Educação e empregabilidade no combate à fome

Atualmente, cerca de 26,3% da população do Estado vive com insegurança alimentar grave. Pandemia, guerra, mudanças climáticas e instabilidade econômica são agravantes

06:00 | Jul. 11, 2023

Por: O POVO Lab
A Escola de Gastronomia Social Ivens Dias Branco trabalha a soberania alimentar e a gastronomia social, qualificando grupos vulneráveis socialmente no ramo da cozinha enquanto mostra o alimento como uma ferramenta de transformação social (foto: Lorrine Sampaio/Divulgação)

Apesar do Brasil já ter sido referência internacional no combate à fome, há tempos a população vê o cenário mudar. Hoje, com as consequências da pandemia, a realidade é ainda mais grave. Apesar da relevância da crise, a titular da Coordenadoria de Desenvolvimento Territorial, Cooperativismo, Comercialização e Economia Solidária (Codece) do Estado, Regma Queiroz, acredita que o contexto da fome vai além da pandemia. “Estudos mostram que fatores como a guerra da Ucrânia e as mudanças econômicas e climáticas podem estar levando a humanidade à beira de uma crise alimentar”, alerta.

Assim, políticas de combate a esse quadro se mostram cada vez mais necessárias. Um exemplo local é o programa Ceará Sem Fome, instituído pelo Governo do Estado. Uma das metas do projeto é implantar uma rede de 1.298 Unidades Sociais Produtoras de Refeições (USPRs), entidades e grupos sociais responsáveis por ofertar alimentos prontos para os segmentos populacionais vulneráveis.

Abrangendo os 184 municípios cearenses, cada USPR poderá distribuir até 100 refeições por dia, cinco dias por semana, de acordo com a população de cada cidade. Instituída como política permanente, o objetivo, a longo prazo, é usar as USPRs também para assessorar a população em aspectos como documentação, inclusão em programas sociais e cursos de capacitação profissional.

Além disso, estão sendo distribuídos cerca de 40 mil cartões em todos os municípios cearenses com o valor de R$ 300 para a aquisição de alimentos. A medida prioriza insumos provenientes da agricultura familiar, buscando dinamizar a economia local. Mais de 200 mil pessoas de famílias que recebem renda per capita abaixo de R$ 168 devem ser beneficiadas.

“Queremos que as pessoas tenham um amparo para que elas saiam dessa situação, inclusive as inserindo no mercado de trabalho. Além desse resultado, desejamos geração de renda nos municípios com os produtos da agricultura familiar. É uma maneira de comercializar essa produção direto do produtor para o consumidor”, explica a coordenadora da Codece.

Para a coordenadora do Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador e à Trabalhadora (Cetra) e conselheira do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional Ceará (Consea-ce), Neila Santos, as primeiras oportunidades dadas a esse grupo devem ser as ações de repasse de recursos, como o Bolsa Família ou o Vale Gás. Ela também cita como políticas fundamentais o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e a construção de cisternas comunitárias.

“Essas políticas são responsabilidade do poder público e precisam levar em consideração as demandas de cada contexto. No campo, por exemplo, a principal urgência é o acesso à terra e à água, a fim de permitir a produção de alimentos. Quando as pessoas estão em insegurança alimentar a demanda principal delas é a comida. As pessoas não participam de curso com fome”, aponta Neila.

Em paralelo deve vir a geração de postos de trabalho. Na cidade, um caminho é investir em indústrias, comércio, produção de bens e outras atividades que demandem mão de obra básica. Dessa forma, tanto o Governo como a iniciativa privada podem ofertar oportunidades de capacitação.

De acordo com Neila, o Brasil só saiu do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2014 porque, além do programa Fome Zero, foi investido em várias políticas de geração de emprego e capacitação, mas também políticas específicas para populações específicas.

“Todas as políticas públicas precisam estar dentro de uma lógica de ações que se retroalimentam. Não basta investir numa política isolada. É preciso investir em várias medidas paralelas que se ligam para que realmente as famílias possam sair da condição de insegurança alimentar. Atualmente, isso está sendo reconstruído no País. Nós estamos recompondo e buscando fazer com que as políticas públicas cheguem realmente à população mais vulnerável”, explica.

Alimentar é preciso. Educar, também

O combate à fome por meio da geração de conhecimento e valorização da cultura local é a bandeira levantada pela superintendente da Escola de Gastronomia Social Ivens Dias Branco, Selene Penaforte. A instituição trabalha a soberania alimentar e a gastronomia social, qualificando grupos vulneráveis socialmente no ramo da cozinha enquanto mostra o alimento como uma ferramenta de transformação social.

Além da capacitação técnica, os alunos entram em contato com conceitos como criação de quintais produtivos, aproveitamento total dos alimentos, sustentabilidade, valor da cultura alimentar e da água, nutrição, danos dos alimento ultraprocessados, ecologia, agricultura familiar, jornada do alimento desde a plantação até chegar à mesa, trabalho no campo e valorização dos profissionais que estão na base da produção.

“A gente gera conhecimentos que, de certa forma, dão às pessoas a oportunidade de se envolverem em ações que combatem a fome de forma estrutural. Muito mais do que dar um prato de comida, nas ações você de fato pode ocasionar transformações reais. Não é só consumir, é também conseguir relacionar o alimento como uma coisa fundamental na vida de uma população e entender a lógica do consumo”, destaca Selene.
Na escola, também são desenvolvidas pesquisas dentro da área da gastronomia e cultura alimentar para o desenvolvimento de tecnologias sociais e agroecológicas. Em cinco anos de funcionamento, o equipamento já beneficiou cerca de 27 mil pessoas.

Conheça mais oportunidades de capacitação para populações vulneráveis

Gastromotiva

A Organização não Governamental (ONG) busca formar empreendedores, auxiliares e chefs de cozinha por meio de cursos profissionalizantes remotos e híbridos. A iniciativa também utiliza a gastronomia em projetos como ferramenta de transformação social e combate ao desperdício. O objetivo é despertar nos alunos a vontade de mobilizar comunidades e enfrentar a fome local.
Cursos profissionalizantes: gastromotiva.org/cursos-gratuitos/curso-profissionalizante-em-cozinha/

Alcance

O programa, da Assembleia Legislativa do Ceará (Alece), promove cursos de capacitação profissional online, gratuitos e abertos ao público em geral, com certificação. Nessa primeira edição de 2023 foram ofertados os cursos de Assistente Administrativo, Cidadania e Cuidados com a Saúde, Empreendedorismo – Primeiros Passos, Marketing Digital no Empreendedorismo, Preparação para o Mundo do Trabalho e Orientação Profissional.
Site: alcancevirtual.al.ce.gov.br/
Contato: (85) 3277-2590 / (85) 98125-7919 (WhatsApp)

Curso Técnico em Desenvolvimento de Sistemas no Piauí

O curso de Desenvolvimento de Sistemas, com ênfase em Inteligência Artificial, contempla alunos da rede estadual e têm o objetivo de preparar o grupo para o mercado de trabalho na área de Tecnologia. Uma das cidades beneficiadas é Guaribas, município piloto do programa Fome Zero que segue colhendo os frutos da iniciativa.

Tese de Impacto Social em Alimentação - Artemisia

A Artemisia, organização de disseminação e fomento de negócios de impacto social, com o apoio da Fundação Cargill, elaborou a Tese de Impacto Social em Alimentação. O estudo, além de reunir informações sobre os desafios enfrentados na temática, aponta oportunidades de desenvolvimento de negócios.
Baixe o estudo: artemisia.org.br/alimentacao/