Ensino médio: pesquisa aponta desafios para prevenir violências em escolas
Estudo questionou 108 professores de escolas estaduais localizadas em Fortaleza. Para pesquisadores, formação em Direitos Humanos e colaboração entre órgãos públicos precisam avançarQuatro em cada dez escolas de ensino médio em Fortaleza constataram algum caso de violação dos direitos de crianças e adolescentes entre 2020 e 2021, segundo professores. A maioria (96,7%) classifica que as violências percebidas são de caráter familiar e comunitário e refletem na escola. Entretanto, apenas 35,2% conhecem um fluxo para seguir caso identifiquem sinais de violência ou violação de direitos.
As informações integram estudo divulgado na noite desta terça-feira, 18, pela organização humanitária Visão Mundial. A pesquisa é a parte final de uma formação sobre comissões de proteção e prevenção às violências dentro das escolas, realizada pela Visão Mundial em parceria com o Centro Universitário Unifametro e a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc), entre março e setembro de 2021. Ao todo, 108 profissionais da educação participaram de rodas de conversa e responderam a um questionário online.
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“Percebemos que falta na formação dos professores, desde sua base, o trabalho das questões dos Direitos Humanos das crianças e dos adolescentes. Por conta disso, eles têm dificuldade de agir na prevenção às violências”, explica Márcia Monte, especialista em proteção da Visão Mundial e docente de Serviço Social.
Márcia esteve à frente da pesquisa e expõe que os profissionais da educação “pela experiência que vão desenvolvendo nas escolas, até sabem fazer a prevenção, mas têm muitas dificuldades quando os casos acontecem”.
A maioria dos respondentes afirmaram não ter tido qualquer disciplina sobre os direitos da criança e do adolescente em sua formação, totalizando 64,8% das respostas.
Os 35,2% restantes apontaram ter estudado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em alguma disciplina ou em oficinas e formações sobre o assunto. Houve ainda afirmações de que a disciplina foi vista, porém, de forma superficial e rápida.
O questionário considerou ainda se, durante o ano de 2020, os professores participaram de capacitações em temas relacionados às violências contra crianças e adolescentes. Apenas 27,8% responderam afirmativamente.
“Outro achado é que a escola está muito longe do sistema de garantia de direitos, dessa articulação com Conselho Tutelar, Ministério Público e outros órgãos da rede socioassistencial, por exemplo”, acrescenta a pesquisadora.
Tipos de violência nas escolas e dificuldades para notificar
Entre aqueles que identificaram casos de violação de direitos, constatou-se que a maioria foram casos de negligência (61,7%). Em seguida, estão violência psicológica (51,1%), violência de gênero (34%), violências autoprovocadas (25,5%), racismo (23,4%), violência física (21,3%) e violência sexual (21,3%). Gravidez e perseguição por facções criminosas também estiveram entre as respostas.
Quando perguntados sobre a notificação dos casos, os professores indicaram o medo das reações da família e da comunidade (45,4%), a ineficiência da rede de proteção (44,4%) e o desconhecimento de como fazer a notificação (32,4%) como fatores dificultadores.
Ao mesmo tempo, o Sistema Integrado de Gestão Escolar (Sige) é desconhecido para a maioria (82,4%) dos respondentes. “Com isso, falta uma sistematização e uma mensuração das diversas violência pelas quais os estudantes passam”, destaca Márcia Monte, especialista em proteção da Visão Mundial e docente de Serviço Social.
Formalmente, os processos citados pela professora são determinados pela Lei Federal 13.935 de 2019, que estabelece a atuação de profissionais de Serviço Social e de Psicologia nas redes públicas de educação básica, e pela Lei Estadual 17.253 de 2020, que autoriza a criação de comissões de proteção e prevenção à violência nas escolas públicas e privadas do Ceará.
Ações do governo estadual
Conforme a Seduc, Fortaleza conta com 167 escolas estaduais, na quais 107 mil alunos estão matriculados e onde 5,4 mil professores trabalham. A pasta afirma em nota que todos os colégios estaduais da Capital têm Comissões de Proteção e Prevenção à Violência contra a Criança e o Adolescente formadas e atuantes.
A Secretaria acrescenta que “tem ampliado o número de psicólogos educacionais e contratou assistentes sociais”. Entretanto, não respondeu ao questionamento sobre o número desses profissionais atuantes nas escolas de Fortaleza.
A pasta conta com a Célula de Mediação Escolar e Cultura de Paz, criada com o objetivo de fomentar ações de prevenção à violência dentro do espaço escolar. O Programa Ceará Educa Mais e a Política Estadual de Desenvolvimento de Competências Socioemocionais também são citadas pela Seduc como maneiras de promover qualificação dos professores e apoio socioemocional aos estudantes.