Edifício Andrea: 4 anos após desabamento, moradores recebem indenização

Proprietários dos apartamentos destruídos receberam cerca de R$ 1,7 milhão. Valor foi dividido igualmente entre 12 famílias e um valor maior foi entregue ao proprietário de uma cobertura

No próximo dia 15 de outubro é marcado o quarto aniversário da tragédia do Edifício Andrea. Naquela manhã, por volta das 10h30min, o prédio residencial de sete andares, localizado no bairro Dionísio Torres, em Fortaleza, desabou. Nove pessoas morreram. Após anos de uma longa batalha judicial, as famílias finalmente receberam a indenização referente à desapropriação do terreno onde o prédio estava localizado: um total de R$ 1,7 milhão pagos pela Prefeitura de Fortaleza. Valor será dividido entre 12 famílias.

Em meio às lutas emocionais, familiares e proprietários dos apartamentos também passaram por um complexo labirinto judicial. Um deles foi o aposentado Clotário Souza Nogueira, de 88 anos. Na manhã do dia 15 de outubro, o idoso havia saído do prédio com sua esposa, a dona Ana Maria Ramos Nogueira, para ir ao banco cerca de 15 minutos antes do desabamento. Sua filha, genro e neta haviam saído mais cedo de casa naquela manhã.

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“Quando eu estava no banco, recebi a ligação de um conhecido, que me disse ‘Seu Clotário seu prédio está aqui na internet e ele desabou’. Eu corri para casa, mas a área já estava cercada por policiais e bombeiros, já em operação de resgate. A minha casa estava reduzida a escombros”, detalha o antigo morador.

Felizmente, ninguém estava em casa no momento do ocorrido. Após o incidente, o aposentado passou algum tempo morando na residência da filha. Posteriormente, ele adquiriu um novo apartamento, onde atualmente reside.

Clotário Nogueira afirma que, no último mês de junho, recebeu pouco menos de R$ 190 mil como parte da indenização, paga pela Prefeitura de Fortaleza. O valor está acrescido de juros, devido ao tempo passado entre o andamento do processo e o pagamento da quantia.

O valor pago, contudo, está longe do estimado na época para a cobertura duplex na qual o antigo bancário era proprietário há quase 40 anos. “O meu apartamento era avaliado em R$ 1 milhão, era muito bonito mesmo. Eu ainda paguei durante 20 anos um seguro. Eu pensava que cobria tudo, mas depois do desabamento eu descobri que era apenas para incêndio. Quer dizer, eu passei muitos anos pagando por uma coisa, pra no final não receber a ajuda”, lamenta o antigo funcionário do Banco do Brasil.

O Andrea

O Edifício Andrea estava localizado na rua Tibúrcio Cavalcante, área nobre de Fortaleza. De acordo com a Convenção de Condomínio do Edifício Andrea, registrada no Cartório de Registro de Imóveis da 1ª Zona de Fortaleza, o prédio foi construído e oficializado no ano de 1982. Segundo o documento, a estrutura contava com o total de oito pavimentos, distribuídos em:

- Térreo com estacionamento;
- 1° pavimento (apartamentos 101 e 102);
- 2° pavimento (apartamentos 201 e 202);
- 3° pavimento (apartamentos 301 e 302);
- 4 pavimento (apartamentos 401 e 402);
- 5° pavimento (apartamentos 501 e 502);
- 6° pavimento (apartamentos 601 e 602);
- 7° pavimento (apartamento/cobertura duplex 701).

Após o desabamento, a perícia concluiu que o prédio desabou da parte posterior para anterior, da travessa Hildete para a rua Tibúrcio Cavalcante. Com quase 40 anos desde sua construção, profissionais que fizeram estudos no local após a queda avaliaram que havia grave oxidação e fragilidade da estrutura. Além disso, intervenções para a realização de uma reforma feitas momentos antes da tragédia teriam sido definitivas para o acidente.

Dois meses antes do acidente, outra sequência de rachaduras nas colunas, motivadas por reforma no prédio anos antes, havia sido discutida em reunião de condomínio. Depois da reunião, a taxa R$ 350 - o valor do condomínio era R$ 1 mil - foi incluída para os moradores.

Após a desapropriação da área, o local será abrigará uma unidade do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (CBM-CE).

Veja comparativo entre o pós-desabamento e como está o terreno onde ocorrem as obras:

 

Batalhas

No meio do luto, a família de Rômulo Brás Thiers também lutou pela compensação da propriedade perdida. O empresário não morava no Edifício Andrea, mas sim a três quadras do local. Ele presenciou o momento em que o prédio veio ao chão, estremecendo os arredores.

Na tragédia, Rômulo perdeu seus tios Vicente de Paula Vasconcelos de Menezes, 87 e Isaura Marques Menezes, 82; além de sua prima Rosane Marques Menezes, de 55 anos. Os três moravam no prédio, no 3° e 5° andar, há mais de 10 anos.

O único sobrevivente foi o filho de Rosane, também neto de Vicente e Isaura. O jovem Fernando Marques Menezes, que na época tinha 20 anos, foi o primeiro resgatado após o desabamento. Atualmente, Fernando mora com uma tia no Rio de Janeiro.

Em junho de 2023, a família também recebeu a quantia da desapropriação do terreno, referente a dois apartamentos. “Depois de tanto tempo que a justiça não liberava, graças a Deus esse dinheiro foi recebido. Agora é vida nova, tentar se reconstruir e seguir a vida”, declara o familiar.

Como ocorreu o processo

Em dezembro de 2019, o então prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, se comprometeu em realizar a desapropriação do terreno. Essa ação é assegurada pela Constituição Federal (Art. 5, inc. XXIV), onde se busca prevalecer o interesse público sobre propriedades particulares, a fim de atender necessidades coletivas. Essa tomada da propriedade, contudo, só pode ocorrer se houver o pagamento justo e prévio de indenização em dinheiro.

O advogado Alberto Belchior Moreno Maia (OAB-CE 14080) foi quem representou na Justiça três dos 13 proprietários, dos respectivos 13 apartamentos do prédio. Segundo ele, “por intermédio da Justiça, o Poder Público se reuniu com as famílias e houveram tratativas para se estipular um valor, que seria um valor máximo que a Prefeitura poderia pagar pelo metro quadrado da região. Durante essas reuniões, os desapropriados já podiam ter uma ideia do valor que iam receber”, relatou o jurista.

A sentença de indenização do terreno do Edifício Andrea foi promulgada somente em outubro de 2022, já na gestão do atual prefeito José Sarto. Segundo o acordo, o Município deveria pagar aos desapropriados R$ 1.785.000,00 (um milhão, setecentos e oitenta e cinco mil reais).

Alberto Maia relata que, em reuniões formais e informais entre todos os proprietários e seus advogados, houve concordância geral com o valor ofertado pela Prefeitura de Fortaleza. “Como todos os desapropriados aceitaram esse valor, não houve nenhuma briga, nenhuma controvérsia, o processo seguiu em andamento”, detalha.

O valor foi dividido igualmente entre 12 proprietários (7,54028% do valor pago) e uma quantia superior para o dono da cobertura (9,51664%). Assim, sem incluir juros, a maioria das vítimas recebeu cerca de R$ 134.594,00, enquanto o proprietário da cobertura recebeu R$ 169.872,02.

“Infelizmente, todo o processo demorou bastante. Nós só conseguimos a expedição dos primeiros alvarás [que dão a permissão para a Justiça liberar o dinheiro para os desapropriados] em fevereiro de 2023. Finalmente, até junho deste ano, todos os desapropriados receberam suas indenizações”, informou.

Valor baixo da indenização

De acordo com o advogado Alberto Maia, essa forma de acordo proposto pela Prefeitura, no geral, não é boa para os desapropriados. Isso porque o Poder Público faz o pagamento apenas referente a área (em metros quadrados) de um terreno. Assim, a estrutura física de cada propriedade, que pode ser avaliada em uma quantia bem superior ao estipulado no acordo, não seria levada em consideração.

O jurista ressalta que a oferta, apesar de não ser vista como um valor completamente justo, foi uma maneira de se aproximar de uma resolução. Durante o processo, houve a possibilidade da recusa do acordo por parte dos proprietários. Contudo, todos os advogados envolvidos na disputa foram claros quanto às dificuldades que essas famílias poderiam enfrentar. Afinal, em geral, os questionamentos judiciais podem durar por dezenas de anos.

“Estamos falando de proprietários que, em sua maioria, eram idosos, fora os que faleceram ao longo dos anos ou após a tragédia. Também devemos levar em conta o trauma gigantesco que as vítimas enfrentaram. Então, a possibilidade deles passarem anos e anos em um litígio judicial para receber um valor justo era algo que ia causar muito sofrimento aos envolvidos”, declarou o advogado.

Segundo Alberto Maia, na época da tragédia, ainda havia pessoas que estavam em processo de financiamento dos imóveis e que eram apenas locatários. Essas, por sua vez, não tiveram direito de adquirir um valor indenizatório.

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