Maioria dos esquartejamentos no Ceará seria praticada por facções

Quatro casos de esquartejamento foram registrados em setembro deste ano. O POVO fez um levantamento dos desmembramentos e decapitações dos últimos cinco anos

20:22 | Set. 29, 2021

Por: Jéssika Sisnando
 MAIORIA dos casos de esquartejamento no Ceará estaria relacionada a guerra entra facções criminosas (foto: FÁBIO LIMA)

Um corpo esquartejado foi encontrado em um terreno abandonado na avenida Duque de Caxias, no Centro de Fortaleza, nesta quarta-feira, 29. Além de diversas partes do corpo arrancadas, a vítima estava sem os cinco dedos da mão, o que é uma simbologia de facção criminosa. Esse é o quarto esquartejamento do mês de setembro de 2021.

Ainda neste mês, partes do corpo de um homem foram encontradas no Siqueira e no Anel Viário. Esse caso, no Bom Jardim, em que o adolescente filho da vítima foi apreendido suspeito pela ação, e a própria companheira da vítima, Sara Nascimento Parente de Morais, também foi detida por envolvimento no assassinato, foi uma exceção dentre as motivações de crimes cruéis desse tipo que acontecem em Fortaleza e na Região Metropolitana (RMF). A maioria ainda seria relacionada a facções criminosas, conforme apurou O POVO.

Os outros dois casos do mês foram em Caucaia e no bairro Jangurussu, em Fortaleza. No primeiro, um jovem chamado Luan teve braços, pernas e cabeça arrancados, no dia 16; e o segundo foi uma decapitação no bairro Jangurussu, no dia 19, de uma vítima não identificada. Ambos teriam relação com organizações criminosas. No caso de Luan, os suspeitos foram apreendidos. Eles afirmaram à Polícia que uma traição da organização criminosa os motivou a cometer o crime tão brutal. 

Em um balanço feito pelo O POVO, neste ano há um caso de decapitação em Cascavel no mês de março, e no mês de maio uma mulher foi esquartejada no Conjunto Palmeiras, em Fortaleza. Em 15 de fevereiro, uma mulher foi esquartejada e toda a ação foi filmada pelos criminosos. 

2016 foi um ano com esquartejamentos e carbonização em massa dentro do sistema prisional do Ceará, quando 14 presos foram mortos em rebeliões. O membro do Conselho Penitenciário, Cláudio Justa, ressalta que não existem mais esses tipos de mortes cruéis nas unidades prisionais do Ceará, no entanto, essa prática se estendeu para as ruas e, desde então, é uma marca das facções.

"Esses atos de extrema crueldade são realizados como assinatura do poder deles. Eles usam essa forma de extrema violência. É uma lógica que remonta historicamente aos períodos mais antigos da sociedade da questão do esquartejamento público, da situação que o indivíduo tenha que sofrer publicamente para se tornar exemplo e inibir futuras ações contra o rei, neste caso, contra as facções", ressalta.

Justa diz que as mortes cruéis são uma forma de impor, com violência, a presença das organizações. "Acabaram dentro dos presídios, mas a sua presença fora continua. É uma dimensão simbólica e demonstração de poder sobre aquela comunidade que está com o risco de domínio", explica o membro do Conselho Penitenciário.

Cláudio Justa explica que essas ações não foram iniciadas no Ceará, mas no Rio de Janeiro e em São Paulo, com o início das facções. Com a expansão desses grupos no Nordeste, as mortes com características de tortura foram implementadas no Estado.

O POVO solicitou à Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) resposta sobre os últimos casos de esquartejamento e decapitação e recebeu a informação que no caso de Caucaia, onde o jovem Luan foi morto, houve a apreensão de três adolescentes. Já no caso do Jangurussu e Conjunto Palmeiras, as investigações estão em andamento (confira nota na íntegra no final da matéria).

Em nota, a pasta também reforçou que a população pode contribuir com as investigações repassando informações que auxiliem os trabalhos policiais. As informações podem ser feitas para o número 181, o Disque-Denúncia da SSPDS, ou para o (85) 3101.0181, que é o número de WhatsApp, por onde podem ser feitas denúncias via mensagem, áudio, vídeo e fotografia. As denúncias também podem ser encaminhadas para o telefone (85) 3257.4807, do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), que também é o WhatsApp do Departamento. O sigilo e o anonimato são garantidos.

Nesta quarta-feira, 29, O POVO procurou novamente a SSPDS, às 17h50min, no intuito de que o órgão comentasse a apuração de que a maior parte dos crimes de esquartejamento são relacionadas a facções criminosas e aguarda resposta.

Casos de esquartejamento 

- Em dezembro de 2020, um caso de vítima decapitada e carbonizada na Barra do Ceará. Em abril do mesmo ano, um suspeito de roubo foi apanhado pela facção que predomina na comunidade dos Coqueirinhos, em Fortaleza, e esquartejado.

- Em novembro de 2020, um vendedor de produtos de limpeza foi esquartejado depois de ter ido vender produtos no bairro Vila Velha. Ele era do Parque Potira, em Caucaia, e os criminosos de Fortaleza acreditavam que o rapaz era de uma facção rival.

- Em 11 de dezembro de 2020, a cabeça de um homem foi encontrada boiando na Praia de Iracema. O restante do corpo teria sido encontrado em Iparana. Um vídeo em que criminosos perguntavam o bairro onde ele morava foi amplamente divulgado nas redes sociais.

- Em 2018, no mês de outubro, uma organização criminosa esquartejou e decapitou uma vítima do sexo masculino e arrancou o coração dela. O crime aconteceu em Caucaia, e o corpo foi encontrado no dia 3. 

- Em novembro de 2017, uma cabeça humana foi encontrada dentro de uma caixa no bairro Bela Vista

Jovens torturadas e desmembradas vivas no Vila Velha

Ainda em 2020, três moças foram torturadas e esquartejadas em um mangue do Vila Velha, duas delas foram desmembradas com vida. A ordem para a morte delas partiu da facção Guardiões do Estado (GDE) e foi dada no presidio. O alvo era Nara Aline Mota, apontada pelos criminosos como faccionada, mas Darcyelle Ancelmo de Alencar e Ingrid Teixeira Ferreira foram executadas por residirem com Nara. Um vídeo que mostrava a ação cruel foi gravado e divulgado em redes sociais. Suspeitos foram presos e julgados

Tribunal do crime no Jangurussu; apartamento com pedaços dos corpos e pele humana

Em setembro de 2017, a Polícia encontrou pedaços de corpos em um apartamento no bairro Jangurussu, em Fortaleza. O lugar funcionava como um "tribunal do crime". As pessoas seriam julgadas por facções e em seguida mortas e esquartejadas. Em alguns casos, uma parte do corpo era arrancada e as vítimas deixadas com vida. No apartamento havia pedaços de pele que aparentavam ser de diferentes vítimas.

Ainda em setembro de 2017, um corpo decapitado foi encontrado no bairro Vila Velha. Em janeiro do mesmo ano, um jovem de 15 anos foi decapitado na Barra do Ceará. Em novembro de 2016, um açougueiro esquartejou uma mulher no bairro Carlito Pamplona, todos os bairros localizados na Capital.

Esquartejamento e carbonização de corpos em massa

Um dos casos de grande repercussão, em que houve esquartejamento e carbonização em massa, aconteceu em maio de 2016, no sistema prisional do Ceará, onde 14 presos foram mortos em rebeliões. O reconhecimento deles só foi possível após exames de DNA. Nesta situação, o Ministério Público, por meio de um relatório, identificou, pela primeira vez, a presença de três facções criminosas nos presídios cearenses, sendo o Comando Vermelho (CV), o Primeiro Comando da Capital (PCC) e a Guardiões do Estado (GDE).

A maioria dos crimes cruéis relacionados a organizações criminosas são filmados, nas rebeliões de 2016 não foi diferente. Imagens de dezenas de presos sendo esquartejados e queimados vivos enrolados a colchões foram divulgadas em grupos de WhatsApp.

2017 foram 20 casos 

O POVO registrou que pelo menos 20 pessoas foram decapitadas ou esquartejadas no ano de 2017. Dos 20 crimes de decapitação ou esquartejamentos contabilizados no Ceará, 15 foram registrados na Capital, nos bairros Barra do Ceará (2), Planalto Ayrton Senna, Mondubim, José Walter, Granja Lisboa, Jangurussu (2), Pirambu, Vila Velha, Carlito Pamplona, Sapiranga (2), Ancuri, Aracapé. Os demais ocorreram em Pacatuba, Aquiraz, Horizonte, Tianguá e Caucaia. Em cinco deles, as vítimas foram esquartejadas. Também foram registrados no Ceará vários casos de tortura e carbonização.

 

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Casos 

26/09/2021 - Corpo esquartejado é abandonado no Anel Viário 

16/09/2021 - Esquartejamento de jovem de 23 anos em Caucaia  

19/09/2021 - Decapitação no Jangurussu 

11/03/2021 - Esquartejamento em Cascavel

15/02/2021 - Criminosos filmaram esquartejamento de mulher no Canidezinho

01/05/2021 - Corpo de mulher decapitado no Conjunto Palmeiras

14/12/2020 - Corpo decapitado e queimado encontrado na Barra do Ceará

03/04/2020 - Suspeito de roubo esquartejado por facção 

12/11/2020 - Vendedor de produtos de limpeza esquartejado

11/11/2020 - Cabeça de homem é encontrada boiando na Praia de Iracema 

02/03/2018 - Três mulheres foram torturadas, mortas e esquartejadas no Vila Velha

17/07/2018 - mulher é esquartejada e tem corpo jogado dentro de fossa no Conjunto Prefeito José Walter

20/09/2017 - Corpo decapitado encontrado no Vila Velha 

9/01/2017 - Jovem de 15 anos decapitado na Barra do Ceará

12/11/2017 - Cabeça humana é encontrada dentro de caixa na Bela Vista

25/12/2017 - Mulher é encontrada sem cabeça na manhã de Natal em Fortaleza

03/10/2017 - Corpo esquartejado é encontrado jogado em rua no Jangurussu

02/11/2016 - Açougueiro esquarteja mulher no Carlito Pamplona

Pocisionamento da SSPDS sobre últimos casos de esquartejamento:

Caso Caucaia

A Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE) informa que o Núcleo de Homicídios e Proteção à Pessoa (NHPP), da Delegacia Metropolitana de Caucaia (DMC), concluiu as investigações acerca de um homicídio ocorrido dia 16 deste mês, no bairro Tabapuazinho, em Caucaia – Área Integrada de Segurança 11 (AIS 11) do Estado. Poucas horas depois do crime, três adolescentes de 17 anos foram apreendidos pela Polícia Militar do Ceará (PMCE) com uma arma de fogo, drogas e munições. O procedimento foi remetido à Justiça.

 

Caso Jangurussu

A Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE) informa que a 3ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) segue investigando um caso de homicídio, que aconteceu no dia 19 deste mês, no bairro Jangurussu – Área Integrada de Segurança 3 (AIS 3) de Fortaleza. Na ocasião, o corpo da vítima de 25 anos, do sexo masculino, foi encontrado em via pública. Diligências e oitivas são realizadas pelo departamento especializado, visando identificar os suspeitos do crime e a motivação.


Caso Conjunto Palmeiras

A Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE) informa que a 3ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) segue investigando um caso de homicídio de uma adolescente, que aconteceu no dia 1º de maio, no Conjunto Palmeiras – Área Integrada de Segurança 3 (AIS 3) de Fortaleza. Na ocasião, o corpo da vítima de 15 anos, do sexo feminino, foi encontrado em via pública. Diligências e oitivas são realizadas visando elucidar o caso.