Champions Ligay: torneio LGBTQIAP+ anima fim de semana com inclusão e diversidade

Equipe do Cangayceiros Futebol Clube foi classificada para disputar o título nacional do primeiro campeonato de futebol LGBT do Brasil. Iniciativa movimenta torcida para que o esporte seja para todos, todas e todes

22:31 | Mai. 21, 2023

Por: Karyne Lane
Cangayceiros Futebol Clube, de Fortaleza, foi campeão e segue para a final (foto: AURÉLIO ALVES)

Considerado uma ferramenta de transformação social que muda a vida de milhares de pessoas ao redor do mundo, o futebol ainda é um ambiente de exclusão e discriminação para a comunidade LGBTQIAP+.

Para combater esse cenário com inclusão e diversidade através do esporte, a Ligay Nacional de Futebol promoveu em Fortaleza, neste fim de semana, a etapa regional Nordeste da Champions Ligay, o primeiro campeonato de futebol society LGBT do Brasil.

Dez equipes participaram da competição durante o sábado, 20, e domingo, 21, na Arena Champions do bairro Parangaba, com times que representaram os estados Bahia, Ceará, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte.

Além do Cangayceiros Futebol Clube, de Fortaleza, disputaram grupos cearenses de Aracatiaçu, Itapipoca e Tianguá. A equipe anfitriã foi a grande campeã após vencer por 1 a 0 o itapipoquense Estrelas, e segue para a final nacional.

“É uma luta diária fazer com que um time se mantenha de pé num País altamente machista e LGBTfóbico”, evidencia Lucas Bertullino, presidente e atleta do Cangayceiros. “Estar no esporte não é só mostrar que a gente gosta de futebol, mas também lutar diariamente para que eu, meu namorado, minha família homoafetiva consiga ir para dentro de um estádio sem nenhum julgamento”, acentua.

O jovem Gabriel Sousa, de Umirim, é presidente de um time que não participou do campeonato porque foi criado recentemente, mas integrou o evento como comissão técnica e diz que pretende voltar como time participante.

“Eu não tinha dimensão do que era, me convidaram para vir e eu quis até para levar um pouco da experiência para o meu time, porque é uma coisa grandiosa e quero trazê-los para viver isso e disputar também. A gente está ocupando espaços que a gente sempre escutou que não poderia ocupar. É uma realização pessoal muito grande”, destaca.

“O torneio, além de evidenciar que pessoas LGBTs podem jogar e gostar de futebol, estimula a criação de outras equipes, que é o movimento que vem acontecendo. A primeira edição foi em 2017, no Rio de Janeiro, com oito times. Hoje já somos 82 equipes e mais de 5 mil atletas em todos os estados da federação”, ressalta Carlos Renan, presidente da Ligay Nacional de Futebol.

“A iniciativa nasceu para ser um ambiente receptivo a essas pessoas interessadas em jogar futebol e entrar no esporte sem medo de sofrer piadas sobre trejeitos ou habilidades pouco desenvolvidas”, expõe.

Diversidade em campo: não é só esporte

De acordo com Renan, não é apenas em torno do esporte que o campeonato gera movimento: “O futebol LGBT também movimenta a economia das cidades. A nossa última Ligay nacional, que foi em São Paulo, movimentou R$ 2 milhões só em estruturas. Aí você acrescenta transporte, estadia, turismo, comércio. Então tem um viés econômico também porque há um mercado que gira em torno disso”.

A competição regional contou com venda de produtos e alimentos para o público de mais de 200 pessoas por empreendedores locais, além da arrecadação de alimentos, roupas e produtos de higiene para doação à Outra Casa Coletiva, instituição que oferece assistência a pessoas LGBTQIAP+ em situação de vulnerabilidade social em Fortaleza.

“Temos três anos de trabalho contínuo no acolhimento de pessoas vulneráveis, com atendimento interno, uma moradia temporária e todo esse suporte psicológico, social, jurídico, laboral, toda uma equipe de voluntários que vai ajudar essas pessoas a saírem dessa situação de vulnerabilidade”, explica Aliatar Queiroz, psicólogo voluntário e vice-presidente da Casa.

“Nós somos uma organização sem fins lucrativos e recebemos essas pessoas de muitos lugares, pelo Instagram, no WhatsApp, por meios institucionais como Casa da Mulher Brasileira, delegacias, hospitais, centros de referência. E é tudo trabalho voluntário, a gente funciona através de doações, então essa ajuda do Cangayceiros é muito bem vinda”, completa Renata Gois, que também coordena a Casa.

Para o vice-presidente do Cangayceiros, Johnnathan Maia, cada iniciativa como essa possui um poder de transformação que impacta a vida de quem participa em muitas dimensões.

“Acaba se transformando em uma terapia. A gente vê muitos relatos de jogadores que, a partir do momento que integraram uma dessas equipes, melhoraram o quadro de depressão, pararam de fumar. Então não é só pela inclusão, mas pelo aspecto da saúde também”, diz.

O que também observa Renan Ridley, um dos diretores do time vencedor: “O Ceará infelizmente é um estado que ainda possui altos índices de LGBTfobia e assassinatos contra pessoas travestis e transexuais. A gente fazer essas ações focadas em várias áreas da nossa vida social, incluindo o esporte, é importante para afirmar que o nosso lugar é todo lugar em que a gente quiser estar”.

Ridley enfatiza, ainda, sobre a importância do apoio do poder público, já que os clubes se organizam em política de finanças o ano inteiro para levantar fundos e participar das competições.

“O Governo do Ceará esteve presente na abertura do evento através da secretária da Cidadania e Diversidade, Mitchelle Meira, e esse apoio é essencial porque nos dá estrutura, acompanha e investe em um projeto como esse que é um projeto de inclusão. Não é só esporte”, pontua.