Desce, vai ter serenata
A reinvenção dos pequenos negócios na pandemiaIsabela Sobreira de Lavor, 45, acordou cedinho como de costume. Mas como era dia das mães, logo foi surpreendida. Neste ano, porém, os três filhos e o marido, resolveram que o presente precisava de uma pitada a mais de carinho, emoção e nostalgia. Foi quando Isabela ouviu as primeiras notas de uma flautinha, que adentrava sua residência a tocar Rosa, canção de Pixinguinha. Foi conduzida para a área externa do condomínio pela melodia, lá foi recebida por um grupo de pessoas que estavam ali para lhe fazer uma serenata: “foi realmente uma surpresa, estava achando que fariam algo, mas não esperava nada parecido. No início chorei um bocado, depois muitos sorrisos”, relembra a advogada.
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De pé diante da homenageada, guardando o devido distanciamento, a jornalista Sarah Coelho, 31, lê seu texto. As lágrimas que rolam pelo rosto da Isabela são de pura emoção, também não é pra menos: cada detalhe da personagem daquela história, Sarah extraiu de pessoas próximas a Isabela, para ter a certeza de que cada frase pudesse tocar sua alma. E tocou, tocou a todos que celebraram a data: mãe, marido, filhos e, provavelmente, os vizinhos. A alegria do momento foram captadas pelas lentes de uma fotógrafa profissional, a flauta que embalou as canções foi do músico Mateus Farias e o texto, magistralmente escrito e recitado pela Sarah, que também idealizou a serenata moderna, que hoje faz parte das opções de serviços da Tanto Celebrações, empresa fundada há cerca de 2 anos e meio pela jornalista, que hoje se dedica a dar mais intimidade e emoção a celebrações.
Cerimônias de casamento são um ritual. Para a Sarah, também. Mas há cerca de 2 anos, ela descobriu que poderia ser mais e transformou sua habilidade com as palavras em um negócio, nascia a celebrante Sarah. Os celebrantes sociais celebram casamentos sem efeito civil ou cunho religioso, conduzindo cerimônias simbólicas, que podem ser extremamente poéticas e personalizadas. "A validade quem dá é o próprio casal, relembrando os passos que eles deram até chegar ao altar", explica.
No dia do casamento, Sarah compõe um texto que conta a história do casal, no qual ela compartilha com os que ali estão o que é que está sendo celebrado, quais os caminhos que aquele casal passou, quais valores comungam, para o que eles estão dizendo sim. Para chegar a esse resultado, Sarah se arma de sua habilidade jornalística para captar, através de entrevistas, todo o esboço que dará corpo ao texto da cerimônia. “O valor delas é o valor do afeto, como eu sempre brinco, e é o valor de dar aquelas duas pessoas o poder de dizer que aquela relação está oficializada. Eles se colocam de pé na frente dos seus familiares e amigos para dizer que querem viver a vida juntos e eu acho que não tem nada que tenha mais força do que isso”.
“O amor não tem pressa, ele pode esperar", escreveu Chico Buarque, em 1993. Desde o início da pandemia do novo coronavirus, milhares de casais, com data marcada para oficializar a união, têm se dividido entre os que concordam com o poeta e os que discordam veementemente, pondera a empreendedora, que correu atrás de novas possibilidades para continuar viabilizando seu negócio. E foi isso o que ela fez, além das celebrações em formato virtual, incluiu as serenatas, elaboradas junto com outras duas amigas celebrantes, Lara Rovere e Juliana Julião. De início seria uma ideia só para o dia das mães, mas deu tão certo que elas precisaram incluir no pacote de serviços oferecidos. Para viabilizar e dar corpo a ideia, elas contam com parcerias importantes de músicos e da Xodó Foto e Filme que, além de registrar o momento de afeto, também inclui no pacote do homenageado os retratos.
De acordo com a jornalista celebrante, a pandemia deu um novo fôlego as celebrações, que encontraram novas formas de acontecer e ressignificar o momento. "As pessoas têm olhado para o momento da cerimônia com muito mais protagonismo, uma vez que as festas, pelo menos no formato usual, não estão podendo acontecer. Mas é a cerimônia o que faz um casamento ser um casamento. Por isso, acredito que há aí um resgate. Olhar para a cerimônia com novos olhos ajuda os noivos a resgatarem o real sentido do casamento, que é a força do vínculo entre aquelas duas pessoas", defende. Sarah conta ainda que as celebrações dos casamentos abriram espaço para que ela fosse procurada para atender a outros momentos, assim já fez cerimônias de boas-vindas pra bebês a despedida de um ente querido.
Foi assim também que surgiu a ideia das serenatas, uma releitura personalizada e cheia de afeto das loucuras de amor. Provocada por outras duas amigas celebrantes, ela resolveu que poderia incorporar o serviço, já que incluía no pacote coisas que ela já dominava de olhos fechados : “juntamos uma equipe que é composta por celebrantes, músicos e fotógrafos e a gente faz esse trabalho, que demos o nome de Desce vai ter serenata, onde a gente chega na casa das pessoas, quando tem sacada fica bem com cara de serenata mesmo, mas pode ser no quintal, no terraço... A gente chega com música, poesia, e costura, entre música e texto, uma homenagem bem personalizada, que consiga transmitir os sentimentos das pessoas que estão enviando esse presente e que, de quebra, preserva ainda o isolamento, o distanciamento”, completa.
Quanto as cerimônias, Sarah alerta que não dá conselhos, tudo o que diz no dia vem do que os noivos contam e de como eles pretendem viver a vida. Para ela, são muitas idealizações em torno do que é a vida a dois e com o seu serviço pretende resgatar ainda as histórias de amor, sem romantismos fakes, mas com verdade e paixão: “Eu acho muito bonito quando conseguimos ouvir o que casais de verdade, de carne e osso, já viveram. É impossível não se identificar um pouco, pensar “nossa, poderia ser eu!”. Acho que todo mundo sai das cerimônias acreditando um pouquinho mais no amor” <3.