Léo Suricate reclama de abordagem violenta da Polícia na entrada da própria casa

O agitador cultural diz que estava botando o lixo para fora de casa quando foi abordado de forma violenta por agentes do Comando Tático Motorizado (Cotam). SSPDS diz que 11 suspeitos foram detidos na região do Jangurussu durante a operação Opus

18:49 | Mar. 12, 2023

Por: André Bloc
Fortaleza, Ce Br 10.01.23 Na foto: Léo Suricate (Suricate Seboso) em entrevista ao Jornal O POVO (Fco Fontenele/O POVO) (foto: FCO FONTENELE)

Léo Suricate, produtor, agitador cultural e militante do MTST, fez transmissão ao vivo no Instagram neste último sábado, 11, reclamando das abordagens policiais contra jovens de bairros periféricos de Fortaleza. As imagens foram feitas após ele ter sido abordado pelo Comando Tático Motorizado (Cotam), quando estava na porta de sua casa, no Conjunto José Euclides, no Jangurussu, em Fortaleza.

O jovem explica que tinha se arrumado para um evento de hip-hop quando foi colocar o lixo para fora. “Isso aqui vai repercutir porque eu sou uma pessoa conhecida, porque eu apareço na TV e tenho seguidores atrás das minhas costas. Se fosse um pobre coitado, eu tava f*****, talvez tomasse uns tapas”, queixou-se durante a transmissão.

“Eu estava colocando o lixo para fora de casa [quando fizeram a abordagem]. Porque eu estava com um cordão de prata, porque eu pareço um pivete da periferia. Eu tenho cara de marginal. Eu tenho a cara do enquadro”, complementa.

Desde o dia 2 de março, a região do bairro Jangurussu, em Fortaleza, está recebendo ações ostensivas da Operação Opus, organizada pela Coordenadoria Integrada de Planejamento Operacional (Copol) da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS).

Segundo nota da Pasta, 11 pessoas suspeitas de crimes — não listados no texto — foram capturadas, assim como cinco armas de fogo e uma quantidade não citada de drogas. A operação e imagens feitas do helicóptero da Coordenadoria Integrada de Operações Aéreas (Ciopaer), usadas pela SSPDS em divulgações oficiais, foram criticadas por fontes ouvidas pelo O POVO por estigmatizar a região, que nem sequer conta com CEP para os domicílios.

A nota da SSPDS cita ainda que nesta semana os residenciais José Euclides, Luiz Gonzaga e Maria Tomásia receberão o Caminhão do Cidadão e a Unidade Móvel do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (Sine/IDT), para "prestação de serviços para os moradores como emissão de documentos e criação de oportunidades de emprego para os cidadãos".

Cobrança ao Governo do Estado

No vídeo, Leo Suricate reclama ainda da falta de auxílio do governo para resolver demandas para o Grande Jangurussu. “Vocês têm que fazer e não só prometer. Conheçam a p**** da realidade que as pessoas passam no dia a dia. Saibam que a gente recebe a p**** de um fuzil no peito para vocês posarem de gala por aí”, reclama.

“O que me dá mais indignação é que a gente faz campanha para esse povo e eles tratam a gente como conhecidos, como aliados, mas não estão nem vendo”, complementa.

O jovem reclamou da grande quantidade de policiais no Jangurussu neste fim de semana. Nos stories, ele chegou a postar um vídeo de um helicóptero sobrevoando a região. 

Nota da SSPDS

A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) informa que, com o intuito de coibir Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) e Crimes Violentos Contra o Patrimônio (CVPs), na região do Jangurussu – Área Integrada de Segurança 3 (AIS 3) de Fortaleza, foi deflagrada, no último dia 2 de março, a operação Opus. A ofensiva, organizada pela Coordenadoria Integrada de Planejamento Operacional (Copol) da SSPDS, conta com a atuação de órgãos vinculados à Secretaria e de forças amigas.

A pasta ressalta que o trabalho policial foi desenvolvido com base em estudos de dados fornecidos pela Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública (Supesp) e levantamentos de inteligência. A Operação Opus tem o objetivo de oferecer uma atuação qualificada na prevenção de crimes, inibindo a presença de organizações criminosas nos conjuntos habitacionais, realizando saturações e abordagens às pessoas em atitudes suspeitas e veículos, além de remover mensagens de apologia ao crime em muros dos imóveis.

Durante as diligências, 11 pessoas suspeitas de envolvimento em crimes e atos infracionais já foram capturadas. Cinco armas de fogo e drogas também foram retiradas de circulação. As saturações também contam com uma aeronave da Coordenadoria Integrada de Operações Aéreas (Ciopaer) da SSPDS que realiza sobrevoos na região, com o objetivo de garantir a segurança das equipes que atuam em solo, além de observar possíveis evasões de indivíduos em atitude suspeita. As ações contam também com equipes do Comando de Prevenção e Apoio às Comunidades (Copac) da Polícia Militar do Ceará (PMCE).

Integração

É importante destacar que as ações na região são permanentes e contam ainda com o apoio de equipes da Prefeitura Municipal de Fortaleza, que realizam o trabalho de retirada de entulhos e outros serviços relacionados à limpeza urbana. Na próxima semana, os residenciais José Euclides, Luiz Gonzaga e Maria Tomásia receberão o Caminhão do Cidadão e da Unidade Móvel do Sine/IDT (Instituto de Desenvolvimento do Trabalho), com foco na prestação de serviços para os moradores como emissão de documentos e criação de oportunidades de empregos para os cidadãos.

 

Ponto de vista - A vida entre "baculejos"

Menino de área nobre de Fortaleza, eu me orgulho de conhecer o Leo Suricate. E, mais do que isso, de conhecer o Conjunto José Euclides. Aceitei um convite para conversar sobre violência urbana e jornalismo com jovens do Grande Jangurussu e já fui na Cozinha Solidária do Maria Tomásia, sempre a convite de moradores da região.

E não é mais do que minha obrigação conhecer um pouco das periferias de Fortaleza. Afinal, sou editor-chefe de Cidades do jornal mais tradicional do Ceará. Não sou gestor, mas tenho liberdade para apontar o dedo e cobrar gestores para resolverem situações.

Eu podia discutir o mecanismo legal de mandados coletivos. Ou falar do absurdo de moradores de lá não terem CEP mesmo morando há anos no mesmo local. Mas uma experiência minha lá no Zé Euclides vale para esse contexto.

O assunto eram "baculejos". Basicamente, uma abordagem violenta e policiais, que mesmo sem mandado algum resolvem checar se um cidadão pode virar suspeito porque tem "cara de criminoso". Em suma, basicamente o que Leo viveu. Admiti para os meninos que nunca sofri um "baculejo". Um dos jovens levantou a mão e perguntou: "Tio, por quê? Todo mês chegam em mim".

Não acho que caiba a mim responder. 

Artigo de opinião de André Bloc, editor-chefe de Cidades do O POVO