Coletivo cearense 'As Travestidas' estreia novo espetáculo em Fortaleza
A nova produção cênico-musical traz no repertório de Caetano Veloso a Nina Simone
10:02 | Abr. 28, 2016
“Três travestis”. Uma inspiração. O espetáculo foi montado e denominado a partir de uma música, de mesmo nome, de Caetano Veloso. Na canção, o cantor faz um jogo de palavras e questiona “Quem é feliz?”.
No palco do Theatro José de Alencar as personagens Gisele Almodóvar (Silvero Pereira), Mulher Barbada (Rodrigo Ferrera) e Betha Houston (George Hudson) interpretam as dores e alegrias de ser quem são por meio de músicas nacionais e internacionais. As apresentações acontecem nos dias 3 e 4 de maio, às 20 horas, e os ingressos custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia). A direção é do ator e dramaturgo Silvero Pereira.
“Com músicas que falam diretamente ou que podem contar sobre o universo trans”, o repertório da apresentação cênico-musical “Três travestis” foi escolhido com cuidado. Tudo para que exista um “caminho de identificação”, como afirma Silvero.
Sobre a adaptação de canções para a apresentação, o diretor cita a música “Ain't Got No” da cantora, compositora e ativista pelos direitos civis norte-americanos Nina Simone. “Mesmo que a música não trate diretamente desse universo a letra traz uma mensagem forte, de resistência”, afirma ele.
O espetáculo percorre a música nacional pela MPB de Gilberto Gil, Ney Matogrosso, Lenine, Luiz Melodia e Maria Bethânia. Além de passear por clássicos de Nina Simone e Anthony Johnson. Serão 17 canções que falam sobre travestis e transexuais.
Ao juntar teatro, literatura e música, “Três travestis” procura trabalhar melhor a dramaturgia. A apresentação será dividida em quatro blocos abordando casos de assassinatos e falando sobre preconceito, igualdade, amor e religião. “Cada bloco foi preparado para despertar emoções variadas no público”, garante Silvero.
Durante os intervalos dos blocos, as três personagens vão inserir citações de autores como Fernando Pessoa, Cecília Meireles e Clarice Lispector, mesclando literatura e fatos reais. Silvero Pereira diz que os “textos são sobre reconhecer a sua identidade” e que “embora a música consiga atingir as pessoas, os textos conseguem ser mais diretos”.
Para além da arte, a apresentação ainda exibirá matérias do noticiário nacional para mostrar crimes dentro do universo transgênero. O dramaturgo aponta dados importantes sobre o cenário das travestis e das transexuais no Brasil e ressalta como é importante levantar essa questão para fazer o público refletir.
De acordo com a pesquisa realizada pela organização não governamental (ONG) Transgender Europe (TGEU), rede europeia de organizações que apoiam os direitos da população transgênero, entre janeiro de 2008 e março de 2014, foram registradas 604 mortes de travestis e transexuais no Brasil.
“Entre janeiro e fevereiro de 2016, foram registrados 60 assassinatos no Brasil. A cada 36 horas uma travesti é assassinada. Essa discussão é urgente. Não podemos falar de travesti apenas na ótica da caricatura, do glitter, da purpurina.”
Edital
“As Travestidas” também enfrentam dificuldades no repasse de verbas. Vencedor do edital nacional Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz 2015 com o espetáculo “Quem tem medo de travesti”, o coletivo aguarda a liberação dos recursos pelo Ministério da Cultura. O recurso disponibilizado pelo edital faria com que o espetáculo percorresse 10 cidades brasileiras, seis na região sul e quatro na região sudeste, mas até o momento o coletivo não tem previsão para realizar as apresentações.
“Quem ganhou o edital em 2014 não recebeu o repasse. E nós que ganhamos no ano passado só receberemos quando os vencedores de 2014 forem pagos”, explica o diretor sobre o atraso do pagamento.
Para 2016
Além do novo espetáculo, o ano de 2016 traz, no mês de junho, o lançamento de um livro produzido pelas “Travestidas” e a estreia, no mês de novembro, de mais uma nova produção, a “Transhono”.
O Coletivo
O coletivo artístico “As Travestidas” atua no teatro cearense desde 2008. Mas se engana quem acredita que os limites geográficos fixaram o grupo na terra natal. Com oito espetáculos, a contar com a nova produção, os 12 artistas cearenses que integram o grupo já se apresentaram em 62 cidades em todo o Brasil, além de uma turnê internacional realizada em Miami em 2015.
O coletivo, assim chamado por reunir músicos, bailarinos, fotógrafos, estilistas, transformistas, cantores, performers, videomakers, DJs, maquiadores e cabeleireiros, possui oito anos de história, lutas e questões levantadas.
Em entrevista ao O POVO Online, Silvero Pereira afirma que o mais importante da trajetória das “Travestidas” é o seu início e a sua repercussão. Eles começaram uma luta onde as pessoas “não entendiam o trabalho artístico”, mas com o passar do tempo ganharam espaço com a repercussão alcançada.
[FOTO2]Conquistas de 2015
O ano que passou trouxe muitas realizações para o coletivo artístico. Silvero considera que a estreia do espetáculo "Quem tem medo de travesti", que nesta quarta-feira, 27, completa um ano, marcou “As Travestidas” por evidenciar uma “nova estética” trabalhada pelo grupo.
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“Entre 2008 e 2013, colocamos muito do nosso desejo em prática, mas a partir de 2013 procuramos investigar mais, estudar mais, levantar mais questionamentos. Tomamos mais consciência do nosso trabalho”, aponta o diretor sobre o diferencial que ficou mais evidente em 2015. Além disso, o ano que passou trouxe uma possibilidade de expansão do grupo em território nacional e internacional, principalmente ocasionado pelos espetáculos “Quem tem medo de travesti” e “BR-Trans”.
Turnê 2016
Após as duas apresentações do novo espetáculo em Fortaleza, o coletivo vai rumo à uma turnê que percorre o Brasil e que também subirá em palcos europeus. No território nacional, o grupo levará o espetáculo "BR-Trans" para o Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília. E durante uma semana vai participar de um festival na cidade de Dresden, na Alemanha.
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Serviço:“Três Travestis”
Quando: 3 e 4 de maio às 20 horas
Onde: Theatro José de Alencar - rua Liberato Barroso, 525 - Centro
Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)
Informações: (85) 9 8767.1578