Leilão do fim do mundo: territórios quilombolas não foram sobrepostos por áreas adquiridas

A não-concessão das regiões se dá após comprovação dos impactos que a exploração de petróleo poderia causar para as comunidades locais

Dos lotes de terra localizados próximos a territórios quilombolas e ofertados durante o mega leilão da Agência Nacional do Petróleo (ANP), realizado na última quarta-feira, 13, no Rio de Janeiro, nenhum foi adquirido. Com a alcunha de “Leilão do fim do mundo”, o evento foi fortemente questionado por entidades socioambientais devido aos danos que a exploração pode causar à fauna, à flora e a comunidades locais.

A não-concessão dessas regiões próximas aos quilombos se deu após a explanação de um estudo feito pelo Instituto Arayara, Organização Não Governamental (ONG) que atua desde 1992 em causas de direito socioambiental. Segundo a ONG, o levantamento, aliado a ações jurídicas, foi elemento crucial para a preservação desses territórios.

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“Esses blocos não foram comprados porque nós fizemos um estudo que demonstrava essa sobreposição, e aí a empresa que ia adquirir os blocos deixou de comprar por causa dessa sobreposição demonstrada por nós. Nós entramos também com uma ação civil pública, e isso gerou uma insegurança jurídica para a empresa”, conta a diretora-executiva do Instituto Arayara, Nicole Oliveira.

Ainda de acordo com Nicole, a sobreposição acontece não só quando os blocos entram em territórios de conservação, mas também pelo cerceamento dessas regiões, principalmente as que rondam comunidades indígenas.

“Os territórios indígenas não podem ter sobreposição direta aos blocos de exploração porque isso é motivo de exclusão e, por lei, não é possível. Mas os territórios indígenas têm um raio de influência direta de 8 km fora da amazônia e 10 km na amazônia que também não pode ser bloco de exploração. Tem vários blocos que foram afetados neste leilão que tinham sobreposição a essa área, o que não deixa de influenciar o território como um todo. Deixaram uma saidinha só ali, mas o restante do território foi cercado.”

Com pontos de exploração à venda também nos mares, a ONG aponta que o leilão representa um perigo para os ecossistemas marítimos e comunidades que sobrevivem deles, como as de pescadores. Ao todo, 14 áreas de preservação de corais estão sob risco de serem afetadas pela ação da ANP, algumas delas na divisa entre os estados do Ceará e do Rio Grande do Norte.

“Com a desculpa do desenvolvimento e de trazer riquezas, setores econômicos que já são estabelecidos, geram milhares de empregos e que muitos recursos entram para o Estado e para o País, vão deixar de existir porque sem coral não tem peixe”, alerta Nicole.

Com 193 blocos arrematados, os resultados do leilão têm sido lamentados por comunidades indígenas, quilombolas e entidades de defesa socioambiental. Isso porque, com a Oferta de Concessão Permanente, uma das modalidades inscritas no edital do leilão, as empresas podem demonstrar interesse nas áreas de exploração ao longo de todo o ano. Ou seja, mesmo os territórios que ainda não foram leiloados ainda podem ser vendidos.

Ao todo, sete ações foram movidas judicialmente contra o leilão, uma delas pedindo a retirada de 77 blocos de exploração por irregularidades como sobreposição a unidades de conservação e territórios quilombolas e indígenas.

Além dessas, uma ação climática, destacando os prejuízos causados por potenciais vazamentos e a emissão de gases, também foi aberta. Segundo cálculos do instituto, se todas essas reservas fossem queimadas, cerca de uma gigatonelada de carbono seria lançada no ar.

Confira os resultados gerais sobre os blocos arrematados no leilão:

  • 2 encontram-se em sobreposição à Unidades de Conservação
  • 7 blocos e 1 área de acumulação em sobreposição à Zonas de Amortecimento
  • 3 blocos em sobreposição à área de Raio de Restrição de Terra Indígena
  • 73 blocos em sobreposição a Assentamentos
  • 17 blocos em sobreposição à Sítios Arqueológicos
  • 130 blocos e 1 área de acumulação em sobreposição à Áreas de Prioritárias para Conservação
  • 14 blocos em sobreposição à PAN Corais
  • 3 blocos em sobreposição à PAN Manguezal
  • 39 blocos em sobreposição à Áreas Urbanizadas
  • 120 blocos e 1 área de acumulação em sobreposição à Áreas com potencial de fracking (recursos não convencionais).

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