Após um mês do desabamento, sobreviventes buscam retomar rotina e lidar com memórias da tragédia
Danos materiais, físicos e psicológicos são algumas das consequências que quem, de alguma forma, foi afetado pelo desabamentoHá um mês, Fortaleza segurava o fôlego para assistir às consequências do desabamento do edifício Andréa, localizado no bairro Dionísio Torres. A terça-feira, 15 de outubro, foi interrompida às 10h30min pela tragédia que viria a marcar a vida de diversos residentes do prédio, moradores e trabalhadores do bairro. Ao todo, nove mortes foram registradas e sete pessoas foram retiradas dos escombros com vida. Nos dias que seguem o fato, sobreviventes tentam voltar à normalidade, mesmo com memórias tão frescas do acontecido.
“Acho meio difícil ele esquecer tão cedo. Passamos por essa, mas, se Deus quiser, ele vai ficar bom”, diz Jocélia Moreira, irmã de Gilson Gomes. O homem estava em um mercadinho que foi atingido quando o prédio desabou. Gilson teve as pernas e alguns dedos dos pés esmagados e teve alta do Instituto Dr. José Frota apenas no dia 8 de novembro. Ainda abalado com a tragédia, ele evita falar sobre o assunto. Jocélia relata que o irmão precisa utilizar cadeira de rodas para se locomover e depende da ajuda da família no tratamento.
As consequências para a mobilidade de Gilson ainda não são claras. Durante o período de internação no hospital, houve a possibilidade de amputação dos membros inferiores, que depois foi descartada pelos médicos. No entanto, dois dedos do pé esquerdo foram retirados. Agora, a família se reveza para cuidar dele, que segue com estado de saúde debilitado. Gilson cerca-se, principalmente, da esposa e dos três filhos. Ele também recebe apoio de uma psicóloga. “A gente fala que agora ele tem duas datas de aniversário. Fico feliz de ele estar aqui contando a história, mas muito triste pelo caso”, conta Jocélia.
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AssineQuem viu tudo acontecer e ainda precisa voltar ao local diariamente também não consegue esquecer o barulho ou o susto. O eletricista Fernando de Castro ainda trabalha na obra de um dos prédios próximos ao Andréa. Ele estava em serviço quando o desabamento aconteceu. “Estar de segunda a sexta do lado da tragédia não faz bem para ninguém. Não tem um dia que a gente não fale sobre o assunto”.
Por conta do bloqueio das ruas próximas do local do acidente, Fernando e as outras três pessoas de sua equipe precisaram passar cerca de 20 dias sem trabalhar no local em que estavam contratados. Além de lembrar dos momentos de tensão, quando ficaram presos dentro do imóvel e impedidos de sair por causa dos escombros do edifício, o mês foi difícil financeiramente. Fernando perdeu a moto, que foi esmagada pelo prédio. Com a ajuda de familiares e amigos, conseguiu comprar outra.
“Nosso horário de intervalo era na sombra do prédio, no local que caiu. Principalmente quando estamos almoçando, aqueles momentos de silêncio, ficamos olhando um pro outro. A memória ainda está muito fresca”, relata. Fernando diz que o clima na vizinhança continua pesado. Comerciantes, moradores e trabalhadores comentam sobre o desabamento frequentemente. O local também é visitado por curiosos, que chegam a incomodar com perguntas. O objetivo dele agora é acabar o trabalho no local e seguir em frente. “Quero sair de perto para ver se a lembrança não fica tão forte”.
Investigações
A Polícia Civil ainda não concluiu o inquérito que investiga as causas e responsáveis pelo desabamento. O órgão deve pedir dilação do prazo de conclusão para o Poder Judiciário. A perícia realizada pelo Núcleo de Perícia e Engenharia Legal e Meio Ambiente (Nupelm), da Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce), também não foi finalizada. O laudo segue sem prazo de conclusão. De acordo com os responsáveis, o trabalho é minucioso e requer levantamento de dados e análises.
Pelo menos 36 pessoas foram ouvidas durante as investigações. Dentre elas, o engenheiro José Andresson Gonzaga dos Santos, responsável pelas obras nas pilastras do edifício. Segundo o advogado Brenno Almeida, o cliente foi duas vezes ao 4º Distrito Policial. A primeira, ainda na mesma semana que o prédio caiu, para prestar depoimento, e a segunda para tirar dúvidas do delegado sobre quantas pessoas trabalhavam para a construtora nas obras do Andréa.
“Tendo em vista que ele estava embaixo [do prédio] na hora do desabamento, realmente dá um distúrbio emocional. Está sendo bastante difícil, diante da gravidade da situação. Mas ele está tentando retomar a vida. Em qualquer momento que é preciso ir às autoridades policiais, ele está presente, não se escusando”. A defesa de Andresson acompanha cada novo elemento adicionado nas investigações, como o histórico de intervenções no prédio, e aguarda a conclusão da perícia.
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