Presidente do Cremec explica como se investigam suspeitas de erro médico

Entenda como tramitam no Conselho Regional de Medicina casos como o do médico Danilo Dias. Apesar dos casos problemáticos em que ele atuou, o presidente do Cremec ressalta que ainda não é possível atestar que houve erro médico. E o profissional tem direito a defesa

Após passar por polêmica quando a youtuber e humorista cearense Camilla Uckers precisou ser internada com urgência para retirar implantes de silicones nos glúteos, o médico Danilo Rocha Dias se envolveu em mais um caso de suspeita de erro médico, dessa vez em São Paulo, quando uma paciente morreu depois de passar por cirurgia.

Danilo Dias enfrenta quatro processos judiciais por erro médico, duas denúncias no Conselho Regional de Medicina e um inquérito criminal. Entretanto, conseguiu emitir registro profissional para atuar em São Paulo. A cirurgia de lipoaspiração e abdominosplastica resultou na morte de uma mulher, operada por ele no início de março. É o segundo caso de óbito em que o profissional se envolve: a cunhada dele morreu em 2016 após passar por uma lipoaspiração.

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Embora o caso envolvendo a morte de uma paciente seja precedido pela internação de Camilla Uckers, que afirma ter ouvido de um médico "Ou tira a prótese ou morre de infecção generalizada", ainda não há como apontar com certeza se os dois casos têm relação com erro médico praticado por Danilo.

A afirmação partiu de Helvécio Neves Feitosa, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará (Cremec). Segundo ele, a culpa de Danilo Dias só pode ser apontada após resultado de todo o processo de julgamento, que tem início em sindicância e conta com uma investigação ampla e completa.

Em conversa com O POVO Online, Helvécio explicou como funciona o processo de investigação de um possível erro médico: "O Conselho, após ter recebido a denúncia, instaura procedimento que é uma sindicância. Há um setor específico para isso, que conta com um grupo de conselheiros, e é nomeado o sindicante que deve fazer uma apuração inicial", esclarece o presidente do Cremec.

As denúncias são recebidas pelo Cremec por duas formas distintas: quando há um denunciante ou quando o próprio Conselho toma conhecimento do caso através da mídia.

Durante a fase inicial o denunciante é ouvido, provas (como prontuários médicos e matérias veiculadas na mídia) são recolhidas. Algumas vezes, o denunciado pode ser ouvido neste momento. Após essa apuração inicial, é gerado um relatório que aponta se há ou não indícios de transgressão ética.

"Se não houver indícios de transgressão médica, essa sindicância é arquivada. A parte insatisfeita pode recorrer a uma segunda instância, que o Conselho Federal de Medicina (CFM). Se houver indícios, essa sindicância é transformada em processo", aponta Helvécio.

Este processo é semelhante a um processo judicial: o médico tem direito a defesa; são ouvidas testemunhas das duas partes (denunciante e denunciado), no máximo de cinco. O processo, então, passa das mãos de um sindicante para um instrutor nomeado para instruir o processo. Cabe a ele solicitar mais testemunhas ou provas, caso entenda que há necessidade.

A exemplo do que acontece na Justiça comum, o processo resulta em um julgamento que será feito pelo pleno do Conselho Regional de Medicina. "Este julgamento pode resultar em absolvição ou em condenação do médico. Ou seja, é um procedimento que leva um tempo, já que há prazos processuais", contou o presidente do Cremec. Segundo ele, o tempo total de um processo costuma varia de 1 ano e meio a 2 anos. Novamente, ambas as partes podem recorrer da decisão junto ao CFM.

De acordo com o Artigo 22 da Lei 3268/57, as penas disciplinares aplicáveis pelos Conselhos aos seus membros são cinco. Em duas delas, mais leves, a pena é confidencial (advertência confidencial em aviso reservado; e censura confidencial em aviso reservado). Nas outras três, as penas são publicáveis (censura pública em publicação oficial; suspensão do exercício profissional até 30 (trinta) dias; e cassação do exercício profissional sujeito à aceitação posterior por parte do Conselho Federal). As cinco penas estão listadas em ordem de gravidade.

Como as duas primeiras são penas aplicadas de forma confidencial, a sindicância ou o julgamento devem correr em segredo até que a pena seja decidida. Por esse motivo, Helvécio Neves se resguardou de comentar sobre possíveis processos aos quais Danilo Rocha Dias esteja respondendo no Cremec.

"Sempre evitamos nos manifestar previamente diante de um caso concreto, pra não estar fazendo um pré-julgamento. Não podemos tomar uma posição prévia pra depois não perdemos a legitimidade para julgar", complementa.

Até que o processo seja concluído e a pena seja definida, o médico ainda tem possibilidade de obter registro para atuar profissionalmente em outros estados - o que foi feito por Danilo em São Paulo, no ano de 2017, e no Rio de Janeiro em 2018. No caso da morte em São Paulo, uma investigação será conduzida pelo Conselho Regional do próprio estado.

Caso haja entendimento de que se trata de caso de maior gravidade, o processo pode ser priorizado. "Pode haver um olhar especial no sentido até de proteção da sociedade. O Conselho, na verdade, é de defesa da boa prática médica, não de defesa dos médicos. É também de proteção da sociedade ao ser contra a má prática médica", defendeu Helvécio.

Há também um mecanismo de interdição ética, quando o exercício da profissão é proibido para certo indivíduo. "A culpa do médico, entretanto, não pode ser presumida, ela tem que ser provada", continua Helvécio. "Você pode realizar um procedimento 100 vezes da mesma forma. Em 99 delas, dá certo. Mas em 1, tem algum problema. Muitas vezes nós temos essas variações que não constituem erros, mas acidentes".

Mesmo que exista uma reincidência de casos suspeitos envolvendo Danilo Rocha Dias, ainda não há comprovação de que houve erro médico. Tal culpa só pode ser apontada ao fim do processo, que deve indicar se houve uma das três formas de erro médico: negligência, quando o profissional não faz o que deveria ser feito; imprudência, quando o profissional faz o que não deveria ser feito; e a imperícia, quando executa de forma incorreta algo que deveria ser feito.

"Para que esse erro fique caracterizado, tem que haver o ato (de negligência, imprudência ou imperícia), tem que haver a consequência e tem que haver nexo causal entre o ato e o dano. Digamos que o paciente fez uma cirurgia e teve uma infecção hospitalar posterior que estava fora do controle médico. A cirurgia foi bem feita, mas o paciente vem a óbito. (...) No ponto de vista subjetivo, não houve relação com o que ele fez e com a causa da morte" esclarece o presidente do Cremec.

A reportagem tentou contato com Danilo Dias na tarde desta sexta-feira, 5, através do número de contato divulgado no site da clínica dele em Fortaleza. O POVO Online aguardava resposta até a publicação desta matéria.

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