#ExposedFortal: Saiba como orientar crianças e adolescentes sobre consentimento, assédio e violência sexual

Especialistas explicam que o diálogo requer honestidade, compreensão e companheirismo por parte dos pais e responsáveis

A hashtag ExposedFortal dominou o debate cearense, na última semana, com denúncias de assédio e violência sexual nas redes sociais, cometidos por homens e adolescentes que teriam grupo no WhatsApp para publicar imagens íntimas sem consentimento. As denúncias estão sendo investigadas com prioridade pela Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente (Dceca), mas a ação para evitar mais casos do tipo não pode, e nem deve, parar no âmbito policial.

Questões relacionadas ao consentimento e sexualidade devem ser introduzidas em casa pelos pais e responsáveis desde que os filhos são pequenos. A psicóloga Luana Martins explica que é entre os 3 e 4 anos de idade que as crianças começam a ter percepção do próprio corpo - época adequada para começar a discutir sobre corpo e consentimento.

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Isso não significa sentar a criança na frente da televisão e exibir discussões com termos técnicos ou pesados demais, como assédio ou estupro. Na verdade, tudo pode ser apresentado por meio de brincadeiras e reflexões. Luana ilustra com a técnica das cosquinhas, utilizada por uma conhecida:

“O filho da minha amiga pediu para ela fazer cosquinhas nele, e aí ela foi lá e fez. Teve uma hora que ele disse ‘para!’, e ela parou. Aí ela disse: ‘Olha, tá vendo, filho? Eu fiz cosquinha em você porque você pediu, e quando você pediu para eu parar, eu parei. Porque é seu corpo, você que decide quem pode tocar nele e o que podem fazer com seu corpo”, relata.

 

 

Como ensinar que o corpo da criança deve ser respeitado

Conversas do tipo transformam a compreensão da criança. Além de aprenderem a dizer não para toques indesejados, elas também aprendem a respeitar o corpo dos outros. Entretanto, só falar é insuficiente. É preciso que os pais e responsáveis ponham em prática o que ensinam.

Por isso, a psicóloga Rebeca Fontgalland reforça a implementação de hábitos simples, mas significativos, como não obrigar as crianças a beijar e abraçar pessoas, mesmo que sejam familiares. “É importante quando você for pegar no seu filho, você mesmo pedir autorização para pegar nele. Para que ele possa se acostumar desde cedo a esse momento, de que ele pode autorizar”, explica Rebeca.

Inclusive, a psicóloga Luana Martins sugere que as pessoas sejam explicativas até com os bebês. Segundo ela, o ideal é sempre avisar o que for fazer com o bebê. “Dizer, olha eu vou te pegar. Olha, vou trocar tua fralda. Vamos tomar um banho agora… É o corpo do outro que tá ali. É por meio dessas ações cotidianas que vamos começando a cuidar e criar essa noção [de consentimento]”, explica.

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De acordo com Rebeca, os momentos de higienização são os melhores para discutir o consentimento de partes mais íntimas ainda. Para isso, o primeiro passo é dar o nome correto aos órgãos: pênis, vagina e seios. Se preferir dar nomes como florzinha e pipi, garanta que no futuro irá introduzir os nomes mais técnicos. Segundo a psicóloga, saber nomear é essencial para que as crianças possam, principalmente, denunciar quando forem tocadas sem consentimento em partes sexuais.

Ainda, é importante que pais e responsáveis deixem claro que as crianças podem confiar neles para contar qualquer coisa. São conversas como essa que no futuro deixarão adolescentes confortáveis para denunciar assédios sabendo do apoio dos pais.

Com a idade, é normal que os filhos tenham dúvidas sobre sexualidade. Veja como responder a elas, de acordo com infográfico produzido para o Especial LABETA - Educação sexual.
Com a idade, é normal que os filhos tenham dúvidas sobre sexualidade. Veja como responder a elas, de acordo com infográfico produzido para o Especial LABETA - Educação sexual. (Foto: O POVO)

Como orientar adolescentes

O fato é que nem todos os pais e responsáveis conversaram com os filhos pequenos sobre essas questões. Então, como se reaproximar dos filhos adolescentes para discutir o #ExposedFortal, por exemplo? Para a psicóloga Rebeca, a primeira coisa que os pais devem fazer é refletir sobre como eles desejariam ter recebido essas informações dos pais deles. “Esse é o pontapé inicial para que os pais se sintam mais confortáveis para abordar algum assunto, se colocando no lugar do filho”, afirma.

Além disso, a adolescência permite que os pais falem mais diretamente sobre o assunto com os filhos. A psicóloga Luana complementa que nessa idade já é possível usar o linguajar técnico, como abuso e estupro. Para introduzir o assunto, Rebeca sugere pegar como gancho as próprias reportagens sobre o hashtag Exposed e questionar: “Filho, você viu aquela reportagem sobre o exposed?”

“E aí o filho vai se interessar ou não. Ou ele vai ficar abismado ou não. Ou vai ficar calado. Ou o filho vai poder falar… O importante é estimular a fala. É demonstrar o interesses dos pais em relação ao assunto, mesmo que o pai nunca tenha falado sobre isso antes”, explica a especialista. Assim, os adolescentes encontram na figura dos pais espaço para se posicionar e para pedir orientação.

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Tanto Rebeca, quanto Luana explicam que o mais importante é conhecer o próprio filho. Saber do que ele gosta e mostrar interesse por conhecer e entender são formas de demonstrar presença e atenção. A dica é perguntar e pesquisar - nunca de maneira invasiva - do que os filhos gostam, que atividades eles acham interessante e porquê. Assim, a relação com os adolescentes é construída no companheirismo.

Por outro lado, existem ocasiões em que é difícil se reconectar com eles. Nesses casos, conte com uma rede de apoio. As especialistas comentam que às vezes os adolescentes se sentem mais confortáveis para falar sobre algumas temáticas com tios e avós, por exemplo. Como responsável, é importante manter-se atento e garantir que essas pessoas estão preparadas para orientá-los com prudência.

Pais e responsáveis devem ser exemplo

Falar de consentimento e explicar sobre abuso sexual implica falar em sexualidade. “A sexualidade está conosco desde o nosso nascimento e fica até a morte. Ela é sobre relações humanas, diferente de genitalidade, que é relacionada diretamente ao coito, às relações sexuais”, explica a sexóloga Zenilce Bruno.

De acordo com a especialista, o maior problema nas conversas sobre sexualidade está nos adultos, que carregam preconceitos na fala. Muitas vezes, os pais preferem proibir no lugar de orientar, contribuindo apenas para que as dúvidas naturais dos filhos sejam respondidas por terceiros.

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Além disso, muitos desalinham a fala com a prática. É incoerente explicar para filhos que mulheres devem ser respeitadas, mas manter atitudes machistas e misóginas em casa. Luana exemplifica com a divisão das tarefas domésticas: o discurso de respeito some quando apenas a mãe é responsável por cuidar do lar.

Por isso, a psicóloga reforça que é dever dos responsáveis refletirem sobre os próprios hábitos e transformarem o discurso em realidade. “Tem grande impacto um menino ver que o pai tem atitudes de respeito com as mulheres, não objetifica, não faz coisas sem consentimento. Em diferença de um pai que vive assediando, vive tendo atitudes machistas. Por mais que ele não fale sobre isso, os exemplos são percebidos”, comenta Luana.

 

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