Advogados entram no STF com reclamação constitucional após despejo de 62 famílias em Fortaleza

Há pelo menos cinco famílias em situação de vulnerabilidade extrema: três com mulheres grávidas, uma com pessoa com autismo e outra tem uma moradora com leucemia

23:52 | Set. 27, 2021

Por: Leonardo Maia
Alto das Dunas, ocupação no bairro Vicente Pinzón (foto: FCO FONTENELE)

O Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar (EFTA) entrou com uma reclamação constitucional no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a expulsão de 62 famílias da ocupação Alto das Dunas, localizada no bairro Vicente Pinzón, em Fortaleza.

Conforme o EFTA, o episódio, ocorrido na última quarta-feira, 22, descumpre determinação do STF que suspende por seis meses despejos, desocupações, remoções forçadas ou reintegrações de posse de natureza coletiva em imóveis que sirvam de moradia de populações vulneráveis. Para locais ocupados durante a pandemia do Covid-19, o Judiciário federal estabelece que a reintegração só pode acontecer mediante alocação dos moradores em abrigos.

A advogada Mayara Justa, que acompanha o caso pelo EFTA, disse que o caso já foi acolhido pela ministra do STF Rosa Weber, que já pediu informações à Justiça estadual. Mayara disse que tentará ter uma conversa com Weber para mostrar o estado das famílias, em relação a como elas ficaram e para onde foram. Pelo menos cinco famílias estão em situação de vulnerabilidade: três estão com mulheres grávidas, uma tem uma pessoa autista e outra tem uma moradora com leucemia.

Mayara argumenta ainda que o Judiciário tem se mostrado ciente das “condições reais” da população e decidido de forma favorável às ocupações. “Além das crises sanitárias, nós temos também a crise econômica, e isso tem levado a novas ocupações. Resolver só via reintegração de posse é uma solução desumana”, acrescenta a advogada, citando que a Constituição Federal prevê a moradia como um direito fundamental.

Em reunião com uma representante da Secretaria Municipal do Desenvolvimento Habitacional (Habitafor), o EFTA e as famílias que representaram a ocupação tentaram buscar uma saída por meio do aluguel social, mas a administração disse que a alternativa era inviável. “Dessa forma, foi acordado o compromisso de a Habitafor incluir, de forma emergencial, cinco famílias no aluguel social, levando em consideração a situação de vulnerabilidade extrema”, relata o órgão em notícia em seu site oficial.

Entenda o caso

Na última quarta-feira, 22, famílias que ocupam lotes no bairro Vicente Pinzón, em Fortaleza, foram expulsas em ação de desocupação. Segundo pessoas que moram no bairro, a Polícia Militar (PM) chegou ao local por volta das 6h30min, colocou parte dos móveis para fora das casas e tratores fizeram a derrubada das construções. Os lotes ficam na avenida Douglas Marshall com rua Narcisio Lima e começaram a se formar em janeiro de 2021. Conforme O POVO apurou, moradores tentam tirar telhados das casas para salvar parte do que foi erguido.

A advogada Mayara Justa, que estava no local em que as demolições estavam sendo feitas, falou que havia feito um levantamento preliminar e a conclusão foi de que pelo menos 62 famílias foram impactadas. Ela reforça a ilegalidade da ação da polícia e conta que houve um extrapolamento da área reivindicada. "A proprietária estava aqui no local insistiu que eram os lotes dela, mas não eram", enfatizou.

O despejo estaria relacionado com decisão liminar da 27ª Vara Cível de Fortaleza, lançada em abril deste ano. No caso, a Polícia Militar do Ceará (PMCE) ressaltou em nota que todo o ato transcorreu "de forma pacífica, sem necessidade, portanto, de uso de força policial, nem tampouco auxílio para retirada de materiais do imóvel".

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