Pessoas em situação de rua desconhecem início do processo de vacinação
Com o início da quarta fase de vacinação em Fortaleza, pessoas em situação de rua já podem ser imunizadas desde a última segunda-feira, 24Em uma manhã de céu aberto e bastante calor em Fortaleza, a sombra das árvores e dos prédios do Centro servem de abrigo para aqueles que fazem da Praça do Ferreira o seu lar. Acostumados com a invisibilidade social, poucos são os que sabem que o processo de vacinação para pessoas em situação de rua teve início na última segunda-feira, 24, na Capital.
"Não, eu não estou sabendo de nada contra a Covid-19. Do pessoal que está aqui, ninguém me falou isso não. Não passou ninguém avisando. Pra gente que é morador de rua, isso não existe não, sei que estão vacinando idosos, mas pra gente não tem nada. É mais fácil alguém passar aqui e levar tudo da gente do que alguém da prefeitura ou um presidente fazer algo por nós", desabafa Francisca Elenice, 42, que vive na praça há cinco anos.
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Além da desinformação sobre o início do processo de vacinação para o grupo, a descrença na gravidade da doença é mais um empecilho no caminho da imunização dessa parcela da população.
"Eu não gosto de tá tomando essas coisas não, eu já sou abençoado por Deus. A gente nunca ganha nada de governo nenhum e vai ganhar agora? Quem ajuda são os 'irmãos' que passam aqui e fazem uma doação. Nunca tem nada benéfico pra gente. Não acredito que vão fazer isso pra agora", relata Maicon da Silva, 33, que está em situação de rua desde 2018.
Com o início da quarta fase do plano de vacinação em Fortaleza, pessoas em situação de rua passam a fazer parte de um dos grupos prioritários contemplados. Segundo a titular da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Ana Estela Leite, agentes da Prefeitura estão realizando uma busca ativa para o cadastramento dessas pessoas.
"Estamos vacinando as pessoas em situação de rua. Pessoas de extrema vulnerabilidade social, esse público prioritário é o primeiro público da quarta fase da campanha de vacinação contra a Covid-19. Estamos fazendo uma busca ativa, as equipes do consultório da rua, as equipes do Centro Pop, estão fazendo busca ativa e cadastrando essas pessoas no Saúde Digital para que nossas equipes possam aplicar as vacinas em locais de acolhimento específicos para esse público", explica a secretária.
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A SMS esclarece que a aplicação dos imunizantes é realizada em locais de acolhimento municipal voltados para este grupo, e que apenas pessoas que possuam o Cadastro de Pessoa Física (CPF) poderão ser vacinadas. De acordo com a Secretaria de Saúde, as pessoas que não possuem CPF devem procurar fazer a documentação. Segundo a assessoria de imprensa da SMS, a Secretaria de Desenvolvimento Humano já possui um trabalho voltado para a elaboração dos documentos dessas pessoas.
Segundo a SMS, o processo de vacinação conta com o auxílio dos locais de acolhimento justamente por possuírem uma proximidade maior com pessoas que vivem em situação de rua, e assim podem acompanhar o processo de agendamento do grupo que frequenta o abrigo.
Há sete anos a Praça do Ferreira tornou-se a moradia de Francisco Pereira, 35, relata não conhecer ninguém que já tenha recebido alguma dose da vacina. "Eu não sei disso, não fiquei sabendo sobre a vacinação. Eu passo o dia aqui, mas não fui avisado. Não conheço ninguém que vive na Praça e que tenha sido vacinado. Eu não tenho vontade de me vacinar, até acho que possa ser importante para as pessoas, quem sabe eu vá um dia", conta.
Em uma das vias de acesso à praça, na rua Guilherme Rocha, Regina Lúcia, 59, aguardava por uma caridade sentada ao lado de uma lanchonete. Dos entrevistados pela reportagem, ela é a única que diz saber da disponibilidade de vacinas para pessoas em situação de rua.
"Eu tô sabendo dessa vacina, mas não faço questão. Fiquei sabendo que já tomaram e não ficaram bem. É uma coisa que a gente quer acreditar na salvação, mas a gente fica sabendo desses casos e ficamos com medo, por isso não quero tomar", relata Regina, que já está há 50 anos vivendo na praça.
Todas as vacinas disponíveis no Brasil passam pelo crivo e aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo o informe da Prefeitura de Fortaleza, a maioria das reações após a vacinação são leves, sendo a mais comum a dor no local da injeção, efeito comum a todas as aplicações de vacinas.
A SMS explica que durante a busca ativa realizada pela Prefeitura de Fortaleza é feita a conscientização da importância da imunização. Apesar de muitos não entenderem a gravidade da doença ou a melhor forma de se prevenir contra o vírus, a SMS busca levar esse entendimento ao grupo.
Atualmente, a meta é que pelo menos 1.718 pessoas em situação de rua sejam vacinadas em Fortaleza durante a fase quatro. Os números são constantemente atualizados e podem passar por alterações.
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