Qualidade de calçadas: desafio de ser pedestre em Fortaleza

|SEGURANÇA NO TRÂNSITO| Andar por Fortaleza pode ser experiência muito diferente a depender do local da Cidade. Na mesma via pode faltar padrão. No Dia Nacional do Trânsito, neste 25 de setembro, O POVO discute a mobilidade a partir das personagens mais vulneráveis: os pedestres

20:15 | Set. 25, 2021

Por: Alexia Vieira
Avenida Santos Dumont com Desembargador Moreira, na Aldeota. Aldeota tem calçadas em condições bem melhores em relação a bairros periféricos (foto: Aurelio Alves)

Calçadas largas com piso tátil, rampas, arborização, sem buracos, desníveis ou rachaduras. Em quantos locais de Fortaleza é possível encontrar passeios para pedestres com essas características? Para a artesã Regina Guilhon, 66 anos, é difícil ver calçadas na cidade que sejam adequadas para idosos, crianças ou cadeirantes. "Principalmente por causa dessa história de todo mundo fazer uma calçada mais alta e outra mais baixa. Não tem condição da gente andar".

A agente escolar Ana Kelly de Andrade, 25 anos, diz que as condições precárias das calçadas próximas de onde mora fazem com que ela escolha outros meios de transporte. "Eu moro perto do Castelão e lá não é muito acessível para pedestres porque as calçadas são mal feitas, cheias de buracos, o espaço é pequeno pra passar, tem rachaduras e carros estacionados", reclama.

Além disso, Ana Kelly conta que não se sente segura para andar a pé na maior parte da cidade. "Porque tem a questão de carros e outros transportes não respeitarem, até no sinal vermelho eles passam, estacionam nas calçadas sem querer saber se a pessoa tá passando por ali ou não".

"São poucos os locais na cidade que você consegue caminhar sem ter barreiras físicas e às vezes as próprias calçadas tem desníveis. Isso para uma pessoa jovem não chega a ser uma barreira, mas para uma pessoa idosa, uma pessoa com alguma deficiência física, até mesmo uma criança, torna esse caminhar mais cansativo, muitas vezes até impossível", afirma Denise Sá Barreto, membro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Ceará.

Para a conselheira, as iniciativas da Prefeitura de Fortaleza têm melhorado o campo da mobilidade. No entanto, acredita que ainda há "muito a ser feito" a respeito das calçadas. Denise chama atenção para medidas paliativas utilizadas pelo poder público, como a pintura do asfalto como forma de criar uma passagem para pedestres ou aumentar a calçada já existente de uma via. "Pode resolver a curto prazo porque as pessoas precisam se locomover, mas o ideal é que você melhore mesmo a condição física dessas calçadas", opina.

Devido ao preço alto da gasolina, a contadora Judy Sales, 47 anos, resolveu fazer a pé alguns caminhos curtos que precisa andar diariamente. Apesar de reconhecer que algumas calçadas foram melhoradas no trajeto que passa pela avenida Desembargador Moreira, que tem trechos que passaram por obras de requalificação em 2020, até a rua Silva Paulet, Judy ainda encontra buracos e desníveis. "Alguns [buracos] você acaba fincando o pé dentro", relata.

Também no bairro Aldeota, a bancária Zaquia Barroso, 56, andava com a mãe, Liana Barroso, 83, e as duas reclamaram da condição das calçadas. "As calçadas poderiam ser muito melhores", diz Liana. "Poderiam melhorar a limpeza, a própria acessibilidade, os buracos. Tem locais até de difícil acesso para uma pessoa da idade dela", completa Zaquia.

Simone Teixeira, 34, assistente jurídica, acredita que o bairro Aldeota ainda tem estruturas melhores do que outros da Capital. "Tem lugares que você não consegue nem andar direito". É o que relata a moradora do bairro Monte Castelo Marisa Bezerra de Lima, 23. A recepcionista conta que em época de chuva, o local onde os pedestres trafegam na avenida Sargento Hermínio fica totalmente alagado, na maior parte do trecho entre as ruas Mário Studart e Henrique Ellery.

"Não é um lugar favorável pros pedestres. Depois que iniciaram a obra do alargamento, não foi priorizada calçada. Tem gente que topa, que cai, fora que tem lixo e buraco demais", relata. A opinião de Marisa é compartilhada pelo comerciante Edilson Marçal, 71, que reclama do perigo da via para quem passa a pé e acredita que uma calçada com boa infraestrutura beneficiaria toda a comunidade. "Melhora para nós, melhora pro comércio, para todo mundo".

De acordo com o professor Mário Azevedo, do Departamento de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC), quanto mais pessoas caminhando pelas ruas de uma cidade, maior a tendência de que aquele ambiente se torne mais seguro. "Você não está sozinho na rua para sofrer algum tipo de violência, assalto. Tem mais pessoas para ver o que está acontecendo nas ruas".

O professor explica ainda que a opinião de Edilson está correta, pois mais pessoas andando a pé nas ruas pode afetar positivamente o comércio daqueles locais. "A pessoa caminhando pela calçada tem condições de olhar pras vitrines das lojas. E ela vai parar pra tomar uma água, comer alguma coisa. Nisso vai surgir todo um sistema que vai funcionando para dar suporte a essas pessoas que vão caminhando", diz. Para ele, Fortaleza está no rumo certo com as políticas de mobilidade, mas acredita que ainda vai demorar para que a caminhabilidade da Capital chegue a um melhor patamar.