Defensoria Pública alerta para casos de assédio em entrevistas de emprego

Do desconforto visual aos toques, o assédio é crime. Apesar da legislação, há desconhecimento tanto dos direitos da mulher quanto dos apoios disponibilizados em sociedade

14:23 | Set. 14, 2020

Por: Marília Freitas
Foto de apoio ilustrativo. O auditor fiscal do MPT também destaca que o assédio sexual no trabalho é mais frequente com mulheres (foto: Unsplash/Melanie Wasser)

Na última semana, relatos nas redes sociais circularam sobre casos de assédio durante uma entrevista de emprego em Fortaleza. Conforme O POVO apurou, o caso aconteceu no bairro Aldeota, onde um recrutador chamava as interessadas na vaga e realizava as entrevistas, onde posteriormente aconteceria o crime do assédio: do desconforto visual aos toques. Apesar de existir uma legislação, ela ainda é considerada branda por diversas vítimas que normalmente já trazem consigo uma sensação de silenciamento favorecia por uma sociedade machista e assim, perpetuando o crime.

O assédio, previsto como crime no Código Penal (art. 216-A), pressupõe a existência de relações hierárquicas entre o autor e a vítima, ou seja, por exemplo: o assediador é o empregador ou chefe e o funcionário é o assediado. O poder então é usado com a finalidade de obter alguma vantagem sexual, como beijos, contato físico etc. O crime é previsto com pena de 1 a 3 anos. 

No caso da conduta praticada nas ruas, em meios de transporte ou em outros contextos, o crime é o de importunação sexual ou estupro de vulnerável. São previstos, respectivamente, nos artigos 215-A e no Art. 217-A do Código Penal. Apesar da existência, muitas vítimas ainda não se sentem seguras para denunciar devido a um medo ou a sensação de que "não dará em nada", como no caso da entrevista. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSPDS), nenhum boletim de ocorrência relatando o caso foi descrito até a manhã da última sexta-feira, 11.

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Os assédios são crimes de ação penal pública, ou seja, a competência das denúncias fica a encargo do Ministério Público do Estado (MPCE), conforme explica a defensora pública e supervisora do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher (Nudem) da Defensoria Pública do Estado do Ceará, Jeritza Braga. A Defensoria, inclusive, atua no suporte psicossocial para as vítimas que podem - e devem - buscar ajuda nos setores públicos tanto para culpabilizar o agressor quanto para ressignificar a dor do assédio.

"O que elas precisam entender é que não precisam ter vergonha, pois elas não são culpadas, elas são vítimas", destaca. A defensora expõe que ainda vê uma falta de conhecimento a respeito da identificação do crime contra seu corpo. "A partir do momento em que você se sente desconfortável com alguma coisa - uma palavra, um olhar de alguém -, existem outras formas de você se sentir violentada além do toque físico. Então as mulheres precisam descobrir isso e a partir do momento em que elas tem esse conhecimento, elas precisam saber onde buscar ajuda e o que fazer", conta.

A sensação de culpabilização da vítima favorece a perpetuação do agressor em sociedade. Sem a denúncia registrada, não há como fazer algo contra o autor do crime. Muitas mulheres sentem um receio de perseguição ao denunciarem, pois há uma sensação de desacreditação do poder público. Muitas então tentam alertar outras mulheres do crime através de denúncias nas redes sociais, recorrente em outros casos como #ExposedFortal e #ExposedCariri

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Para Jeritza, a ferramenta é importante para trazer uma sensação de "eu não sou a única" para as mulheres. Mas as denúncias não podem ficar apenas nas redes pois a divulgação não responsabiliza o autor do assédio - por isso a importância de realizar o Boletim de Ocorrência (BO). "Elas devem ser usadas, para além da repercussão, para divulgação do atendimento do poder público. Ele age para responsabilizar o agressor", explica.

O crime por parte do recrutador deve repercutir nos canais de denúncia devido ao fato da possível posse de dados pessoais das vítimas, como telefones e endereços. Isso por si só já caracteriza a importância da denúncia, segundo Jeritza. "Precisamos tomar posse do poder e do direito que temos a partir do momento em que você é violentada ou assediada. Se ficarmos calados, se nada acontecer a essas pessoas, ele fará isso com outras mulheres".

A orientação, então, é buscar ajuda. O Nudem atua fornecendo apoio e atendimento psicológico às vítimas de violência sexual, violência doméstica e em casos de assédio. O núcleo segue em atendimento remoto através dos seguintes canais:

 

Em Fortaleza, a Casa da Mulher Brasileira abriga a Delegacia de Defesa da Mulher, Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e atendimentos do Ministério Público e Defensoria Pública. As denúncias acontecem através dos canais:

– Administrativo Casa da Mulher Brasileira (85) 3108.2992 / 3108.2931;
– Centro de referência e Atendimento a Mulher Francisca Clotilde (85) 3108. 2965;
– Centro Estadual de referência e Apoio a Mulher (85) 3108.2966;
– Defensoria Pública do Ceara (85) 3108.2986;
– Ministerio Publico do Ceara (85) 3108. 2940 / 3108.2941;
– Juizado da Violência Domestica e Familiar Contra a Mulher (85) 3108.2971;

Em casos de flagrante, há a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, no telefone 180.