Praças do Centro de Fortaleza apresentam problemas estruturais

As praças do Ferreira, Capistrano de Abreu e Clóvis Beviláqua têm problemas similares que prejudicam o acesso da população aos espaços públicos. Prefeitura informou que há projetos de reforma em elaboração

20:02 | Jul. 06, 2023

Por: Bia Freitas
BURACOS no chão dificultam caminhada na Praça da Lagoinha (foto: FERNANDA BARROS)

Acúmulo de lixo, piso acidentado e equipamentos quebrados, desativados ou inexistentes são alguns fatores que as praças do Ferreira, Capistrano de Abreu e Clóvis Beviláqua, todas localizadas no Centro de Fortaleza, têm em comum.

Neste ano, de acordo com a Prefeitura de Fortaleza, dez obras de requalificação de praças da Cidade foram entregues. Somadas às obras anteriores, são 100 praças reformadas nos últimos três anos. As intervenções são realizadas de acordo com solicitações de moradores das 12 regionais de Fortaleza.

O pacote de investimentos para requalificação dos equipamentos é de mais de R$ 50 milhões do Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano (Fundurb), até 2024.

Em relação às praças Capistrano de Abreu e Clóvis Beviláqua, a Secretaria de Gestão Regional (Seger), informou que há projetos para reformas sendo elaborados.

Praça do Ferreira

Criada em meados do século XIX, a Praça do Ferreira é considerada por muitos o coração de Fortaleza. Apesar dos problemas estruturais, das caixas de papelão, sacos de lixo e pedaços de isopor, papéis e panfletos descartados no chão, o lugar ainda é sinônimo de efervescência e conserva a energia dos amantes do Centro.

Em janeiro do ano passado, O POVO noticiou os problemas estruturais na Praça do Ferreira. Entre as falhas em estrutura identificadas pelo O POVO em 7 de junho de 2022, estavam problemas na iluminação, lixeiras danificadas, bancos quebrados, buracos no piso e lixo espalhado pelo chão.

Neste ano, alguns desses problemas persistem, principalmente a grande quantidade de lixo espalhado pelo equipamento público, considerado cartão postal da Capital. No local, é possível perceber alguns bancos quebrados e pombos que ocupam os espaços. De acordo com a Secretaria Municipal da Gestão Regional (Seger), a Praça do Ferreira recebe manutenções periódicas de acordo com a necessidade.

“Aqui é o coração de Fortaleza. Deveria ser mais bem preservado, ter uma política melhor,” diz Nieda Maria, que trabalha com vendas em um carrinho localizado na esquina da praça. Ela herdou o negócio da sogra e trabalha no mesmo ponto há 34 anos.

No início, Nieda conta que o largo era um espaço de convivência entre diferentes grupos, famílias, idosos e crianças.“Os bancos eram bem cuidados. Você vê hoje que o jardim é todo deteriorado. O jardim era perfeito. A praça era mantida limpa e os bancos, perfeitos,” lembra.

Para ela, os problemas estruturais na praça tiveram início com a gestão da ex-prefeita Maria Luiza Fontenele, que durou de 1986 a 1989. Desde então, para Nieda, o espaço público veio em um processo de decadência que “matou a praça” e vem aniquilando o comércio do Centro.

“Isso é uma tristeza, para quem trabalha aqui no Centro, ver o estado da praça, a gente lamenta muito, porque o comércio gira aqui. Devido a isso, diminui o fluxo de comércio, diminui tudo,” afirma a comerciante.

Na Praça do Ferreira, três das cinco bancas instaladas estão desativadas. O mesmo vale para a fonte sob a qual está localizada a Coluna da Hora, que, segundo a Seger, não tem previsão para ser reativada.

Apesar disso, para os artistas de rua Ravena Silva e José Alberto da Costa, que circulam diariamente pela Praça do Ferreira, tudo no equipamento funciona bem.

José conta, entretanto, que o lugar mudou durante desde que começou a trabalhar no local. “Era mais social, mas hoje está mais diferente, porque vão mudando as coisas. As coisas sempre mudam,” relata José.

Há 12 anos, ele frequenta a Praça do Ferreira todos os dias. Foi lá onde ele conheceu Ravena, durante o tradicional Natal de Luz. Há cerca de três anos os dois trabalham juntos na Praça, ela vestida como Maria Bonita, e ele como Lampião.

Praça Capistrano de Abreu

Caminhar na Praça da Capistrano de Abreu, também conhecida como Praça da Lagoinha, não é fácil. Os buracos que tomam quase todo o chão não só dificultam a passagem das pessoas que transitam pelo local, mas também daqueles que trabalham no espaço.

A maior parte dos ambulantes que atuam na praça, vendendo comida, roupas, cosméticos, entre outros artigos, próximos à Célula de Proteção Comunitária da Guarda Municipal, não utiliza barracas e, pela falta de espaço, muitos precisam colocar as mercadorias no chão.

Mãe de cinco filhos, Maria de Fátima trabalha durante o dia em um carro de espetinho no local. Ela diz perceber reformas em todas as outras praças, menos nesta, que, segundo ela, está “entregue à poeira, às baratas, aos ratos”.

Para a mulher, o local deveria ter boxes para os vendedores, a fim de organizar o movimento. Além disso, ela também reclama que a iluminação pública nem sempre funciona e não há banheiros no local.

Maria de Fátima conta, ainda, que mal consegue transitar devido à quantidade de pessoas que trabalham na praça sem um espaço adequado. “Aqueles que têm condição, que vão trabalhando para ter uma barraca, compram. E os que não podem? Põem no chão, e é onde a gente pisa, cospe, rato, barata, cachorro mija,” diz a comerciante.

Para Maria de Fátima, todas as praças devem ter reformas, e quanto mais os espaços forem reformados, maior a movimentação e a quantidade de clientes. A promessa de uma reforma na praça é frequente, mas como relatam os ambulantes, não se concretiza.

“O pessoal está aqui porque precisa trabalhar. Sem trabalho, a gente não é nada. A gente tem que manter a casa da gente. A gente tem filho, muita gente é pai de família. Era para ter cada qual um box,“ coloca Maria.

Como mostrou uma matéria publicada pelo O POVO em setembro do ano passado, a Seger informou que faria uma vistoria técnica para identificar serviços necessários à revitalização da Praça da Lagoinha e que um orçamento seria elaborado para as intervenções.

Em nota, a Seger informou que a vistoria foi realizada e, a partir dela, foi feito um levantamento de ações para a melhoria do equipamento. Entretanto, o projeto de reforma ainda deve ser elaborado.

Apesar de não ver na prática essas mudanças, José Martins, que trabalha na Praça Capistrano de Abreu há mais de dez anos, ainda espera que algo seja feito pelo poder público. Ele conta que, quando começou a trabalhar na praça, ela era “um patrimônio público, não só para a gente ganhar o pão de cada dia mas, um lugar bem aconchegante.”

Entretanto, ele diz que, atualmente, os governantes “não estão nem aí para a praça, não dão uma força, e a gente fica empurrando com a barriga, dia após dia. Essas circunstâncias desanimam e desmotiva, porque o ser humano tem que ter coerência e tem que ter respeito.”

Praça Clóvis Beviláqua

Lixo, buracos no chão e postos desativados da Guarda Municipal e Polícia Militar são alguns dos aspectos que podem ser percebidos na Praça Clóvis Beviláqua. 

Localizada na rua General Sampaio, próxima à faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Casa do Barão de Camocim, não concentra grande movimentação durante os dias da semana.

 

Como conta o vendedor ambulante Nardoni Bezerra, enquanto prepara as batatas fritas que vende diariamente na praça há três anos, o movimento do local já foi maior, mas hoje não passa de “pinga pinga”.

Ele relata que, a não ser pelas sextas-feiras e domingos – dias de celebração na igreja próxima, quando o local se enche de gente – na maioria dos dias, o fraco movimento vai somente até as 19h30min, horário no qual alguns funcionários do Instituto José Frota (IJF), que faz esquina com a praça, deixam o trabalho. Mesmo com o fraco movimento, Nardoni continua trabalhando na praça, mesmo tendo quebrado o seu carrinho em um dos buracos espalhados pelo chão.

Demarcada ainda no século XIX, o espaço, originalmente nomeado Praça do Encanamento, devido ao chafariz que abastecia a Cidade, antecede a morte do famoso jurista do qual leva o seu nome.

Hoje, o equipamento público tem locais dedicados a recreação infantil e à prática de exercícios físicos, além de um posto da Guarda Municipal e da Polícia Militar, ambos desativados. Moradias foram improvisadas nos brinquedos infantis e no gazebo, e é possível perceber alguns móveis como mesas e cadeiras que compõem o dia-a-dia de quem vive na praça com aspecto abandonado.

Mesmo com os equipamentos, além das pessoas em situação de rua, que lá residem, a maior parte dos transeuntes não utiliza o espaço, apesar de Nardoni assegurar que não há assaltos no local. Em junho do ano passado, no entanto, uma matéria publicada pelo O POVO ouviu populares no entorno e, na ocasião, um dos entrevistados afirmou ter presenciado um assalto na praça.

Em nota, a Seger afirmou que um projeto para a reforma da praça vem sendo orçado. Entre as melhorias previstas estão melhorias na acessibilidade e a manutenção do piso, academia ao ar livre e parquinho infantil.