educacaoempauta

Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista

Ceará tem destaque nacional no combate ao racismo. Educação antirracista nas escolas cresce e Selo Escola Antirracista pode se tornar política pública

O combate ao racismo, no Brasil, é uma luta antiga, e está longe de ter fim. A construção histórica baseada na opressão de qualquer expressão sociocultural não branca resultou em uma sociedade tão intrinsecamente estruturada em preconceitos que se torna até difícil detectá-los. A solução para o problema não é simples, mas pode ter um primeiro passo: utilizar o poder transformador das escolas na promoção de uma educação antirracista.

De mandeira resumida, a doutora em educação e docente da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), Carol Costa Bernardo, define a educação antirracista como um método que visa orientar o comportamento humano e social de toda a comunidade escolar sobre o entendimento do que é o racismo, o que é um comportamento racista e como agir de forma eficaz para não só não ser racista, mas denunciar o racismo e garantir que a prática não passe despercebida.

É + que streaming. É arte, cultura e história.

+ filmes, séries e documentários

+ reportagens interativas

+ colunistas exclusivos

O conceito envolve práticas como discussões pedagógicas e políticas, reformulação do Projeto Político Pedagógico (PPP) da instituição para um curriculo menos eurocentrado, trabalho especializado de acolhimento para às vítimas de racismo, incentivo a expressões culturais diversas e formação técnica para que cada agente profissional dentro da escola assuma um trabalho antirracista.

Para Carol, a leitura técnica de obras sobre o tema pode ser o começo para uma educação antirracista, mas é necessário que a sociedade saia da zona de conforto. “As pessoas precisam se entender dentro do problema para poder agir de forma eficaz, e a educação antirracista chama as pessoas para se responsabilizarem. É necessário vivenciar a cultura, a ciência, a religiosidade e a culinária não hegemônicas, não brancas, e ampliar as experiências para compreender essa existência”, destaca.

A educação antirracista no Ceará

O Ministério da Educação (MEC) divulgou, no último dia 18, que o Ceará ocupa a terceira colocação no Brasil em promoção da equidade racial na educação, com 66,1 pontos percentuais no Índice Geral de Educação para as Relações Étnico-Raciais. O Estado ficou atrás apenas de Rondônia (68,5%) e Distrito Federal (66,9%).

O resultado espelha os avanços do Governo na promoção de uma educação antirracista. Um exemplo dessas iniciativas é o Selo Escola Antirracista, lançado pela Secretaria da Educação (Seduc), em agosto 2023, e realizado pela Secretaria Executiva de Equidade, Direitos Humanos, Educação Complementar e Protagonismo Estudantil.

Com validade de dois anos, a proposta certifica as unidades de ensino estaduais que apresentam ações pedagógicas e projetos de gestão para equidade racial, pautados em práticas e experiências antirracistas significativas e inovadoras. Este ano, foram certificadas 63 escolas.

Além disso, no último Dia Nacional da Consciência Negra (20), foi encaminhado à Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) um Projeto de Lei que institui como política pública o Selo e o Prêmio Escola Antirracista na rede estadual de ensino. A Mensagem aguarda aprovação na Casa Legislativa.

A medida reforça a política de Educação para as Relações Étnico-Raciais desenvolvida pela Seduc na rede estadual há mais de 20 anos, com base nas Leis Federais nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008, que estipulam a obrigatoriedade do estudo da história e da cultura afro-brasileira e indígena.

Na visão de Carol, apesar de não ser perfeito, o Selo é a efetivação institucional da Lei nº 10.639/2003. “Essa ação movimentou as escolas. Ainda há ações racistas, mas é um passo de cada vez. Muitas pessoas estão realmente preocupadas em fazer mudanças, e as escolas comprometidas estão fazendo mais do que o Selo pede. Tenho esperança de que esse Selo demarca um momento na história da educação cearense”, declara.

A luta na prática

Em 2024, a Escola Estadual de Educação Profissional (EEEP) Pedro de Queiroz Lima, de Beberibe, foi destaque no Selo Escola Antirracista, atingindo mil pontos.

Segundo o diretor da instituição, Arthur Monteiro da Silva, a escola já desenvolvia algumas práticas antirracistas, como formação de professores, ações de protagonismo estudantil, palestras, rodas de conversa e convite de diferentes personalidades. No entanto, as iniciativas eram, comumente, restritas a datas comemorativas.

“Com o fortalecimento dessa temática via Seduc, percebemos que construir uma educação antirracista vai muito além de somente cumprir uma data específica. O Selo fez com que essas práticas fossem mais organizadas para construir uma escola com ações que tenham sentido para uma sociedade justa, igualitária e equitativa", destaca.

Apesar da certificação não ser sinônimo de um ambiente escolar perfeito, os esforços, certamente, demonstram avanços. De acordo com Arthur, hoje, mais alunos usam a própria voz para denunciar injustiças, enquanto professores se mostram mais abertos ao diálogo. Para o diretor, independentemente da existência do Selo, as práticas de educação antirracista representam uma necessidade real e constante de reparação hsitórica.

“A escola deve ser um espaço de libertação. Quando o aluno consegue ser quem ele é, ele aprende, se relaciona e desenvolve as habilidades melhor. A escola tem um papel social, ela não está ali apenas para produzir conhecimento. Tornar essas ações uma política pública é ver que, de fato, precisamos desenvolver uma educação acolhedora. Fazer uma escola antirracista é fazer uma escola preocupada com o ser humano”, indica.

Autodeclaração étnico-racial estudantil

Em busca de dados mais precisos sobre a composição étnico-racial das escolas e da implementação de políticas e práticas mais eficazes de combate ao racismo, o Governo do Ceará implementou a autodeclaração étnico-racial estudantil nas escolas da rede estadual.

O processo voluntário permite que os estudantes informem como se identificam em termos de raça e etnia. A partir de 2024, os maiores de 16 anos puderam indicar sua autodeclaração no ato de matrícula. Os menores de 16 anos foram representados pelos pais ou responsáveis.

“Esse treinamento da autodeclaração racial é fundamental para entender o percentual das identidades raciais do lugar, onde você está nessas identidades e como está organizado no lugar em que você está. As pessoas não sabem que são negras, não sabem que são brancas. É preciso letrar as pessoas sobre as problemáticas raciais para armar com estudo um grupo que vem sofrendo opressão historicamente em uma guerra que ele já vem perdendo”, aponta Carol Costa.

Conteúdo de responsabilidade do anunciante
educacaoempauta
Dúvidas, Críticas e Sugestões? Fale com a gente

Tags

educação atirracista ceará

Os cookies nos ajudam a administrar este site. Ao usar nosso site, você concorda com nosso uso de cookies. Política de privacidade

Aceitar