Games: indústria em constante expansão
As possibilidades do mercado de games são infinitas e já extrapolam a bolha do entretenimento, com jogos voltados para educação, treinamento e até saúde
06:30 | Jul. 10, 2024
Apesar de cursar Biologia, área aparentemente distante do ramo da tecnologia, Maria Luiza Severino, 20, enxergou no curso Fábrica de Programadores uma oportunidade de incrementar o currículo e se preparar para o mercado de trabalho.
Maria Luiza planeja utilizar os conhecimentos adquiridos na capacitação de desenvolvimento de games, como linguagem de algoritmos e lógica, tanto para atuar no campo de perícia forense como para ser professora, potencializando o ensino com jogos e outras ferramentas tecnológicas.
A demanda por conhecimentos como programação, desenvolvimento de jogos e possibilidades tecnológicas no geral cresce nas mais variadas áreas profissionais. “Querendo ou não, tudo agora é tecnologia, independentemente da área que você for seguir. Não só a criança e o adolescente, mas todo mundo joga alguma coisa, assiste alguma coisa”, relata.
De fato, a indústria de games vem ganhando destaque globalmente. Segundo estudo da Newzoo, consultoria especializada em dados do setor, a receita do mercado mundial de jogos para consoles e computadores pessoais chegou a 93,5 bilhões de dólares em 2023, mais de 500 bilhões de reais. O valor representa um aumento de 2,6% em relação a 2022.
A Newzoo também apontou o Brasil como o quinto país em população online, com uma estimativa de 103 milhões de jogadores, sendo o maior mercado latino-americano. Na edição de 2024 da Pesquisa Game Brasil, que entrevistou 13.360 brasileiros, 73,9% afirmaram jogar jogos digitais.
Assim, a indústria brasileira de desenvolvimento de jogos continua em crescimento e resiliente aos momentos de crise, enquanto os gamers brasileiros continuam ávidos por novos conteúdos e produtos. É o que conclui a Pesquisa da Indústria Brasileira de Games 2023, promovida pela Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Games (Abragames).
A análise, que mapeou 1.042 desenvolvedoras de games em todo o País, mostra que mais de 2.600 jogos próprios foram lançados entre 2020 e 2022, sendo 1.009 apenas nesse último ano. O crescimento no número de desenvolvedoras entre 2018 e 2023 chegou a 177%, enquanto o faturamento estimado da indústria nacional em 2022 foi de 251,6 milhões de dólares (aproximadamente R$ 1,3 bilhão). Em 2021, o apurado totalizou 143,3 milhões de dólares (cerca de R$ 759 milhões), o que representa um crescimento de 75,57% no faturamento do setor de um ano para outro.
O estudo aponta, ainda, que o Nordeste e o Ceará têm papel relevante no cenário nacional. Apesar dos estúdios de jogos mapeados em 2023 se concentrarem nas regiões Sudeste (56%) e Sul (20%), a porcentagem de desenvolvedoras localizadas no Nordeste (16%) cresceu 2% em relação a 2022.
Além disso, o Ceará aparece como o estado com o maior número de estúdios de jogos na região (32), enquanto Fortaleza ocupa o 8o lugar na lista das 10 cidades com mais desenvolvedoras de jogos digitais, reunindo 21 empresas. O primeiro lugar do ranking é ocupado por São Paulo, com 167 estúdios. Os estados que possuem a maior concentração de desenvolvedoras são: São Paulo (302 empresas); Rio de Janeiro (107); Rio Grande do Sul (69); Santa Catarina (52); Minas Gerais (59); e Paraná (49).
Os caminhos no mercado
Segundo a Pesquisa da Indústria Brasileira de Games 2023, a indústria brasileira de jogos é formada, principalmente, por micro e pequenas empresas. O mapeamento também ressaltou o papel do País no mercado global, já que uma empresa brasileira pode atuar com parceiros internacionais para o desenvolvimento de um jogo e distribuí-lo diretamente em um serviço de distribuição digital de jogos eletrônicos, sem ter uma atuação no ecossistema local. De acordo com o estudo, metade das desenvolvedoras nacionais que atuam no mercado internacional obtiveram mais de 70% do seu faturamento internacionalmente.
Outro ponto interessante na expansão do setor é que, apesar do estudo apontar que a área ocupa o segundo lugar entre os negócios de entretenimento no mundo, atrás somente da TV, há tempos o mercado deixou de investir apenas no lazer. É o que explica a professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) de Quixadá, Paulyne Matthews Jucá. Para a também coordenadora do grupo de pesquisa em jogos Marmota Factory, que desenvolve jogos para apoiar o ensino de física nos colégios, os games podem conversar com todas as áreas.
“Os games podem ser usados para apoiar o ensino, auxiliar práticas através de simulação, apoiar a fisioterapia, incentivar a prática de esportes, conscientizar sobre a coleta seletiva de lixo, sobre a prevenção da dengue, sobre riscos de acidentes, sobre pessoas neurodivergentes ou promover cultura, ajudam a tornar a visita em museus mais interessante e imersiva, por exemplo. As possibilidades são infinitas”, garante.
De acordo com a professora, o desenvolvimento de jogos é uma área multidisciplinar e representa um setor produtivo que está se desenvolvendo no Ceará, com uma cadeia cheia de oportunidades e de grande valor para o Estado. Entre as diferentes maneiras de atuar no desenvolvimento de jogos, ela destaca posições como game designer, programa dor, artista, animador, design de som e efeitos sonoros e produtor. Além disso, é possível com por empresas já estabelecidas ou empreender, capacitar pessoas nessas habilidades ou fornecer materiais e ferramentas de apoio ao desenvolvimento, entre outros ofícios no mercado.
A experiência do Fábrica de Programadores
Nesse sentido, a Fábrica de Programadores tem o objetivo de ensinar noções de programação para crianças e adolescentes através da criação de jogos. Uma das conteudistas do curso, Paulyne acredita que a capacitação mostra diferentes possibilidades de crescimento na área, desmistificando a ideia de que programação é algo excessivamente difícil e monótono.
“A programação é uma habilidade que precisa ser aprendida por todos nós, mesmo que de maneira básica. As habilidades exercidas na oficina podem ser usadas para qualquer área de programação, pois iniciam o caminho de formação de pessoas da área de computação, que depois podem trabalhar em diversos setores de desenvolvimento de software”, aponta.
Foi seguindo essa lógica de incrementar o currículo que Maria Luiza Severino, estudante de Biologia, decidiu participar da oficina. Mesmo antes de entrar no mercado de trabalho, a jovem já aplica na faculdade o conhecimento adquirido, seja na produção de gráficos e estatísticas nas disciplinas ou até desenvolvendo um quiz para uma cadeira da qual Maria foi monitora.
“Você aprende várias coisas, desde edição de vídeo até manipulação de eventos, cálculo de variáveis, linguagem de programação. O curso trouxe muita motivação e engajamento, porque os jogos são muito interativos, divertidos e didáticos. É muito importante trazer isso para o aprendizado, principalmente para crianças e adolescentes”, aponta.
Apaixonada por design, para Antônia Yorrana Pedrosa, 17, o Fábrica foi uma chance de utilizar a criatividade e viver uma nova experiência, agregando cada vez mais conhecimento. Atualmente no terceiro ano do ensino médio, a jovem acredita estar bem fundamentada para se destacar no mercado de trabalho na área de design e inovação.
“O curso foi ótimo e fácil de fazer. Eu me senti muito acolhida. Gostei e aprendi bastante sobre protótipos, como criar o jogo desde de início. No começo eu estava com medo de não conseguir entender, mas as videoaulas foram muito práticas”, descreve.
Além disso, Yorrana defende que trabalhar a criatividade e colocar em prática novas ideias traz benefícios para qualquer profissão. “Toda empresa tem que ter inovação”, ressalta.