Famílias ocupam praças do Centro na esperança por doações no Domingo de Páscoa

Dia da fé cristã aumenta expectativa de pessoas em situação de vulnerabilidade social, mas crise econômica pesa no movimento de solidariedade

16:52 | Abr. 17, 2022

Por: Alexia Vieira
Praça do Ferreira, no Centro de Fortaleza, receberá evento com orientações jurídicas gratuitas nesta quinta-feira, 26 (foto: Alexia Vieira / O POVO)

Passar o domingo de Páscoa em casa com a família não é a realidade de quem busca as praças do Centro de Fortaleza para morar ou conseguir doações de alimentos. A fome faz com que dezenas de cidadãos ocupem os locais esperando voluntários de projetos sociais ou igrejas conhecidas por entregar refeições à população vulnerável. No entanto, as doações não dão conta de alimentar a todos.

É o caso de Ana Maria Silva, 44, que esperava alguma ação social ao lado da Praça Murilo Borges, conhecida como Praça da Justiça, com as duas filhas. A mulher relata ter chegado ainda de manhã, estendido um papelão e uma manta, e sentado na calçada aguardando doações que poderiam ou não chegar ao local.

“Eu fico aqui até de noite. Eu estou mais aqui por causa delas [filhas]. Me preocupo mais com elas do que comigo mesma”, admite. Apesar de ter conseguido sair da situação de rua, o dinheiro que recebe do programa federal Auxílio Brasil não é suficiente para pagar, ao mesmo tempo, o aluguel de onde mora e custear a alimentação familiar. Por isso, voltar à praça. Até o meio-dia, horário em que O POVO conversou com Ana, a única doação recebida tinha sido de duas barras de chocolate para as crianças.

Na Praça do Ferreira, local frequentemente escolhido pelos projetos sociais para distribuição de comida, dezenas de pessoas aguardavam por todos os lados. Crianças, adultos e idosos, moradores da praça e de outros bairros estavam atentos para o caso de qualquer movimentação de voluntários no entorno.

Segundo Naiane Gomes, 30, que ocupa a praça desde 2014, o cenário não é exclusivo do Domingo de Páscoa, apesar da expectativa para as doações em datas como essa ser maior. “No começo da pandemia teve muita doação, mas esse ano tá parado”, lamenta. “A gente fica aqui na expectativa. Ainda mais hoje, que está tudo fechado. Na semana tem o refeitório público, de noite aparece uma sopa”, diz Naiane.

A mulher, que é mãe de um bebê, afirma que se não conseguir nada, a única opção será ficar sem comer até a segunda-feira, quando a movimentação volta para o Centro. O café e o pão doados na manhã deste domingo por voluntários alimentou algumas das pessoas da praça, mas Naiane não foi uma delas.

O Refeitório Social mencionado por Naiane é mantido pela Prefeitura de Fortaleza e funciona apenas de segunda a sexta-feira. Já os contêineres onde funcionam os Espaços de Higiene Cidadã são abertos de domingo a domingo, segundo a Secretaria Municipal dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS). No entanto, a quantidade de refeições não é suficiente para suprir a demanda.

Raimunda Telma da Conceição, 50, que sempre vai para a Praça da Bandeira receber as quentinhas entregues pela Prefeitura em um dos contêineres, conseguiu o almoço. Ela explica que muita gente que estava na praça não conseguiu comer e continua aguardando alguma doação. “As pessoas ficam o dia inteiro aqui esperando alguém passar para dar algo”. Telma não mora na rua, mas também não conseguiu dinheiro para se alimentar neste domingo de Páscoa.

Mesmo com poucos recursos, voluntários se organizam para doar alimentos

Pelo menos 400 pessoas receberam uma sopa de frango com legumes que o projeto Queira Bem (@projetoqueirabem) entregou na Praça do Ferreira e na Praça da Bandeira no feriado da Sexta-feira Santa, 15. Os voluntários levaram ainda 700 garrafas de água — uma das principais demandas do público atendido — refrigerante, pães e lembranças de Páscoa para as crianças.

Apesar da alegria que sente fazendo o trabalho voluntário desde 2016, Andressa Monaliza Macêdo reconhece a dificuldade de captar recursos e de dar conta da quantidade de pessoas que precisam se alimentar por meio das doações.

“Estamos fazendo ações quinzenalmente nas praças, e há sempre muita dificuldade nessa captação de doações. Esse foi um dos dias que mais tinham pessoas em situação de vulnerabilidade. Pelos relatos, fazia dois dias que não tinha estouro [nome dado para projetos que levam refeições] e eles estavam com muita fome e sede”, conta.

Neste domingo, os voluntários do instituto Doando que Se Recebe (@institutodoandoqueserecebe) e do Grupo Amor (@grupo_amor) também marcaram para realizar ações de distribuição de refeições nas praças do Centro durante a tarde.