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Empreendedorismo sem tabu: apostando no prazer feminino

Um jeito de fazer negócio empoderando outras mulheres

“Mas você não tem vergonha de vender isso?”. “O que vai dizer para os seus filhos quando eles perguntarem sua profissão?”. Perguntas como estas fizeram parte da trajetória da empreendedora Vanessa Pessôa, 43, desde que decidiu apostar na venda de produtos eróticos como negócio. Mas ela não se intimidou. A partir de sua própria pesquisa viu que teria um mercado a explorar, um segmento escondido, mas que lhe parecia estar em ascensão: o prazer, principalmente o feminino. O tema empreendedorismo e prazer feminino foi amplamente discutido na live Empreendedorismo sem tabu, o doce prazer feminino.

O prazer feminino por séculos esteve sob obscuridade do tabu. Não à toa, falar sobre o assunto sempre foi difícil para as mulheres. A sexualidade feminina sempre foi tão inexplorada que, até bem pouco tempo atrás, o orgasmo feminino ainda era desconhecido. Apesar do aprofundamento do tema por parte da medicina e da psicologia por volta do século XX, as mulheres continuaram a ser ensinadas a não discutir tais assuntos em espaços públicos, deixando para expôr o “incômodo” dentro dos consultórios ginecológicos, sempre a base de muita vergonha – e desconhecimento, principalmente de seu próprio corpo.

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Para a psicóloga, especialista em educação sexual, Zenilce Bruno, é muito mais difícil para as mulheres falar sobre sua sexualidade, principalmente num contexto social machista onde quem predomina é o prazer masculino: “Desde crianças, ainda meninas, nós somos educadas a não nos tocarmos, a não ficarmos nuas, a nos defendermos dos homens. Então, isso vai fazendo com que a gente cresça achando que o nosso corpo é algo pecaminoso, é algo feio, algo que não deve ser curtido, não deve ser explorado, não deve ser sentido. E muitas vezes essas mulheres crescem achando que o corpo nem seu é, ela é do outro”.

Não à toa também, durante muito tempo lojas voltadas para este segmento estiveram à margem do mercado. Escondidas, adentrar estes espaços era como se estivesse fazendo algo errado. Mas como o mundo não gira, ele capota, as mulheres foram conquistando seu espaço também nesta área e, apesar de ainda ser um tabu, abrindo caminho para sentirem o que quiserem quando o assunto é sua sexualidade.

Vanessa era mais uma empreendedora na terra do sol. Na época, tinha uma locadora de DVD. Até que um dia chegou ao seu conhecimento uma tal de “bolinha explosiva”, na época uma grande novidade, que despertou sua curiosidade. Tanto que logo foi atrás de fornecedores para comprar a tal produto.

Começou oferecendo a novidade para as clientes de sua locadora. Quando percebeu a boa receptividade, colocou os produtos numa bolsinha e saiu pelas casas das amigas, lojas de shopping e de rua oferecendo sua mercadoria. “Eu rodava o dia todo com a minha maletinha, foi quando eu fui vendo que o negócio estava dando certo e montei uma loja virtual”.

Vanessa, porém, não queria só vender, ela queria distribuir. Mas em Fortaleza, esta demanda por distribuidoras já vinha sendo suprida por uma colega. Ela não se deu por vencida e em suas pesquisas descobriu que existia essa lacuna na cidade do Recife, e decidiu apostar no segmento por lá. Foi o suficiente para abrir a temporada de opiniões adversas: “Todo mundo foi logo dizendo: você é louca, se lá não tem é porque não vai dar certo. É porque já devem ter colocado e fechou…”, conta Vanessa lembrado a negatividade geral em torno da sua ideia de negócio.

Mas o pensamento que circulava em sua cabeça era um só: “Existem duas possibilidades – a de realmente lá não dar certo, de não ter mercado pra isso, ou de não ter tido ninguém que até então tenha tido coragem de empreender para montar uma distribuidora lá. Se for o primeiro caso, sou nova, volto pra Fortaleza, arregaço as mangas, simbora trabalhar, começar tudo de novo e acabou-se. E se for a segunda opção, que é o que eu acho que seja, eu vou me dar muito bem porque na verdade eu vou começar algo que ninguém fez ainda”.

Muitas discussões em família depois, todos com medo da ideia de fechar um negócio já estabelecido aqui para investir em outro totalmente diferente lá, Vanessa resolveu fazer uma nova pesquisa. “O meu estudo de mercado foi o seguinte: eu comprei uma grande quantidade de mercadoria, botei na mala do carro e vim embora pra Recife. Chegando em Recife, eu comecei a rodar nas lojas, tanto nas lojas se sex shop como nas de lingeries, oferecendo os produtos para que as lojas de lingeries começassem a vender também”.

Em 3 dias no Recife, ela vendeu toda a mercadoria que tinha no carro. “Aí eu voltei e disse: o meu estudo de mercado deu certo, vou pra Recife abrir a distribuidora”. Em dois meses, Vanessa vendeu a locadora e se mudou. Ao chegar na capital pernambucana, ela ainda precisaria encontrar um ponto para abrir seu negócio. Enquanto esta etapa ainda não se concretizava, ela comprou mais produtos e estocou em casa.

Para vender a mercadoria, pensou numa nova saída: “Eu comecei a anunciar no jornal impresso para revendedores e para lojistas. E deu super certo”. Vanessa chegou em Recife em janeiro de 2011, em junho ela dava início oficialmente à Doce Pimenta, com uma clientela já estabelecida graças à estratégia de anúncio no jornal e suas andanças com a maletinha.

Trabalhou alguns anos o atacado até que decidiu investir no varejo. Em 2015 abriu uma nova loja, desta vez apostando no segmento em Fortaleza. E no ano passado, o Recife ganhou mais uma filial, pegando carona no forte crescimento do mercado de sexual wellness – ou bem-estar sexual, um mercado extremamente novo que vem em ascensão.

De acordo com a Associação Brasileira de Empresas do Mercado Erótico (Abeme), 2020 foi o grande ano do setor, que apresentou uma alta de 12% nas vendas, faturando R$2 bilhões no Brasil. Em meio à pandemia, a procura por produtos de sexualidade feminina aumentou expressivamente por aqui, de acordo com um levantamento feito pelo portal Mercado Erótico, entre março e agosto de 2020, foram vendidos mais de um milhão de vibradores, um volume 50% maior se comparado ao mesmo período do ano anterior. E a estimativa é crescer ainda mais, não só no Brasil. Até 2027, o mercado de sex toys deve faturar R$108 bilhões no mundo.

Assim como muita gente que passou a enxergar o setor com outros olhos, Vanessa vem apostando num diferencial para desmistificar seu negócio: “Existiam lojas onde as pessoas entravam mascaradas ou ainda que expunham os produtos no fundo de outras lojas para que as pessoas não fossem reconhecidas entrando em um sex shop. Mas sempre trabalhamos procurando um movimento exatamente contrário a tudo isso, nada escondido, nada proibido. Nossas lojas não são escondidas, são todas em avenidas. Não são escuras ou em primeiro andar. As lojas são lindas, bem iluminadas e sofisticadas. As pessoas precisam entender que ir ao sex shop não significa ir a um lugar vulgar ou proibido”, enfatiza.

“Quando tomei a decisão de vender a locadora de DVD e me dedicar exclusivamente à Doce Pimenta, fui chamada de maluca, e até de irresponsável! Que bom que segui minha intuição, que dizia que era algo novo, algo que não seria fácil. Mas que isso poderia, inclusive, estar 100% a meu favor uma vez que eu teria um mercado “ cru” para trabalhar e fazer crescer”, conta a empreendedora como quem olha para trás e vê que todo o esforço está dando certo, tanto como negócio como para empoderar outras mulheres quanto às suas sexualidades.

Zenilce lembra ainda da importância do auto admirar-se, porque gostar de si é um passo importante para se conhecer: “Eu sempre digo que você só pode sentir tesão ou proporcionar tesão a sua parceria, se você tiver tesão por você mesmo, se você se gostar, se você se amar, se você se sentir bela, interessante. Então a partir do momento que eu gosto de mim, eu começo a me tocar, começo a me acariciar, a me conhecer, e isso é imprescindível para o amadurecimento de uma mulher”, finaliza.

 

 

 

 

 

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