Inclusão e combate ao preconceito são temas de caminhada no Dia Mundial do Autismo em Fortaleza

Evento foi realizado neste sábado, 2, data que marca o Dia Mundial de Conscientização Sobre o Autismo. Depois da passeata, os participantes se reuniram em uma roda de conversa no Calçadão da Praia de Iracema

21:36 | Abr. 03, 2022

Por: Luciano Cesário
Evento debateu avanços e desafios na luta pela inclusão social de autistas (foto: Divulgação/CDDPD-OAB-CE)

No Dia Mundial de Conscientização Sobre o Autismo, lembrado nesse sábado, 2 de abril, uma caminhada foi realizada na avenida Beira-Mar, em Fortaleza, para marcar a importância da data e incentivar o combate ao preconceito e à discriminação contra pessoas afetadas pelo Transtorno do Espectro Autista (TEA). Organizada pela Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB-CE, a ação teve como tema “Lugar de Autista é em Todo lugar”.

A caminhada partiu do Boteco Praia, no Meireles, e seguiu até as instalações do Programa Praia Acessível, na Praia de Iracema. O ato contou com a participação de autistas, seus familiares, Ministério Público do Ceará (MPCE) e de entidades da sociedade civil que lutam pela inclusão social de pessoas diagnosticadas com o Espectro. A mesma mobilização, de caráter nacional, também foi realizada em outras capitais pelo Brasil.

Após a conclusão do trajeto, os participantes se reuniram no calçadão da Praia de Iracema e promoveram uma roda de conversa para debater os avanços e desafios na busca pela inclusão social de pessoas com TEA. O primeiro a falar foi o estudante de turismo e palestrante, Eduardo Rodrigues, de 22 anos. Autista, ele reforçou que a condição não pode ser considerada uma barreira social para o convívio interpessoal e profissional.

“Não existe pessoa melhor para falar sobre o autismo do que um autista, ele é o verdadeiro protagonista. O mais importante é sempre acreditar que você é capaz de chegar aonde você quiser, porque todos nós temos sonhos, sejam pessoais ou profissionais, e eu tenho certeza que não é diferente com cada um de vocês que estão aqui hoje. E nesse processo de construir as relações, o apoio da família é fundamental, por isso agradeço muito à minha mãe e ao meu pai, especialmente”, disse.

A advogada Gabrielle Bezerra, mãe de um adolescente autista, que também esteve no evento, destacou que a luta pela inclusão e o combate ao preconceito contra pessoas autistas deve envolver toda a sociedade, e não apenas aqueles que são diagnosticados com o Espectro ou seus familiares. “Estar nessa caminhada com meu filho é muito representativo, porque lutar contra o preconceito e a discriminação não é tarefa só de quem tem autismo, mas também de toda a sociedade”, afirmou.

Ela ainda relatou que identificou os primeiros sinais de TEA no seu filho quando ele tinha 4 anos. Hoje, com 17, o adolescente leva uma vida como a de qualquer pessoa de sua idade, salvo algumas exceções, como dificuldades em se expor a multidões ou lugares muito tumultuados.

“Eu fui notando aos poucos que ele tinha alguns comportamentos diferentes, principalmente a linguagem repetitiva, e estava tendo um atraso no desenvolvimento cognitivo, aí eu fui atrás e consegui o diagnóstico. É muito importante que as famílias entendam os sinais e busquem o diagnóstico para dar todo o apoio, caso seja confirmado”, contou a mãe.

O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB-CE, Emerson Damasceno, ressalta que a inclusão de pessoas autistas nos espaços sociais deixou de ser apenas uma luta, como era no começo deste século, e já se transformou em direito. No entanto, ele ressalta que ainda há desafios à vista.

“A ocupação dos espaços, tanto físicos quanto institucionais, por pessoas autistas, é, sobretudo, uma questão legal, que está na convenção internacional da ONU e na lei brasileira de inclusão. É uma questão fundamental de cidadania. A gente só democratiza a sociedade se a gente democratizar também as relações interpessoais, garantir aos autistas o lugar de fala que lhes é de direito”, comentou.

O advogado ainda afirmou que a ideia de promover a caminhada em um local aberto, num dos pontos mais movimentados da Capital cearense, está diretamente ligada ao objetivo da mobilização. “A gente pensou num espaço que tivesse acessibilidade arquitetônica e urbanística razoável, que pudesse ser de boa convivência para as pessoas autistas e seus familiares. E o próprio objetivo da marcha tem a ver com isso, mostrar que o espaço público deve ser ocupado por todos, independentemente das condições de cada um”, acrescentou.

Durante a caminhada, houve presença de mascotes de clubes de futebol, distribuição de panfletos informativos e apresentações da banda do Corpo de Bombeiros do Ceará (CBM-CE). A jornalista do O POVO, Benfica de Oliva, que esteve presente no local, pontuou em análise publicada neste sábado, 2, que o barulho provocado pelos instrumentos pode ter sido prejudicial aos autistas com quadro de hipersensibilidade, uma das alterações sensoriais comuns identificadas nas pessoas que têm o Espectro.

Mas segundo Emerson Damasceno, não houve ocorrência de irritação auditiva entre os presentes. Ele alega que tanto o som utilizado no evento quanto o barulho causado pelos equipamentos musicais “não representaram qualquer incômodo, pois tudo aconteceu em um espaço aberto, em que o barulho era difundido sem incomodar a audição das pessoas que estavam acompanhando, sejam autistas ou não”.

“Não houve nenhum tipo de reclamação, inclusive algumas crianças interagiram muito com os bombeiros enquanto eles tocavam os equipamentos, elas adoraram”, acrescentou o advogado.

Saiba mais

O Dia Mundial da Conscientização do Autismo foi instituído em 2007 pela Organização das Nações Unidas (ONU). Além de simbolizar a luta pelo fim do preconceito e discriminação social contra quem têm TEA, a data também marca uma ampla campanha de mobilização para difundir informações à sociedade sobre as características do autismo.

Os primeiros sinais do Espectro Autista aparecem ainda na infância e tendem a persistir na adolescência e na idade adulta. Na maioria dos casos, eles se manifestam aos 5 anos. As pessoas diagnosticadas com TEA podem desenvolver condições comórbidas, como epilepsia, depressão, ansiedade e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade.

O estágio clínico e o nível intelectual costumam variar de um caso para outro. Pode haver, por exemplo, desde comprometimento profundo a casos com altas habilidades cognitivas, conforme o Ministério da Saúde. Há situações em que as pessoas autistas podem viver de forma independente, no entanto, alguns casos exigem mais atenção e apoio constantes ao longo de toda a vida.

Na convivência do dia a dia, as intervenções psicossociais baseadas em evidências científicas podem ser ótimas aliadas. Terapias comportamentais e programas de treinamento para pais, por exemplo, podem reduzir as dificuldades de comunicação e de comportamento social e ter um impacto positivo no bem-estar e na qualidade de vida de pessoas autistas.

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