceará, teve 60 jangadas participantes (foto: BEATRIZ BOBLITZ)

O litoral de Fortaleza amanheceu mais colorido com o desfile de jangadas do Aquavelas. Evento que já ocorre há cinco anos na Capital, o desfile de jangadas com as chamativas velas pintadas ocorreu neste domingo, 23.

A concentração das jangadas ocorreu na enseada do Mucuripe e, reunidas, chamaram a atenção de diversos visitantes que chegavam à praia. Em seguida, saíram em cortejo, embelezando o litoral até a Vila do Mar, na Barra do Ceará.

Realizado desde 2020, o Aquavelas tem como proposta ser uma exposição gratuita e itinerante. As 60 jangadas protagonistas do evento são de propriedade de jangadeiros provenientes de diferentes localidades de Fortaleza e Região Metropolitana, como Pirambu, Goiabeiras, Iparana, Pacheco, Mucuripe, Serviluz e Caça e Pesca. Já no lado artístico, foram 14 artistas plásticos cearenses convidados para a pintura das velas da exposição.

O que mudou na vida dos pescadores

Um dos jangadeiros que participa do evento é Elias da Silva Valente, 43, que tem 30 anos de experiência no mar. Nascido e criado em Fortaleza, o vínculo dele com a pesca começou aos 13 anos, quando começou a ajudar o namorado de sua mãe no ramo. "Ele reclamou que não tinha quem pescasse. As pessoas estavam abandonando a pesca”, relata.

Elias recorda os tempos antigos, quando a pesca era ainda mais difícil sem as tecnologias atuais. "Precisávamos remar longas distâncias, às vezes sem vento para ajudar, e muitas vezes perdíamos os peixes porque não havia gelo para conservar."

Hoje, a rotina de pesca mudou. No entanto, a diminuição do interesse dos jovens pela pesca é uma preocupação. "Se não há garantias ou apoio do governo, fica difícil para os jovens se motivarem a entrar na pesca."

Além de pescador participante do Aquavelas, hoje ele é secretário da Colônia Z8 de Pesca e Agricultura de Fortaleza. Elias enfatiza a importância do evento para a comunidade pescadora. "É essencial para mostrar que existimos e que a tradição dos jangadeiros ainda é forte. Muitos pescadores foram afastados das praias devido ao desenvolvimento e à especulação imobiliária, mas continuamos aqui, mantendo a tradição".

"Pintar uma jangada, que é um símbolo da nossa cultura"

Uma das duas jangadas de Elias foi pintada pela artista plástica cearense Ana Débora Pessoa, que há quatro anos colabora com o Aquavelas. Este ano, a vela que traz assinatura de Débora vem com o tema floral.

Para Débora, ver sua arte exposta no mar de Fortaleza é uma honra. "Pintar uma jangada, que é um símbolo da nossa cultura, é uma honra. Acho maravilhoso trabalhar junto com os pescadores, com os outros artistas, com os povos do mar que fazem parte desse projeto", destaca Débora.

A artista explica que o processo de pintura de uma vela, uma grande tela, requer muitos detalhes. “Precisamos considerar se vai realçar com o mar, o céu e a luz do sol. Pintar uma vela é completamente diferente de uma tela para um espaço fechado”, detalha.

Vando Farias, artista plástico há mais de 24 anos, participa do Aquavelas desde a primeira edição. Ele explica que suas obras são marcadas a partir de suas memórias afetivas. “Este ano, estou homenageando Santa Sara Kali, padroeira dos ciganos, além da minha filha, que nasceu no mesmo dia da santa”, diz.

A ligação de Vando com a praia e o mar é antiga, pois já teve uma jangada e trabalhou com pesca. Essa conexão se traduz na colaboração estreita com os jangadeiros no projeto. "Eles estão sempre presentes no processo, acompanhando tudo desde o começo. Embora não pintem, eles participam costurando as telas e nos ajudam a entender e respeitar o mar."

Conforme Elias Valente, secretário da Colônia Z8 de Pesca e Agricultura de Fortaleza, o trajeto das jangadas saindo do Mucuripe para a Barra do Ceará leva entre 35 a 40 minutos. O tempo é uma média entre todas as jangadas. Afinal, ele reforça, não é uma corrida.

A assistente pedagógica, Camila Saldanha, 28, veio com o esposo e o filho a Praia do Mucuripe justamente para apreciar a beleza das velas ao mar. Após assistir a saída das jangadas, a família se dirigiu à Barra do Ceará para assistir a chegada. "É tudo muito lindo. A gente sempre gosta de envolver as crianças na cultura e visitar eventos como esse, especialmente por ser gratuito", disse.

 

Povos do Mar

O desfile de jangadas é promovido pelo Sistema Fecomércio, por meio do Sesc Ceará, e compõe a programação do Povos do Mar. O projeto, que ocorre desde 2011, reúne mais de 200 comunidades tradicionais praianas do Estado para celebrar e discutir os saberes e os fazeres dessa cultura.

Henrique Javi, diretor regional do Sesc Ceará, descreve o processo de interação entre artistas e jangadeiros como uma extensão natural da essência do Povos do Mar. "Após uma década realizando o projeto, surgiu a ideia de ajudar e incentivas as novas gerações, os filhos e netos desses jangadeiros, mostrando que além da pesca, há um potencial produtivo e artístico", ressalta.

Na 14ª edição, o Povos do Mar segue até a próxima terça-feira, 25. A programação contempla a culinária tradicional e a medicina popular; o artesanato; experiências de preservação ambiental; os folguedos populares, bem como o surf cearense. O evento ocorre no Sesc Iparana Hotel Ecológico, na Praia de Iparana, Caucaia.

Confira programação completa:

 

Encontro Sesc Povos do Mar

  • Sexta-feira - 17 às 22 horas
  • Sábado - 8 às 22 horas
  • Domingo - 8 às 22 horas
  • Segunda-feira - 8 às 22 horas
  • Terça-feira - 8 às 12 horas

Onde: Sesc Iparana Hotel Ecológico (Rua José Alencar, 150, Praia de Iparana, Caucaia)