Fortaleza tem lojas abertas irregularmente, trânsito intenso e pessoas sem máscara nas ruas

O POVO circulou por bairros como Centro, Montese, Bom Jardim e Messejana e constatou que o isolamento social rígido no Ceará, oficialmente em vigor até o próximo 21 de março, não está sendo seguido como deveria em várias áreas da cidade

16:58 | Mar. 15, 2021

Por: Ítalo Cosme
Bairro do Montese. Movimentação da cidade no lockdown nesta segunda feira. (foto: JÚLIO CAESAR)

A adesão aos decretos municipal e estadual que impõem o lockdown em todo o Ceará até o próximo dia 21, para conter o avanço da Covid-19, ainda está longe de ser realidade. Quem percorre a Capital cearense percebe inúmeros estabelecimentos abertos irregularmente, grande fluxo de veículos e, principalmente em áreas da periferia, intensa movimentação de pessoas na rua, parte delas sem uso correto de máscaras ou desrespeitando o distanciamento social.

O POVO visitou alguns bairros na manhã desta segunda-feira, 15, e identificou descumprimentos básicos. No Centro de Fortaleza, a população de rua continua sem proteção, máscara ou qualquer medida que os auxilie no enfrentamento ao vírus. Mesmo com parte das lojas fechadas, a área estava com bastante fluxo de automóveis no horário.

O montador de estruturas Douglas Ramires, 23, após cumprir sete dias de afastamento do trabalho por motivos de doença, aguardava ser testado para Covid-19 no posto de testagem instalado na Praça do Ferreira. "Eu sinto medo porque, a qualquer momento, eu ou minha mãe, por exemplo, podemos pegar essa doença. Infelizmente a gente não vê. É uma doença invisível. É como se nós estivéssemos vivendo um terror", comenta.

Para ele, a população precisa se conscientizar mais e cumprir as regras estabelecidas pelo Poder Público para enfrentar a pandemia do novo coronavírus. No entanto, pontua que "não dá para viver completamente isolado porque as pessoas precisam viver e comer".

Na avenida Alberto Magno, no bairro Montese, também havia grande circulação de pessoas. Barbearias, casas de jogos e lojas para aluguel de vestidos para noiva, mesmo proibidas, funcionavam durante a manhã. Cenário comum, as filas e aglomerações também podiam ser vistas no entorno de agências bancárias da região.

Na Oscar Araripe, principal avenida do bairro Bom Jardim, tendas para venda de frutas e verduras estavam atendendo normalmente. Papelaria, lojas técnicas de informática e bancas de revistas funcionavam à meia-porta. Em determinado ponto da via, um casal vendia roupas em um caminhão. A quantidade de pessoas com máscara era inferior à dos que seguiam a recomendação - embora a principal regra do lockdown seja estar em casa.

 

Para Lúcia Albuquerque, do Comitê Popular de Enfrentamento à Covid-19 do Bom Jardim, a pandemia acentuou diversos processos de exclusão que a periferia vive há muitos anos. "Se você imaginar que, nessa região, nós temos baixa cobertura de saneamento básico, problemas graves em algumas áreas aqui do Grande Bom Jardim, que oficialmente são cinco bairros e mais de 30 comunidades de pertencimento, há um grande déficit habitacional. Tem gente que vive em um cômodo com dez, 12 pessoas. Ainda mais com crianças sem ir para a escola, isso significa mais gente dentro de casa. Então, o isolamento social fica mais difícil. Isso não necessariamente é uma justificativa", destaca.

Para a representante, que também integra o Centro de Defesa da Vida Herbert de Sousa, as condições sanitárias, anteriores a este período pandêmico, já comprometiam a qualidade de vida das pessoas. "A grande maioria da população vive de bicos. Nesta segunda onda, nós não temos qualquer auxílio posto. As campanhas de ajuda humanitária também reduziram. As pessoas sobrevivem de ajuda de outras".

Lúcia reflete que há influência das vozes negacionistas diante da desobediência do decreto para isolamento social rígido, mas considera que há muitas situações em que os indivíduos vulneráveis não são assistidos e sequer conseguem comprar máscaras ou álcool em gel.

Próximo à igreja Matriz, na praça da Messejana, uma família trabalhava vendendo máscaras. Quase uma dezena de varais com diversas opções de proteção estava montado no local. O chefe do negócio, em conversa com um fornecedor, alertava que, em instantes, deveria desmontar a estrutura porque a fiscalização chegaria por ali.

Para reiterar a fala do homem, outro companheiro de trabalho afirmava que uma mensagem no WhatsApp mostrava equipes de fiscalização no bairro José Walter. “Todo mundo vai pegar essa doença. Agora, é preciso se proteger. Por isso, eu estou vendendo essas máscaras. Quando a fiscalização chega, infelizmente, eu tenho que sair. Mas eu volto”, admitiu o homem, que pediu para não ser identificado. 

Fluxo de veículos reduz 60% em Fortaleza no último domingo

O fluxo veicular no trânsito de Fortaleza reduziu consideravelmente no fim de semana. No último domingo, 14, a queda foi de 60%. No sábado, 13, caiu 41,2%. Os dados da Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC) consideram o período antes da pandemia para comparação.

Os números foram obtidos por meio dos equipamentos de fiscalização eletrônica. Conforme o órgão, as regiões do Centro e da Aldeota apresentaram os maiores percentuais de diminuição. No Centro, houve queda de 61,4% na circulação no sábado e 79,4% no domingo. Na região da Aldeota, o percentual de redução foi de 54,6% no sábado e 69,3% no domingo.

“O ideal seria que a redução fosse acima de 90%. Mas a gente sabe que não é possível porque há pessoas que precisam continuar circulando, principalmente da parte de quem está autorizado a circular. Neste momento, é importante que as pessoas fiquem em casa e só saiam nas formas autorizadas via decreto ou em situação de emergência”, Wellington Cartaxo, gerente de Operação e Fiscalização da AMC.

Em parceria com outros órgãos de trânsito, a AMC afirma que atua de forma especial para coibir a circulação e promover o controle de entrada e saída de automóveis na capital cearense. "A redução revela a concentração da população no que se refere aos decretos em vigor. Esperamos que haja também uma redução no número de acidentes, mas principalmente que a medida seja efetiva para reduzir a demanda por leitos nos hospitais”.

O POVO solicitou à AMC os dados de fluxo veicular por bairro, mas os números não foram repassados. Conforme a assessoria do órgão, por conta da reorganização territorial da cidade, não seria possível enviar o detalhamento. Cerca de 72 equipamentos de fiscalização eletrônica em toda a cidade captam a movimentação de veículos.

“A atuação do órgão de trânsito também se estende ao monitoramento de pontos com aglomeração e de ações educativas para conscientizar as pessoas a ficarem em casa”, finalizou a Autarquia em nota.