Feminicídios aumentam no Ceará em 2023; número supera casos de 2022

O crime é um desafio para toda a sociedade, por se colocar como uma exigência de mudança de comportamento coletivo, em relação a todos os tipos de violências contra a mulher

O número de feminicídios registrados no Ceará aumentou neste ano, em relação a 2022. De janeiro ao dia 15 de setembro de 2023, foram contabilizados 33 casos, enquanto no ano passado inteiro foram registrados 28 casos, conforme os dados da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). O mês com maior incidência de casos foi janeiro, com sete notificações.

As idades, escolaridades e regiões em que as vítimas vivem variam. Nada entre elas têm uma conexão, a não ser o fato de conviverem com um homem que não aceitou alguma de suas condutas e decidiu lhes tirar o direito de viver.

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A vítima mais jovem foi uma garota de apenas 14 anos, chamada Isabelly Karyn de Queiroz Pereira, alvejada a tiros no município de Cascavel. A vítima mais velha foi Antônio José Maciel, de 62 anos, morto na cidade de Novo Oriente ao tentar defender a filha do ex-companheiro. 

Um dos casos que gerou mais repercussão foi o da médica e presidente da Câmara de Vereadores de Juazeiro do Norte, Yanny Brena Alencar Araújo, de 26 anos, morta pelo namorado Rickson Pinto. O caso aconteceu no dia 3 de março, na região do Cariri. De acordo com as investigações, a jovem teria decidido terminar o relacionamento, mas o agressor não aceitou a decisão e matou Yanny. Rickson se suicidou em seguida.

O corpo demonstrava que houve uma luta corporal entre ela e aquele que dizia amá-la e jurava jamais deixá-la nos perfis das redes sociais. O sofrimento de Yanny gerou comoção no Cariri e motivou a apresentação de um Projeto de Lei (PL 2220/2023), de autoria do irmão dela, o deputado federal Yury do Paredão, que torna obrigatória a utilização de placas em locais públicos e privados com o número telefônico 180, destinado a atender denúncias de violência contra a mulher.

“O enfrentamento contra o feminicídio começa na escola, na faculdade, no trabalho e entre amigos. Essa violência começa com um empurrão, com um grito, e não sabemos como ela pode acabar”, destacou Yury em pronunciamento na Câmara dos Deputados.

Recentemente, a morte da contadora Kaianne Bezerra Lima Chaves, no dia 28 de agosto, chocou quem acompanhava o caso por uma reviravolta que apontou seu companheiro como autor intelectual da execução. O caso foi tratado inicialmente como um latrocínio (roubo seguido de morte), pois a vítima foi encontrada machucada e amarrada, em meio à casa revirada, no município de Aquiraz.

Dias depois, um vídeo em que o marido da contadora aparecia junto com os executores o colocou na posição de suspeito. Leonardo Nascimento Chaves teria mandado matar Kaianne para ficar com um seguro de vida de R$ 60 mil. Ele já tinha passagens compradas para Portugal quando foi encontrado na casa da mãe da vítima e preso.

A pesquisadora do Laboratório de Estudo da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC), Jânia Perla Aquino, explica que  feminicídio ainda é um crime que o Estado consegue ter pouca interferência na prevenção, a não ser com campanhas de reeducação e combate à violência. Para a estudiosa do tema, o que pode reduzir os números é uma mudança de postura da sociedade, que acontecerá a longo prazo.

"É um crime bárbaro que, infelizmente, está dentro de um contexto histórico muito difícil de ser desconstruído. Não é um crime que aumenta ou diminua com a sazonalidade de outros tipos de execução. Tem mais a ver mesmo com a sensação de pertencimento que o masculino demonstra diante do feminino. É preciso mudar o comportamento das pessoas sobre isso", explica. 

Feminicídios no Ceará: casos mês a mês em 2023

Janeiro - 7
Fevereiro - 1
Março - 4
Abril - 5
Maio - 1
Junho - 5
Julho - 5
Agosto - 4
Setembro - 1

Prevenção e repressão ao feminicídio

Demandada sobre o aumento do número de feminicídios no Estado, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS) afirmou, por meio de nota, que 262 suspeitos de violência contra a mulher foram presos, durante a operação "Shamar", deflagrada entre os dias 15 de agosto e 15 de setembro.

A Secretaria disse, ainda, que por meio da Secretaria das Mulheres e da SSPDS foi lançado no dia 22 de agosto um sistema para a solicitação de medidas protetivas de urgência na Internet.

“A plataforma garante a desburocratização da solicitação das medidas protetivas, sem a necessidade do registro do Boletim de Ocorrência (BO), e funciona em todo o Ceará”, explica a nota.

"Vítimas precisam acreditar no acolhimento", diz especialista

O desafio de reeducar as pessoas para que não sejam futuras agressoras de mulheres demandará tempo e a quebra de muitos comportamentos já enraizados na sociedade, segundo a professora LEV/UFC, Jânia Perla Aquino.

“Precisamos começar desconstruindo aquela história de que o que acontece na vida privada de um casal, de uma família, não é da conta de ninguém. É preciso que os vizinhos denunciem, se souberem que há violência ali do lado; que as amigas que escutam os relatos encorajem a vítima a denunciar; que as vítimas acreditem que vão ser acolhidas, se decidirem sair de perto do agressor”, afirma.

A especialista ressalta que é necessário que questões como a paridade de gêneros sejam rediscutidas, para diminuir as desigualdades e violências.

“A masculinidade está muito ligada à força física, ao comando, enquanto a feminilidade está mais ligada à fragilidade, à generosidade, à compreensão e ao perdão. Há um conjunto de valores que exige muito sacrifício do lado da mulher. Permanecer com esses pensamentos levam a desfechos muito trágicos para mulheres que tentam romper com esse ciclo”, afirma.

Para Jânia Aquino, é preciso que o acolhimento fale mais alto que as questões que podem desencorajar às vítimas, como as dependências financeira e afetiva.

“O Estado precisa dar segurança que a vítima vai ser recebida por alguma instituição que a acolha. A sociedade precisa avançar nisso junta, para que as mulheres deixem os lugares em que elas sofrem violência. Não podemos mais alimentar esse pacto silencioso que faz com essa violência seja normalizada e persista”, afirma a especialista.

Serviço

O Ceará tem dez unidades da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), responsáveis por receber denúncias e investigar crimes praticados no âmbito doméstico e familiar, além de feminicídios.

As DDMs atuam de forma integrada em equipamentos da Secretaria da Mulher, como as casas da Mulher Brasileira (CMBs), em Fortaleza; e da Mulher Cearense (CMCs), em Quixadá, Juazeiro do Norte e em Sobral, além das anunciadas em Tauá, Iguatu e Crateús.

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER FORTALEZA
Telefone: (85) 3108-2950
ddmfortaleza@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER PACATUBA
Telefone: (85) 3384-5820
E-mail: ddmpacatuba@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER CAUCAIA
Telefone: (85) 3101-7926
E-mail: ddmcaucaia@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER MARACANAÚ
Telefone: (85) 3371-7835
E-mail: ddmmaracanau@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER CRATO
Telefone: (88) 3102-1250
E-mail: ddmcrato@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER IGUATU
Telefone: (88) 3581-9454
E-mail: ddmiguatu@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER JUAZEIRO DO NORTE
Telefone: (88) 3102-1102
E-mail: ddmjuazeiro@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER ICÓ
Telefone: (88) 3561-5551
E-mail: ddmico@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER SOBRAL
Telefone: (88) 3677-4282
E-mail: ddmsobral@policiacivil.ce.gov.br

DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER QUIXADÁ
Telefone: (88) 3412-8082
E-mail: ddmquixada@policiacivil.ce.gov.br

 

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