Upas de Fortaleza atendem de 8 a 10 casos de violência contra idosos por mês

Casos de abuso contra pessoas idosas e diferentes formas de violência são identificados e acompanhados por equipes multidisciplinares nas Upas

O abuso contra idosos é um problema de saúde pública que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), tende a se agravar com o aumento da população idosa. Em Fortaleza, as Unidades de Pronto Atendimento (Upas) recebem mensalmente, em média, de 8 a 10 casos de violência física, por abandono, por negligência ou patrimonial contra idosos.

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“A maioria das pessoas idosas que dão entrada nas Unidades de Pronto Atendimento em Fortaleza, vítimas de violência física, sofreram violência doméstica, ocorridas em suas residências tendo como principal agressor algum membro da família e ou cuidadores, segundo informação das assistentes sociais das nossas unidades”, explica a coordenadora do Serviço Social das Upas, Danielle Claudio, nesses casos, os principais agressores são membros da família ou cuidadores.

Nas Upas, ao identificarem sinais de agressão, como hematomas e machucados, profissionais de enfermagem entram em contato com os assistentes sociais. Nas unidades, equipes multidisciplinares trabalham com acolhida, escuta das vítimas e direcionam estas pessoas para equipamentos da política de assistência social e da justiça para que o acompanhamento seja continuado por essas entidades.

Apesar de serem menos perceptíveis, outras formas de abuso contra idosos, como a negligência, violência patrimonial, moral e psicológica, também podem ser identificadas a partir de alguns sinais, como falta de apetite, perda de peso, isolamento, higiene precária e medo ou respeito excessivo diante do cuidador.

Dados divulgados pela OMS mostram que, todos os anos, 1 em cada 6 pessoas com mais de 60 anos sofre alguma forma de abuso. Dentre estes relatos, o abuso psicológico em ambientes institucionais é o mais presente.

Além disso, o mesmo estudo mostrou que 2 em cada 3 funcionários de instituições de longa permanência também já relataram casos de abuso contra idosos. Ele é mais comum em ambientes institucionais, mas também ocorre em ambientes comunitários.

“A violência, na realidade, é generalizada, acontece de várias formas e em várias faixas etárias, mas no caso específico da pessoa idosa muitas vezes se dá por conta da vulnerabilidade”, relata o titular da Coordenadoria Especial do Idoso em Fortaleza, Sérgio Gomes.

Ele explica que, devido a condições físicas como dificuldade de locomoção e movimentos, demência ou doenças, essas pessoas estão sujeitas a violência por meio de familiares ou cuidadores.

Quando essa violência acontece no âmbito familiar, essa violência costuma ser velada. Além disso, Sérgio coloca que, quando as agressões acontecem por um longo período de tempo, “pelo fato desse idoso ter vulnerabilidade e ver que aquela pessoa é o único cuidador que ela tem, ou aquele grupo de pessoas são os únicos cuidadores, essa pessoa aceita essa violência calada e passa despercebido, muitas vezes.” Quando essas violências são percebidas por vizinhos ou pessoas próximas a este idoso, é também comum que não sejam denunciadas.

Para o coordenador, a violência mais notificada atualmente é a patrimonial, “onde o idoso ou a idosa tem o seu cartão de benefícios subtraído, e muitas vezes ele deixa de se prover, de comprar seus medicamentos, sua alimentação, por conta de uma família numerosa, de uma família de cinco, seis, oito pessoas onde a única fonte de recursos é esse benefício da pessoa idosa.”

No Ceará, canais como a Delegacia do Idoso, Defensoria Pública, Ministério Público, Conselho Municipal do Idoso e o Disque 100 podem ser usados para denunciar casos de violência contra pessoas idosas, sob anonimato.

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Em entrevista ao O POVO, Sérgio Gomes, coordenador Especial do Idoso em Fortaleza, falou sobre as raízes de diferentes formas de violência e sobre a importância do protagonismo da pessoa idosa sob a perspectiva de um envelhecimento ativo e saudável.

O POVO - Quais as principais formas de violência que são percebidas em Fortaleza e no mundo?

Sérgio Gomes - Na realidade, existem várias formas de violência contra a pessoa idosa. A gente poderia citar, dentre elas, os maus tratos, o abandono, a violência patrimonial, todo tipo de violência e agressão. O que a gente observa nos dias de hoje é que a forma de violência mais executada, que a gente têm mais notificações, são aquelas que tratam justamente da violência patrimonial, onde o idoso ou a idosa tem o seu cartão de benefícios subtraído, e muitas vezes ele deixa de se prover, de comprar seus medicamentos, sua alimentação, por conta de uma família numerosa, de uma família de cinco, seis, oito pessoas onde a única fonte de recursos é esse benefício da pessoa idosa. Essa violência é muito presente.

Nós temos o abandono, também, e os maus tratos, que também são muito presentes e existem outras formas de agressão contra a pessoa idosa e violência contra a pessoa idosa, mas eu citaria três bem marcantes: violência patrimonial, abandono e maus tratos.

O POVO - A população idosa está mais sujeita a esses tipos de violência?

Sérgio - A violência, na realidade, é generalizada, acontece de várias formas e em várias faixas etárias, mas no caso específico da pessoa idosa muitas vezes se dá por conta da vulnerabilidade. A pessoa idosa tem muitas vulnerabilidades que outras pessoas realmente não têm, então essa violência que a gente observa com relação à pessoa idosa tem muito a ver com essas vulnerabilidades.

A dificuldade de movimentação, a limitação de movimentos, muitas vezes uma demência que essa pessoa idosa tem, uma doença que ela tem, crônica ou não, que faz com que os parentes, aquelas pessoas mais próximas ou os cuidadores usem de violência contra essa pessoa.

Quando uma pessoa responsável por um idoso deixa de oferecer cuidados básicos como a higiene, a saúde, a medicação e a proteção, isso tudo é negligência. A gente fica observando desde o cuidado básico com a pessoa idosa até a agressão física. Geralmente os idosos estão mais suscetíveis a esse tipo de violência.

O POVO - Vocês recebem esse tipo de denúncia na SDHDS?

Sérgio - Nós recebemos lá na Secretaria e nós encaminhamos para o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa, porque lá eles fazem o encaminhamento para o órgão mais específico. Se houver a necessidade de uma intervenção policial, existe a delegacia especial da pessoa idosa, e também as promotorias dos direitos da pessoa idosa. A gente busca fazer essa triagem, encaminha para o conselho, e ele faz os encaminhamentos.

Se eu tiver uma situação em que esse idoso estiver precisando de um atendimento imediato, a gente também aciona os CRAS da Prefeitura de Fortaleza e os CREAS. Os CREAs em que se trabalha essa parte de referenciar para onde esse idoso deve ir, se houver machucados, se foi alguma agressão física, para os encaminhamentos para as unidades de saúde, então a gente usa essas intervenções. Dependendo de cada caso, a abordagem é diferente e os encaminhamentos também são diferentes.

O POVO - Há dificuldade em perceber casos de violência quando acontecem dentro da família?

Sérgio - O problema é que, na maioria dos casos, essa violência é velada, é silenciosa, porque o agressor, muitas vezes, é um parente. É um filho, uma filha, uma nora, um genro ou um neto.

As agressões, quando se sucedem por muito tempo, pelo fato desse idoso ter vulnerabilidade e ver que aquela pessoa é o único cuidador que ela tem, ou aquele grupo de pessoas são os únicos cuidadores, essa pessoa aceita essa violência calada e passa despercebido muitas vezes. Quando isso é observado pela vizinhança, muitas vezes as pessoas não querem se meter, então não fazem a denúncia.

Quando você perceber um idoso com um aspecto descuidado, que apresente marcas pelo corpo, que não são explicadas, ou sinais de quedas frequentes, e que tenham familiares ou cuidadores indiferentes a ele, que a gente observa isso, pode estar acontecendo uma violência contra essa pessoa idosa. A orientação é denunciar nas unidades municipais de saúde, na delegacia especializada da pessoa idosa, tem o Disque 100, que é o disque direitos humanos, ou então ligar 190 para a Polícia Militar para falar que existe uma situação de risco.

O POVO - O que caracteriza a negligência com a pessoa idosa?

Sérgio - A negligência com a pessoa idosa é quando eu deixo de oferecer a uma pessoa que, muitas vezes, precisa de mim, os cuidados básicos que ela precisa para sobreviver. Eu paro de banhar, deixo de alimentar, deixo de ofertar água para essa pessoa. Deixo de oferecer as condições mínimas para que essa pessoa idosa tenha uma condição de vida satisfatória. Isso nós chamamos de negligência, negligenciar os cuidados que essa pessoa precisa para poder viver.

Se você não está na casa do idoso mas observa que ele está mal trajado, emagrecendo subitamente ou então que ele se queixa que está com sede, isso aí é a negligência. Se a gente for falar de abandono, porque a forma extremada de negligência é quando você abandona alguém que precisa dos seus cuidados. Quando existe uma ausência, uma omissão dos familiares ou responsáveis, a gente pode dizer que isso é um abandono. Os idosos precisam de proteção.

Tem as outras violências, violência física, que a gente já sabe como acontece. Tem a psicológica, ou emocional, que é a que a gente considera uma das mais sutis, das violências, porque inclui comportamentos que prejudicam a autoestima e o bem estar da pessoa idosa. Um xingamento, um susto, um constrangimento, uma violência psicológica e emocional. Uma das mais corriqueiras de hoje é a violência financeira ou patrimonial, que é a exploração imprópria da pessoa idosa, sem o consentimento dela, dos seus recursos financeiros e patrimoniais.

O POVO - O protagonismo dos idosos na proposta de políticas públicas vem sendo aderido?

Sérgio - O protagonismo tem a ver com o novo perfil da pessoa idosa. As pessoas estão envelhecendo e vivendo mais, então a gente fala muito do envelhecimento ativo e saudável, e o protagonismo da pessoa idosa é você ter uma pessoa com mais de 60 anos onde ela consegue manter todas as atividades.

Um idoso protagonista é aquele que se envolve dentro do contexto social em que ele está inserido. Seja no trabalho dele ou na comunidade onde ele mora, ele participa das decisões, ele tem protagonismo pra propôr, pra reclamar. Ele não é um ser passivo, ele é um ser que propõe, então essa é uma das visões que a gente está tentando implementar, que é motivar o protagonismo dos idosos para que eles não estejam só existindo, mas para que eles sejam vistos, notados, e possam participar da vida comunitária.

O POVO - A violência institucional é um dos temas abordados no simpósio promovido pela SDHDS. Isso é comum?

Sérgio - É, porque a violência institucional está ligada a qualquer forma, dentro daquelas que eu já falei, se ela é cometida por uma pessoa dentro de um ambiente institucional, seja num hospital, numa clínica, numa repartição pública, em um supermercado, em uma loja.

A violência institucional está ligada à falta do atendimento humanizado para com a pessoa idosa. É quando você não oferece à pessoa idosa as condições que ela tem direito. Muitas vezes direitos que são previstos em lei. Você não trata bem a pessoa idosa, você não atende como ela deveria ser atendida, usa de maus tratos com essa pessoa idosa. Pode até ser a violência física, mas é uma violência institucional, quando o idoso precisa de um serviço ou produto, e para ele poder ter esse serviço ou produto ele é violentado de alguma forma.

O idoso que vai pegar um transporte coletivo, que o motorista não para na parada, ou então não para direito para ele poder descer ou subir nesse coletivo, isso é uma violência institucional causada por aquela empresa, representada naquele ato por aquele condutor.


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