Manifestantes protestam contra PL do Aborto em Fortaleza
Centenas de pessoas estiveram no Centro de Fortaleza para protestar contra o Projeto de Lei do deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). Aborto legal já é permitido no Brasil em caso de estupro
15:46 | Jun. 15, 2024
Fortaleza foi palco de manifestação neste sábado, dia 15, contra o Projeto de Lei nº 1904/24, que prevê pena de homicídio para a realização de aborto após 22 semanas de gestação. A reclusão pode chegar a 20 anos para a gestante, incluindo crianças e adolescentes.
Organizado por coletivos de mulheres, o protesto teve início na Praça do Ferreira às 8 horas da manhã deste sábado, 15, e seguiu caminho pelas ruas do Centro da cidade até a Praça do Carmo, quando houve a dispersão.
“Criança não é mãe. Estuprador não é pai”; “Ninguém faz aborto porque gosta. Queremos acolhimento e não prisão”, vociferavam em coro os manifestantes ao longo do trajeto.
Ato contra PL do aborto em Fortaleza: veja fotos
A saber, o aborto legal já é permitido no Brasil em três casos: estupro, quando é preciso salvar a vida da gestante e quando o feto não possui cérebro.
No Brasil, outros grandes centros urbanos, como São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, também realizaram durante esta semana manifestações sobre o tema.
O projeto em questão, aprovado recentemente em regime de urgência para votação, é de autoria do deputado federal Sóstenes Cavalcante, do Partido Liberal (PL) do Rio de Janeiro, e conta com o apoio do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira.
Já Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, pediu cautela sobre o tema após o impacto negativo perante à sociedade.
Drama das vítimas de violência sexual
E não foi preciso chegar à Praça do Ferreira para sentir o drama das mulheres que são vítimas de violência sexual no País.
“Eu fui estuprada quando tinha 18 anos”. A declaração é de Beatriz Nogueira (nome fictício), uber que fez o translado da equipe do O POVO até o local da manifestação. Ela conta que a abordagem para a realização do crime aconteceu na rua da própria casa, localizada nas proximidades da avenida José Bastos.
“Eu havia ido fazer a inscrição para uma universidade e quando estava chegando em casa, após comprar pão, por volta de 18h30min, fui abordada por um homem, que foi logo colocando uma faca na minha cintura e me abraçando como se fosse um namorado. Tinha um terreno baldio próximo e lá ele me estuprou. Só não me matou porque viu um carro da polícia passando na rua e correu”, relata.
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Ela conta que fez a denúncia e participou de audiências. “Pela descrição que eu fiz para a polícia encontraram ele por uma cicatriz que esse bandido tinha no corpo”.
Segundo Beatriz, hoje com 52 anos, o estuprador era casado e tinha dois filhos. “Isso ficou marcado por muito tempo na minha vida. Mas agora eu consigo falar. Passei um ano em pânico, sem querer sair de casa, perturbada”.
Sobre o Projeto de Lei, chamado pelos manifestantes de “PL do Estupro”, ela o considera absurdo por provocar a criminalização das mulheres. “Nós somos as vítimas”, destaca.
“Cada mulher tem o direito de escolher se quer ter um bebê ou não. Ainda mais em um caso de estupro. É muito difícil olhar para uma criança e lembrar daquele ato violento que você não consentiu”.
PL condena crianças e mulheres estupradas à prisão
Presente ao protesto, a servidora pública Cláudia Costa considera que a temática do PL nem deveria estar em pauta.
“Eu acho revoltante estar gastando energia diante de tantos problemas sociais para uma questão que já foi discutida há muito tempo e que era para ter sido superada. Esse Congresso que está aí está apenas preocupado em desmoralizar o governo e para isso eles não medem esforços. É um absurdo atrás de absurdo e nós, mulheres, ficamos reféns. Em minutos podemos perder conquistas históricas”, avalia ela.
“Quem está perdendo é o Brasil. Quem perde somos nós mulheres. Isso é grave e muito urgente”, complementa.
Também presente ao evento, a coordenadora de Mulheres do Movimento Negro Unificado, Rachel Viana, considera o Projeto de Lei um retrocesso para a autonomia das mulheres.
“Esse PL condena crianças e mulheres estupradas à prisão”. Ela frisa que a pena para as mulheres chega a ser maior que a do estuprador - hoje é de 10 anos de reclusão.
“O problema é a bancada evangélica, os conservadores, que se colocam cotidianamente contra os direitos reprodutivos do sexo feminino”. Raquel lembra que o Código Penal brasileiro já permite o aborto.
Auditora Fiscal da Receita Federal, Marielle Dornellas considera o PL nefasto, que chega para torturar e retirar os parcos direitos conquistados pelas mulheres.
“Esse Congresso fundamentalista e religioso deveria estar preocupado em proteger nossas crianças para que não sofram estupro. Deveria se ater à prevenção e à educação sexual das nossas meninas para que não passem por uma gravidez indesejada. Elas precisam de apoio”.
Amiga de Marielle, a arquiteta Marcela Brasileiro complementa: “Nós tínhamos que pensar era em o que fazer com esses estupradores, porque isso é comum na nossa sociedade, onde pais, padrinhos e tios estupram as nossas crianças. Precisamos discutir em como resolver essa situação”.