"Casarão do Jacarecanga" não pode mais ser restaurado, diz laudo
Desde 2021 o prédio, cujo segundo andar pertenceu à Santa Casa da Misericórdia de Fortaleza, está interditado pela Defesa Civil. Imóvel foi projetado pelo arquiteto húngaro Emílio Hinko
16:32 | Abr. 16, 2024
Um laudo técnico, realizado no final de 2023, a pedido da Santa Casa da Misericórdia de Fortaleza, aponta que a estrutura do "Casarão do Jacarecanga" — mais conhecido como "Casarão da Santa Casa", não tem mais condições de ser recuperada. Assim, a única opção para o imóvel, que está interditado desde 2021 pela Defesa Civil de Fortaleza, seria a demolição. As informações foram passadas por Vladimir Spinelli, provedor da Santa Casa.
“A Santa Casa tem um laudo que indica a demolição como única opção, hoje, para o imóvel. [A gente] pede para que a Prefeitura cuide da demolição, já que a Santa Casa não tem condições de arcar. E, o prédio, não é da Santa Casa. A [instituição] dispõe apenas do segundo andar”, explica o provedor.
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Em nota, a Defesa Civil de Fortaleza afirmou que, na ocasião da interdição em 2021, os agentes do órgão realizaram uma vistoria técnica e foi constatado o risco de desabamento por conta do estado estrutural precário do imóvel. Os moradores foram retirados e o prédio interditado. Os proprietários receberam o relatório técnico e a notificação para os devidos reparos.
Em 2022, o caso foi encaminhado à Procuradoria Geral do Município (PGM), que ajuizou ação judicial, cuja decisão liminar foi proferida em dezembro de 2023, para que os responsáveis realizem os reparos necessários, sob multa diária de R$ 500 por dia de descumprimento.
Hoje, o processo está no Ministério Público Estado do Ceará (MP-CE) e a Prefeitura de Fortaleza segue acompanhando o caso.
Localizado na Rua Oto de Alencar, 121, o Casarão é um bem particular e nunca foi tombado. O prédio foi projetado pelo arquiteto húngaro Emílio Hinko, quando ele se mudou para o Brasil na década de 1930.
“Tem muita arquitetura dele aqui em Fortaleza. Ele fez muita coisa aqui [na Capital] e em São Paulo. Esses casarões foram feitos por ele, pertencia à família dele e, depois, ele doou à Santa Casa”, cita Silvestre Neto, 65. Ele é dono do restaurante Casarão Self-Service e Bar, localizado ao lado do prédio que pode ser demolido.
Vale ressaltar que apenas o segundo andar da estrutura pertence à Santa Casa, mas o hospital nunca funcionou no local. “O pavimento foi uma boa ação feita anos atrás. É um apartamento que foi locado como uma fonte extra de recursos para a Santa Casa. A [instituição] nunca funcionou nesse prédio. O pavimento pertence à Santa Casa por doação”, explica Spinelli.
O provedor ainda destaca que, em um cenário ideal, ele não é a favor da demolição. O que acontece, é que, conforme o laudo, não existe outra opção. “Se houver algum outro estudo demonstrando que o prédio pode ser recuperado, obviamente, essa seria a melhor solução quando a gente pensa na história e na cultura cearense, porque é mais um prédio que vai abaixo”.
“Para a Santa Casa, a melhor das opções seria a recuperação e a gente estaria disposto a recuperar, mas, lamentavelmente, não parece [ser possível]”, continua.
O Bar do Fabiano funcionou no Casarão durante mais de 50 anos
Durante mais de 50 anos, o Casarão foi endereço do tradicional Bar do Fabiano. O empreendimento foi inaugurado em 1958, por Amaurílio Santos, pai de Fabiano Silveira Medeiros, que mais tarde tomaria conta do local.
“Na minha opinião, deveria ser restaurado. É um prédio histórico aqui do Jacarecanga e [a demolição] vai acabar com a história do bairro”, opina Silvânia Moreira, 51. Hoje ela vive em outro bairro, mas morou no Jacarecanga por muitos anos e tinha o costume de frequentar o bar.
“Era movimentadíssimo. Ele funcionava para almoço, também abria pela manhã, de tarde e à noite, mas fechava cedo. É uma pena que a gente não possa mais tê-lo”, destaca.
Sueli Muniz Macedo, 62, também já foi cliente do bar. Ela trabalha próximo ao local e, às vezes, comia no empreendimento. “É um prédio histórico, é bem cultural que nós vamos perder. Mas, se não tem outra maneira, infelizmente, vai ter que fazer [a demolição]. Vai ser uma perda muito grande”, opina.
Uma outra senhora que não quis se identificar, acredita que a possível demolição mata a história. "O prédio não deveria ser demolido. Ele vivo [em pé] vai sempre manter as pessoas informados sobre o como eram [as coisas] antes e como será no futuro. Sou completamente contra a demolição. Restaurar é a melhor opção.”
Seu Silvestre, aquele que é dono de um restaurante ao lado do Casarão da Santa Casa, relembra que outros prédios históricos do Jacarecanga já foram demolidos no passado. Ele mora no bairro há cerca de 48 anos. “Sempre vi casarões sendo demolidos".
"Ali do outro lado, onde é o Palácio Jardim, tinha o Carajás, um casarão muito bonito, um sobrado. Em frente a esse prédio, tinha um [outro] casarão muito bonito. Foram demolindo, porque não tinha quem controlar, né? Hoje que estão [indo atrás]. É preciso ter memória guardada”.
O casarão onde o restaurante dele funciona, está todo restaurado. “Há 15 anos atrás eu fiz uma senhora reforma. [...] Se eu tivesse deixado do jeito que estava, ele, hoje, também estaria destruído”.