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Esporte: inclusão é desafio, mas também realidade

A prática de esporte é caminho para diminuir exclusões históricas. Paratletas que demandam incentivo e contextos sociais que revelam desafios

Incluir por meio do esporte, diminuindo diferenças, mostrando perspectivas, garantindo espaços e qualidade de vida. Do Direito Constitucional ao desporto a projetos, professores e oportunidades. O Ceará avança no seu processo de inclusão de crianças e jovens com alguma deficiência ou por alguma vulnerabilidade. Mas ainda há desafios e eles perpassam toda a sociedade e, principalmente, o poder público.

De acordo com o presidente da Comissão Nacional da Pessoa Autista do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Emerson Damasceno, a oferta da prática de esportes, a inclusão e a acessibilidade são obrigações do estado brasileiro - o Brasil é inclusive signatário de resoluções mundiais que garantem esses direitos. Emerson é também coordenador Especial da Pessoa com Deficiência da Prefeitura de Fortaleza (Copedef).

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“Até os meus 42 anos eu fui uma pessoa sem deficiência e tinha um pouco da visão capacitista de achar que desporto para pessoas com deficiência, o paradesporto, era algo de super-heroi, ou então de quem precisava de ajuda. E não é nem uma coisa, nem outra”, afirmou Emerson, que ficou paraplégico há 10 anos ao ser atropelado enquanto treinava para o IronMan Fortaleza. “Não é favor que estados, municípios e o Governo Federal cumpram com a obrigação constitucional de incluir pessoas com deficiência também no desporto”, frisa.

É preciso promover uma adaptação dos locais que comumente são utilizados para as mais diversas práticas de modalidades esportivas: areninhas, ginásios, campos, quadras, piscinas. Para Emerson, esses espaços precisam ter acessibilidade para pessoas com deficiência. “E é fundamental falar sobre as pessoas neurodivergentes, com deficiência intelectual. O desporto, desde a escola, ajuda muito a incluir e desenvolver jovens e crianças com deficiência”, reforça o advogado, destacando as políticas de paradesporto desenvolvidas no Centro de Formação Olímpica (CFO), em Fortaleza.

É sobre educação, acolhimento e inclusão que fala o educador físico Abdiel Ribeiro. Ele é monitor do projeto Esporte em 3 Tempos, do Governo do Ceará, professor municipal de São Gonçalo do Amarante, e conhece bem a realidade de crianças e jovens socialmente mais vulnerabilizados. “Muitas crianças nunca foram a um estádio, não têm acesso à cultura, não têm um tênis esportivo para a prática esportiva. Olha a vulnerabilidade: um menino que o pai foi assassinado, que a mãe precisa trabalhar, e ele não vai para a escola porque precisa cuidar dos irmãos”, resume a realidade de muitos pequenos e pequenas cearenses.

Questões sociais, de cidadania e reconhecimento, que fazem muita diferença no destino de meninas e meninas, também precisam estar atreladas ao esporte e às condições para seus praticantes. “Educação, moradia, segurança… o esporte trabalha todas essas esferas. Uma criança buscando um sonho é disciplina, é segurança, é educação, lazer, saúde…”, frisa.


Prevenção para mudar o futuro

As políticas públicas de inclusão são o caminho de mudança para o futuro. É a ação preventiva, que vai além das modalidades esportivas, consegue aplacar ausências, dores e desigualdades, com enfoque na transformação. É a luta para eliminar a invisibilidade da deficiência e da falta de acesso dentro de contextos ainda mais vulneráveis, de desigualdade socioeconômica aguda.

“Muitas vezes as pessoas acham que o jogo, o esporte, é o fim, quando na verdade é o meio. O campinho, a quadra, se transformados em um ambiente saudável de aula, ensina valores morais, faz entender que a vida tem regras, que existe respeito entre eles e que podem alcançar sonhos”, afirma Abdiel Ribeiro, educador físico e monitor do projeto Esporte em 3 Tempos.

O professor, que descobriu há 10 anos o valor do esporte na educação - tirando o foco tradicional da prática de alto rendimento - destaca a importância de diminuir a invisibilidade sentida por muitos jovens. “Infelizmente preciso citar isso, que é na aula de educação física, quando alguns professores fechavam os olhos, diziam para o aluno que ‘não precisava fazer’. Hoje a gente vê mais aulas inclusivas, mais consciência”.

Entender especificidades, adaptar, fazer uso do lúdico… é na aula de educação física que as diferenças podem ser amenizadas. O professor destaca outro programa governamental, o Bolsa Atleta, que confere apoio financeiro para a prática de esportes. “É um incentivo, sem dúvidas. E um ponto importante mencionar é que deveria incluir paraesportistas, mas é uma ideia que pode e deve ser implantada e começar. E o começo é justamente lá na educação física!”.


Inclusão em contextos invisíveis e a questão do gênero

A perspectiva de gênero, infelizmente, ainda é um fator limitante quando o assunto é oportunidade e acessibilidade para todos. Se nas escolinhas de futebol do projeto Esporte em 3 Tempos a pouca presença de mulheres jogando futebol é uma barreira comportamental, na perspectiva do paradesporto se destaca ainda o desafio da interseccionalidade das pessoas LGBTQIA+, das populações indígenas, quilombolas…

Na atuação do projeto em São Gonçalo do Amarante, de acordo com o educador físico Abdiel Ribeiro, enquanto são 150 meninos jogando futebol, são apenas 40 meninas, no máximo. “A dificuldade vem do preconceito, existe essa questão, sobre a escolha da modalidade. Têm pais que não aceitam a menina no futebol. É um paradigma a se quebrar, que a mulher pode escolher o que quiser”, conta. O jeito é conversar, mostrar outras modalidades, fazer com que elas tenham acesso. “Porque é uma descoberta, a criança precisa vivenciar para saber se tem aptidão. O esporte propicia exatamente isso, o autoconhecimento”.

“Quando estive na ONU (Organização das Nações Unidas) em 2023, para a Conferência Nacional sobre a nossa convenção, um dos temas mais debatidos foi exatamente os grupos excluídos dentro de cenários de exclusão ainda maiores”, ressaltou Emerson Damasceno, presidente da Comissão Nacional da Pessoa Autista do Conselho Federal da OAB.

Ele cita ainda o cenário da violência, que acomete muitas mulheres e as mulheres com alguma deficiência. “São muitas barreiras. Se você não tiver uma cadeira de rodas, por exemplo, para o deficiente físico, você nem sai de casa. Se a calçada não é adaptada, se o transporte público não é adaptado, existem as barreiras atitudinais, as barreiras tecnológicas… é muita coisa a enfrentar”.

 

Saiba mais sobre o assunto

Confira a íntegra da live "O esporte como fator de inclusão social", que recebeu Emerson Damasceno, coordenador especial da pessoa com deficiência da Prefeitura de Fortaleza, e Abdiel de Castro, professor do Projeto Esporte em 3 Tempos, do Governo do Ceará.

Acompanhe a próxima live do projeto Esporte é Vida

Tema: A importância dos espaços físicos para prática esportiva nas comunidades

Onde: Canal do O POVO no YouTube

Quando: Quando: terça-feira, 14 de maio, às 11h

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