Obras no Poço da Draga: moradores afirmam que houve pouca participação popular
Estética de plataforma que será construída no espigão é questionada. Comunidade cobra melhorias na Ponte VelhaMoradores da comunidade Poço da Draga, na Praia de Iracema, ainda olham com desconfiança para o projeto apresentado pela Prefeitura de Fortaleza na terça-feira, 24. As obras divulgadas abrangem uma requalificação de 2 km da região, desde o Aterro da Praia de Iracema até o espigão do Poço. A pouca participação no planejamento do projeto é um dos pontos que influenciam a opinião da comunidade.
O morador e presidente do Conselho Gestor da Zona Especial de Interesse Social (Zeis) do Poço da Draga, Sérgio Rocha, relembra que participou de duas reuniões com representantes da Secretaria Municipal da Infraestrutura (Seinf). Na segunda, 23, a proposta foi apresentada pela Prefeitura, com presença do vice-prefeito Élcio Batista. “O formato deveria ter sido mais participativo”, afirma.
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Para ele, os “segmentos interessados”, que seriam surfistas, barraqueiros, banhistas, frequentadores, pescadores, entre outros, não foram ouvidos na concepção da proposta. Apesar disso, algumas questões pontuadas pelos moradores da região foram incluídas, como o recuo dos tapumes da obra do Acquário, que dividia o Poço da Draga do restante da Praia de Iracema.
“A primeira coisa que eu falei para eles é que a gente precisa do afastamento dos tapumes do Aquário. Porque simplesmente [as obras] isolaram a comunidade da Praia de Iracema”, afirma Cássia Vasconcelos, articuladora social e presidente da Associação dos Comerciantes da Praia. A população também pediu que a quadra esportiva próxima ao Pavilhão Atlântico fosse reformada, o que também faz parte do projeto.
Para o também morador Celino Rocha, auxiliar administrativo, as intervenções nesses espaços podem ser “proveitosas” se forem bem mantidas e se forem construídas como o prometido.
Além disso, uma reforma da Ponte Metálica foi solicitada, mas Cássia e Sérgio relataram que a Prefeitura alegou grandes custos para reestruturar o local. A ponte, inaugurada há mais de 100 anos, juntamente com a Ponte dos Ingleses e a Muralha Hawkshaw, passa por um processo de tombamento pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). No entanto, segundo o órgão, o processo pode levar até cinco anos para ser finalizado.
Em nota, a Seinf afirmou que a Ponte Metálica, ou Ponte Velha, não receberá nenhuma intervenção direta. "A proposta da urbanização no espigão do Poço da Draga é oferecer uma alternativa de espaço de convivência e lazer para desestimular a frequentação de pessoas na ponte metálica antiga", diz o texto.
“Mas eu disse que existem atividades que são feitas na ponte. O pulo da ponte, que é muito comum pra nós, moradores da comunidade. Nós não aprendemos a andar, a gente aprende a nadar primeiro. E a contemplação do pôr do sol mesmo, porque a gente tem o pôr do sol mais lindo de Fortaleza. Para onde iriam essas atividades? Foi aí que teve aquela ideia daquele projeto mais megalomaníaco, ali no espigão”, conta Cássia.
Cássia se surpreendeu com o projeto e ainda tem sentimentos mistos quanto a ele. “Milhões que serão gastos ali e dentro da comunidade a gente não tem saneamento básico. Ao mesmo tempo que a gente quer resistir, se a gente for contra, nada acontece. A gente vai continuar do jeito que está, com as crianças correndo perigo fazendo esporte ali, com o Pavilhão Atlântico caindo aos pedaços, com os comerciantes naquela situação, e a ponte caindo, tudo caindo na nossa conta”, afirma.
“O projeto é num formato estético que não condiz nem com a natureza do local, que é um local portuário. Deveria ter sido feito um concurso de ideias para escolher o formato estético do equipamento”, opina Sérgio. Para Cássia, o projeto é mais um que modifica a identidade visual do espaço.
Com o projeto, preocupações em torno da maior quantidade de pessoas frequentando a praia também surgem. Sérgio lembra da importância da instalação de um posto de guarda-vidas no local. Segundo a Prefeitura, a demanda será atendida. O morador também explica que, atualmente, a limpeza da praia é feita pelos próprios comerciantes, outro ponto que precisa de melhoria.
Celino também conta que preferiria uma reforma na Ponte Velha do que a nova proposta no espigão, “pela história da cidade”. Mas diz que pensa nas oportunidades que isso pode trazer para os moradores e comerciantes da área.
“Até onde isso realmente vai beneficiar a gente? Será que eles estão olhando para nós, realmente?”, questiona Cássia. “A gente está vendo o progresso vindo, mas ele não está entrando. Fica só no entorno.”
Prefeitura afirma que houve participação social no projeto
Questionada sobre quantas reuniões foram feitas com a população do Poço da Draga para discutir o projeto de requalificação, a Seinf afirmou que quatro momentos foram promovidos. A secretaria informou que o projeto foi “amplamente discutido e aprovado pelos presentes”.
Em nota, a pasta reiterou que houve espaço para adição de “novas ideias ao projeto, onde todas elas foram atendidas, inclusive com espaços para o lazer, comércio local e resgates históricos daquela comunidade”.
O POVO perguntou também se ainda acontecerão mais reuniões com a população, mas não obteve resposta. Perguntas sobre a escolha do design da plataforma de saltos também não foram respondidas.
Sobre o esgotamento sanitário na região, a Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) afirmou, por meio de nota, que "concluiu o projeto para implantação de esgotamento sanitário na comunidade Poço da Draga". A Cagece também informou que na próxima semana haverá uma reunião com órgãos municipais responsáveis pelo local para definir últimas ações na área.