Horto da Agonia: cripta fechada por 50 anos é reaberta após restauro de obras de arte
Inauguração ocorre neste sábado, 25, após celebração da missa na Igreja dos Remédios, às 17hA Via-Sacra, como é chamado o caminho de Jesus Cristo até a crucificação, foi retratada nas paredes de uma cripta localizada embaixo do altar da Igreja de Nossa Senhora dos Remédios, no bairro Benfica, em Fortaleza, no ano de 1940. A arte dos murais feitos por Gerson Faria, pintor nascido em 1889, ambientava o espaço que tinha o nome de Horto da Agonia, onde fiéis intensificavam as orações em momentos de penitência para refletir sobre o sofrimento de Cristo no período da quaresma.
Trinta anos depois, a cripta foi fechada. As obras de arte passaram a acumular manchas, poeira, mofo e infiltrações, danificando o trabalho do pintor. “Não sei qual a compreensão da época, mas acharam por bem fechar. Nós não temos um registro que retrata o motivo de fechar a cripta. Deixaram apenas uma porta”, conta o pároco da igreja, Sílvio Mitozo.
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Em outubro de 2022, essa porta foi aberta para estudantes do curso de conservação e restauração de bens patrimoniais móveis e integrados da Escola de Artes e Ofícios Thomaz Pompeu Sobrinho (EAOTPS). O trabalho de restauro foi finalizado em novembro e a cripta, que passou 50 anos fechada, será reaberta ao público neste sábado, 25, às 17h.
“Nosso objetivo é deixar que se torne um espaço cultural aberto para que todos possam conhecer essa bela obra de arte, que é a maior obra do autor Gerson Faria, que deixou sua marca aqui”, conta padre Sílvio, que foi um dos mobilizadores da restauração do local.
De acordo com a diretora da Escola, Maninha Morais, os alunos aprenderam as técnicas necessárias para restaurar os murais, mas também entenderam a importância da preservação da memória. “É um trabalho muito importante em um país onde cuidar da memória, do patrimônio, é uma coisa ainda em andamento”, comenta.
Entre as cenas registradas nas paredes da cripta estão a Santa Ceia, o Horto da Agonia, o beijo de Judas, a Crucificação, a descida da cruz e as mulheres desoladas após a morte de Cristo.
Primeiros passos: limpeza e estudo
Os arquitetos Kaio Caetano e Thayná Gomes, alunos da escola que participaram da restauração, relatam como encontraram os murais no início do processo, com partes descascadas, cobertas por cimento e rastros de cupins. “Algumas patologias eram mais graves. Haviam partes que não existia nada restante da pintura, porque havia camadas de cimento por cima”, diz Kaio.
Foi preciso refazer o centro da pintura em que Jesus aparece com Jerusalém de fundo. O rosto de Cristo também foi refeito com base em outra pintura existente na cripta. Antes disso, no entanto, foi preciso um estudo minucioso das técnicas, cores e materiais usados pelo artista para pintar as obras.
Thayná explica que Gerson Faria utilizou tintas a óleo e pigmentos com tintas à base de cal ou água, adaptando-se aos materiais que tinha disponíveis. “Outra coisa muito interessante, que acho que é o que dá o deleite a quem visita, é como o artista trabalha com luz e sombra”, diz. Em vez de usar puramente as cores preto e branco, Gerson procurava compor as partes escuras das pinturas com roxos, azuis e verdes, enquanto as partes claras ganhavam tons de ocres e amarelos.
“Tudo isso a gente teve de considerar no momento de intervir para não tirar a característica original”, diz Thayná. Os alunos precisaram ainda selar a pintura original com produtos químicos específicos antes de utilizar qualquer tinta por cima do trabalho de Gerson.
Trabalho árduo e minucioso
Depois do restauro, a cripta ganhou placas que mostram o processo e o rosto dos 12 alunos participantes. A quantidade de pessoas foi importante para conseguir terminar a restauração em tempo hábil. “A gente trabalha com muita delicadeza, porque a nossa própria intervenção pode gerar um novo dano. É muito delicado, minucioso e calmo”, conta Thayná. Para ela e Kaio, o trabalho em equipe foi essencial, como também a mentoria do professor do curso, Antônio Vieira.
O trabalho também vai além das intervenções artísticas nas obras. Relatórios com a catalogação das imagens, das técnicas do período e do que foi feito pelos alunos foram confeccionados. “Se forem necessárias intervenções por outros restauradores, que eles possam ter um guia de como foi o processo e, assim, a gente conseguir manter a conservação e essa ética de restauro”, diz a arquiteta.
História da igreja e conversas com religiosos
Para compreender toda a emoção por trás dos trabalhos de Gerson Faria, os alunos também conversaram com antigos voluntários da igreja que tinham memórias da cripta aberta. Escutar os relatos foi importante para entender a conexão que as pessoas sentiam com o local. Conversas com o padre, o estudo dos simbolismos ou iconografias e das passagens bíblicas escritas pelas paredes da cripta também fizeram parte do processo de restauro.