"Tentaríamos fazer tudo melhor, mas não deixaríamos de ajudar", diz monja que ajudou a combater fogo
22:10 | Jan. 08, 2021
A irmã Isabele Maia, de 29 anos, é uma das monjas que participaram da linha de frente no combate ao incêndio em uma vegetação próxima ao Mosteiro de Nossa Senhora da Visitação, no bairro Dias Macedo, em Fortaleza, nessa quinta-feira, 7. Em entrevista ao O POVO, a postulante, que vive no templo há um ano e dois meses, relata a experiência vivida por ela e por um conjunto de monjas no combate ao fogo próximo ao Mosteiro.
O POVO: Qual foi o primeiro pensamento e sentimento que vocês tiveram quando viram o começo do incêndio?
Irmã Isabele Maia: Quando a gente viu, primeiro a gente pensou: vamos chamar os bombeiros e depois começamos a rezar. Queríamos muito que não chegasse ao nosso terreno. Ligamos para os bombeiros e eles chegaram na esperança de conter o incêndio, mas o vento era muito forte e não ajudou, e acabou com que as chamas chegaram próximo ao Mosteiro. A gente viu que os bombeiros sozinhos não estavam dando conta e não podíamos ficar paradas esperando, porque podia chegar à nossa casa. Antes de ser nossa casa, é a casa de Deus. A gente não podia esperar que um desastre pudesse acontecer. Então, as irmãs saíram correndo, buscaram mangueiras e baldes para tentar apagar o fogo. A gente não pensou em todos os cuidados, não deu tempo. A única coisa, particularmente, que eu pensei na hora foi em pegar uma toalha molhada para me proteger do calor. E a outra coisa foi um sapato mais fechado para proteger os meus pés. Foi o que deu tempo para arrumar para poder sair correndo para ajudar as irmãs a apagar o incêndio.
OP: Em que momento vocês tomaram a decisão de ir tentar apagar o fogo?
Isabele: Quando a gente viu a primeira chama chegar do nosso lado do terreno. A gente viu que não ia dar para esperar. Assim que chegou ao nosso lado, saíamos correndo para tentar apagar. Por não ser um local abafado, gente conseguia se aproximar do fogo, porque se fosse um local fechado talvez poderíamos ter ficado sufocada. Nesse momento, eu queria parafrasear a Madre Teresa de Calcutá, a Santa Teresa de Calcutá: "O que a gente faz pode ser uma gota no oceano, mas sem essa gota o oceano não seria enorme." Aparentemente, o que a gente fez pode não ter sido grande coisa e o que conteve o incêndio, já que tivemos apoio dos bombeiros e vizinhos, mas temos certeza de que contribuíamos de alguma forma, principalmente para o fogo não atingir nossa capela, local que estava mais perto das chamas.
OP: A iniciativa de ir até o incêndio foi um pensamento em conjunto? Como foi o trabalho em equipe?
Isabele: No momento em que tudo começou, eu não cheguei a presenciar muito. Quando percebi, já olhei a correria das irmãs. Mas, eu acredito que foi um pensamento espontâneo de todas, foi uma iniciativa em conjunto. Na hora, eu já vi várias monjas com a mangueira na mão indo em direção ao incêndio. Essas primeiras irmãs foram avisando as outras que foram se aproximando para ajudar também. Todas já estavam cientes que estava tendo um incêndio por conta da forte fumaça, mas quando a gente percebeu que começou a atingir o nosso terreno, foi que começamos a ir em direção ao fogo. Algumas mais idosas não podiam realmente está na linha de frente, mas ajudaram orientando para que lado íamos e rezando também, que ajudou bastante, tanto que a gente conseguiu conter parte do incêndio próximo ao Mosteiro.
OP: Você teve medo durante o incêndio?
Isabele: O medo estava mais na preocupação de uma pelas outras do que o fogo em si. Olhávamos uma para outras para saber se estavam com máscara, pedindo para ter atenção em cobrir o rosto. O medo mesmo era de não acontecer o pior com nenhuma de nós e com a nossa casa, o Mosteiro. O maior medo era de acontecer algo com a casa de Deus, que é a nossa casa, e com as minhas irmãs.
OP: Como ficou o senso de responsabilidade do espaço mediante ao incêndio? O que você pensava?
Isabele: Proteção. Apenas pensava nisso, pois o Mosteiro é sagrado, assim como todo o local em volta dele. Tudo para nós aqui é sagrado, desde da vegetação que foi atingida até os animais que moram aqui. O senso de responsabilidade foi em pensar no que era sagrado e que tínhamos que proteger tudo, contando conosco também, que somos templo do Espírito Santo.
OP: O que vocês fizeram depois que o incêndio foi controlado e como se sentiram?
Isabele: A gente agradeceu a todos que estavam envolvidos. Temos um grande respeito pelo trabalho dos bombeiros. E assim que acabou veio um sentimento enorme de gratidão. Não é só porque eles estavam fazendo o dever deles, mas eles realmente ajudaram muito. Lógico que ficamos bem cansadas depois que o fogo foi controlado, mas aliviadas com tudo. Algumas irmãs tiveram ferimentos leves, como arranhões, mas ficaram bem depois.
OP: Sobre o incêndio, faria algo de diferente?
Isabele: Acredito que se tivesse mais água, a gente ajudaria mais. Tentaríamos fazer tudo melhor para conter as chamas, mas não deixaríamos de ajudar. Com os recursos que tínhamos, fizemos o melhor que podíamos e não faríamos nada de diferente. A única coisa de diferente era para tentar fazer melhor.
OP: Como ficou o seu sentimento em relação ao Mosteiro após o incêndio?
Isabele: Para mim, aqui é antecipação do Céu. O sentimento forte de gratidão tá bem presente. A gente vive para louvar a Deus como se tivesse de frente para Ele. Tudo gira entorno para que a gente mantenha aqui um ambiente de paz. Talvez pensando nessa paz que a gente busca todo dia, ontem pensamos rápido em ajudar para voltar esse clima de paz para conseguimos voltar para essa antecipação do Céu aqui na Terra. Mas eu sei que se vier outros momentos difíceis como esse, eu sei que posso contar com as minhas irmãs.