Privatização: o que é e como funciona?
A privatização no Brasil marcou a transição do país em uma nação democrática. Saiba mais sobre como funciona e veja exemplos.A história brasileira é marcada por diversas mudanças no papel do Estado na economia, e as privatizações de empresas estatais estão frequentemente no centro das discussões. Em determinados momentos, a intervenção institucional no mercado financeiro pode causar mais ou menos polêmica, dependendo do desempenho da economia para os brasileiros.
Quer entender mais sobre o que é privatização estatal, como funciona a privatização no Brasil, os impactos que a desnacionalização pode causar na economia brasileira e se, afinal, as privatizações são boas ou ruins? Veja no texto abaixo mais detalhes sobre o processo de inserção da gestão privada nas empresas no Brasil.
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AssineO que é privatização?
O primeiro ponto a entender é que as privatizações estatais não são exclusivas do Brasil, mas mais comuns em todo o mundo, especialmente em países com mercados financeiros com tendências ao liberalismo.
A privatização de empresas no Brasil ocorre quando um Estado é vendido pelo governo na iniciativa privada, por meio de leilão público, transferindo aos novos gestores também a responsabilidade de oferecer seus serviços à população. O governo transfere um de seus ativos para outras pessoas, e o processo de privatização está estruturado no Programa Nacional de Desestatização (PND).
É importante destacar as responsabilidades de tornar privada uma empresa que antes pertencia ao Estado e, portanto, aos brasileiros. A maioria das empresas privatizadas ou consideradas para o processo oferece serviços essenciais à população, como serviços de abastecimento de água, energia elétrica e correspondência postal.
Os acionistas que se tornarem os novos administradores privados do antigo Estado, após um processo de privatização, serão responsáveis por oferecer esses serviços aos brasileiros. A gestão de uma empresa que presta serviços de encanamento e drenagem à população pode não resultar no mesmo nível de comprometimento que a qualidade de serviço exigida em uma empresa comercial, por exemplo.
Principais privatizações no Brasil
Desde o final da década de 1980, com o período de redemocratização pós-ditadura, as privatizações no Brasil vêm avançando no cenário político-econômico. Na década de 1990, foi criado o Programa Nacional de Desnacionalização (PND) e, em seguida, o processo de venda de empresas estatais, inicialmente empresas que foram posteriormente integradas ao Estado, intensificou-se devido a problemas de gestão.
É a partir do governo de Fernando Collor de Mello que a privatização de empresas estatais é utilizada não apenas como ferramenta de aumento de receita, mas também como aparato político. As desestabilizações foram integradas às políticas econômicas dos governos que se seguiram, como nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, que governou até 2002.
Um dos processos de privatização que gerou sustentação para o próximo foi a venda da Usiminas, em 1991, que, após ser privatizada, teve um crescimento de mais de 100% em sua arrecadação, quando comparado à década de 80, segundo dados do Instituto Nacional de Instituto do Instituto do Banco de Desenvolvimento Instituto.
A Vale do Rio Doce, hoje conhecida como Vale, foi desestabilizada durante os mandatos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, entre 1995 e 2002. Também em seu governo iniciou-se outra fase na história das privatizações no Brasil: a venda de empresas de telecomunicações, como como Telesp (Telecomunicações de São Paulo)
A Telesp era a operadora no estado de São Paulo da Telebrás (Telecomunicações Brasileiras), empresa estatal brasileira de telecomunicações que foi privatizada em 1998 e desmembrada em 12 empresas, distribuídas entre os acionistas da iniciativa privada.
Após a eleição de Luis Inácio Lula da Silva em 2002, o governo brasileiro gastou menos com a privatização de empresas estatais e a concessão de bens públicos à iniciativa privada. Até o fim do governo da presidenta Dilma Rousseff, a agenda de privatização de empresas estatais não avançou no mesmo ritmo.
Isso pode ser explicado pela articulação entre agendas políticas, ideologias partidárias e planejamento econômico. Durante os dois mandatos plenos de Lula (2003-2010) e um mandato completo e um incompleto de Dilma (2011-2016), o alinhamento mais à esquerda dos dois governadores envolveu a priorização da reforma dentro do estado, em vez da privatização.
A questão das privatizações no Brasil, bem como suas deficiências, vantagens e processo de venda tem sido amplamente discutida desde a democratização. Na ditadura, o Estado controlava as empresas e, portanto, a economia brasileira. Até agora, nenhuma grande empresa foi vendida - a privatização da Eletrobrás pode ser a primeira desse tipo.
Concessão x Privatização
Nem toda empresa privada estatal envolve privatização. Existem dois tipos de "autorização" concedidas pelo Estado para que a administração privada cuide das empresas que prestam serviços à população.
Na privatização, a entrega da empresa à iniciativa privada é permanente. A propriedade da empresa e os serviços que ela oferece vão diretamente para os acionistas privados que irão administrar a empresa.
A influência do Estado não está "em algum lugar" no fim da privatização; as condições de operação e prestação de serviços do antigo estado para o público brasileiro ainda são regulamentadas por órgãos estaduais, como a Anatel, no caso das empresas de telecomunicações.
As concessões podem ser consideradas como "acordos" entre iniciativa privada e governo, onde a gestão das empresas é cedida, mas a propriedade permanece nas mãos do Estado; é nesta questão que a concessão difere da privatização.
A partir da concessão da administração de uma empresa estatal a um grupo de gestores privados, eles poderão lucrar com a empresa, explorar os serviços oferecidos, bem como o nicho de mercado, e fazer os ajustes necessários à empresa. Ao final da concessão, a propriedade da empresa volta ao poder público, cabendo ao poder público optar pela continuidade do contrato.
Vale ressaltar que tanto a privatização quanto a concessão não existem como subterfúgio para aumentar a arrecadação do Estado, mas também podem ser utilizadas para melhorar um serviço que, reconhecidamente, não está sendo atendido pelo governo.
Exemplos de privatizações no Brasil são as que ocorreram nos setores de telecomunicações, como a divisão Telebrás, e o setor de energia. Exemplos de concessões são aquelas que ocorrem em empresas de transporte aéreo e rodoviário, que possuem contratos de longo prazo com as concessionárias.
Pontos positivos na privatização
Pontos positivos que precisam ser levados em consideração quando falamos em privatização.
Maior rentabilidade
Os defensores da privatização acreditam que a partir da venda de empresas que antes eram controladas pelo Estado para a iniciativa privada, pode-se obter maior lucratividade na prestação de serviços por essas empresas.
Isso porque a lógica da administração pública se opõe à lógica da privada. Enquanto um Estado deve sempre buscar oferecer o serviço a todos os brasileiros, mesmo que envolva noções preconcebidas, a iniciativa privada busca coibir qualquer caminho de "sangramento" monetário.
Perder dinheiro vai contra a noção de gestão empresarial seguida pelas organizações privadas, que sempre buscam o lucro, mesmo sacrificando o alcance da população.
Redução de despesas
Um dos argumentos mais utilizados por aqueles que promovem a privatização de empresas estatais é a possibilidade de redução dos gastos governamentais por meio da gestão de empreendimentos que seriam vendidos à iniciativa privada.
No Brasil, muito dinheiro público é gasto na manutenção do funcionamento e das operações das empresas estatais, que nem sempre conseguiram sustentar. Conforme discutido no ponto anterior, a lógica das empresas públicas é oferecer um serviço abrangente, mesmo que nem sempre lucrativo.
O resultado dessa política de atendimento aos brasileiros é que certas empresas estatais não têm receita para se sustentar, o que exige um esforço da máquina pública para fazer face a esses gastos e manter as estatais em funcionamento. Essas empresas públicas, que precisam de “ajuda”, são chamadas de estados dependentes.
Em outubro de 2020, em plena pandemia, a revista Exame revelou que o estado brasileiro gastaria mais de R$ 21 bilhões em recursos do Tesouro Nacional com estados dependentes, o que não gerou receita suficiente para se sustentar. O valor para 2020 revelou um aumento de 22,8% face a 2019.
Os melhores serviços e produtos
Aumentar a competitividade e, consequentemente, a qualidade dos produtos e serviços oferecidos pelas empresas que fazem a transição do público para o privado é uma questão frequentemente debatida pelos defensores da privatização no Brasil. Como existem muitos monopólios estatais no país, fruto de vinte anos de regime militar, a diversificação de mercados pode levar a uma melhora na oferta.
Se uma empresa precisa competir com outras para conquistar consumidores e reter seus compradores, a importância da qualidade do produto ou serviço que essa empresa oferece cresce à medida que se expande.
Já em um cenário de mercado onde existe uma empresa que atende todo um setor, a qualidade do atendimento fica em segundo plano, pois o consumidor não tem outras opções. Se você pesar no mercado de ações de empresas privadas, com base na lógica da lucratividade, terá que investir cada vez mais no que se chama de "P&D", pesquisa e desenvolvimento , pesquisa e desenvolvimento em inglês.
Pontos negativos da privatização
Pontos negativos que precisam ser levados em consideração quando falamos em privatização.
Impossibilidade de controle estatal
Quando uma empresa estatal é privatizada, isso não significa que o Estado não tenha mais participação em sua gestão. O que acontece, de fato, é que o percentual de participação do Estado brasileiro diminui, ou seja, o governo perde a capacidade de controlar a empresa, que antes era concentrada. Essa característica das privatizações pode ser boa ou ruim, dependendo da gestão privada que você assumir posteriormente.
Assim como na "privatização" da Petrobras, que na verdade foi uma megacapitalização, o Estado brasileiro pode colocar à venda no mercado financeiro uma fração do capital da empresa, abrindo-a ao capital privado sem perder o controle. A perda do poder público sobre um estado tem várias consequências, incluindo a diminuição da lucratividade do estado.
Tendência a diminuir e pagar equidade
Talvez a característica mais marcante e conhecida para os brasileiros das empresas estatais sejam os concursos públicos. As empresas geridas pelo Estado brasileiro não realizam processo seletivo para contratação de servidores públicos da mesma forma que as empresas privadas.
Nas empresas estatais, todos os funcionários diretos passam no teste de concorrência, que leva em consideração conhecimentos gerais e específicos da empresa. Uma característica das empresas públicas é a cobiçada estabilidade (nenhum funcionário público pode ser demitido repentinamente, por exemplo, exceto em alguns casos) e a alta remuneração.
Com a transição do setor estatal para o setor privado, as empresas deixam de ter a obrigação de oferecer a mesma estabilidade aos servidores públicos, nem de manter o nível de remuneração.
Aumento do número de terceirizados
Com a nova reforma trabalhista, o vínculo empregatício assumiu novas formas. Agora, muitas empresas que já eram estatais e passaram pelo processo de privatização contratam trabalhadores por meio de empresas terceirizadas, que oferecem serviços como limpeza, por exemplo.
Anteriormente, qualquer servidor que operasse nas dependências da empresa pública teria que ser licitado. A partir da privatização, as formas de contratação de trabalhadores mudam, e a precarização do vínculo empregatício é muito comentada por aqueles que se opõem à privatização. A falta de garantias, estabilidade, baixa remuneração e ausência de responsabilidade corporativa por parte do trabalhador são alguns dos destaques.
Principais projetos de privatização
Apresenta os principais projetos de privatização discutidos, analisados, estruturados e concluídos no Brasil desde a democratização no final da década de 1980.
Privatização Eletrobrás
Status: Concluída
A privatização e participação acionária entre os acionistas da Eletrobrás, maior setor de energia do Brasil, foi concluída em 14 de junho de 2022, quando foi anunciado que as ações da empresa custariam US$ 42 por ação, arrecadando cerca de US$ 29,3 bilhões de reais.
A participação do Estado na empresa caiu de mais de 70% para cerca de 45%, a partir da finalização da privatização. A empresa não tem controlador definido e foi a primeira grande privatização desde o início do governo Bolsonaro.
Privatização dos Correios
Status: Stop
Em 2021, o projeto de lei que daria início à privatização dos correios foi aprovado em caráter de urgência na Câmara dos Deputados. Por falta de liderança que incentive a passagem do PL pelo Senado, até a chegada do presidente Jair Bolsonaro (PL), o processo está paralisado, sem perspectiva de retorno à Câmara.
A expectativa sobre o processo de privatização do Estado era alta, pois mantém o monopólio postal no Brasil. A equipe econômica do atual governo esperava que a privatização dos Correios fosse uma forma de incentivar os investidores com a oferta de ações, já que a proposta envolve a venda de 100% da empresa e a oferta de um contrato de concessão para a prestação de serviços .
Privatização do SUS (Sistema Único de Saúde)
Situação: Sem progresso
Em outubro de 2020, quase dois anos após o início de seu governo e em meio à pandemia de Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro anunciou um decreto por meio do Diário Oficial da União. O decreto antecede o "desenvolvimento de estudos alternativos de parceria com a iniciativa privada para a construção, modernização e funcionamento de Unidades Básicas de Saúde dos Estados, Distrito Federal e Municípios", visando essencialmente a privatização da estrutura do SUS.
As Unidades Básicas de Saúde, conhecidas como UBS, são uma das portas de entrada para o atendimento gratuito à saúde oferecido no Sistema Único de Saúde. Uma possível privatização do SUS colocaria em risco o funcionamento dessas unidades, que atendem majoritariamente o público de classes socioeconômicas mais baixas no Brasil, que não têm acesso à saúde privada.
A privatização do SUS, sistema internacionalmente elogiado e reconhecido por sua amplitude e capilaridade, principalmente em um momento de imensa fragilidade da saúde nacional e global, tornou-se polêmica nas redes sociais. O Conselho Nacional de Saúde disse que encara o decreto do presidente como uma ameaça à integridade dos cuidados de saúde universalmente acessíveis consagrados na Constituição. Para realizar a privatização do SUS, o governo precisaria orientar uma PEC, alterando a lei maior do Brasil.
Privatização da Petrobrás
Local: Concluído
Em 2010, decidiu-se privatizar a Petrobras, que na realidade deveria ser considerada uma “capitalização” da empresa. Isso porque, como a privatização envolve a perda do controle estatal pelo governo, no caso da privatização da Petrobras, o Brasil continua sendo o “sócio majoritário” do explorador de petróleo.
O então presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu o preço do barril de petróleo de acordo com os interesses do governo brasileiro e dos investidores, permitindo que a Petrobras tenha capital privado para atender a demanda interna e investir internamente. A privatização de parte da Petrobras, por um lado, permitiu maiores investimentos em infraestrutura; por outro, tem dado espaço para que os interesses do capital privado e da classe empresarial influenciem as decisões sobre o preço dos combustíveis, por vezes prejudicando os consumidores brasileiros.
A privatização da Petrobras, ou a capitalização de uma fração da empresa, continua sendo debatida até hoje, mais de dez anos após a cisão entre as partes pública e privada da empresa.
Privatização do Vale do Rio Doce
Status: Concluído
Em 1997, o governo Fernando Henrique Cardoso vendeu a empresa Vale do Rio Doce, transferindo o controle da empresa para acionistas privados e fundos de pensão. Envolvendo uma receita de cerca de US$ 3,3 bilhões, a privatização da Vale foi e ainda é polêmica, devido à defasagem de sua valorização em relação ao lucro real que representava.
A empresa valia, de fato, quase quatro vezes o valor estimado pelo governo: R$ 12,5 bilhões de reais em ações. 25 anos após a venda da empresa, a Vale registrou a maior lucratividade de qualquer empresa da história do Brasil, arrecadando US$ 121 bilhões.
A história do Vale não é marcada apenas pelo sucesso financeiro, no qual o governo brasileiro não tem participação, mas também por incidentes de irresponsabilidade ambiental e risco humano. Em 2019, uma barragem de mineração da empresa se rompeu na cidade de Brumadinho (MG), matando 270 pessoas no maior acidente de trabalho da história do país, além de ser o segundo maior em impacto ambiental.
O rompimento de uma barragem em Mariana (MG) em 2015 também trouxe à tona a ação da Vale, já que o antigo estado tinha ações da empresa responsável pela mineração no local, a Samarco. O incidente industrial foi o maior impacto ambiental da história brasileira e o maior do mundo na questão das barragens de rejeitos de mineração.
Para entender mais como funciona o processo de privatização de empresas no Brasil, além de saber mais sobre as estatais brasileiras que atuam no mercado financeiro, veja mais matéria sobre Economia em nosso portal.
Privatização: Conclusão
A privatização de empresas estatais no Brasil, apesar de ser uma questão de opinião, tem vantagens e desvantagens como qualquer outro processo utilizado pelo governo para uma determinada empresa, que o governo considera de maior interesse para a população. Estudando as privatizações no Brasil, percebe-se que elas não são inerentemente boas ou ruins, mas dependem de uma boa gestão e da solidez da estrutura deixada pelo governo.
Conhecendo mais os prós e os contras das privatizações e o histórico da venda de empresas estatais para a iniciativa privada no Brasil desde o período da redemocratização, é possível debater conscientemente as consequências da desnacionalização para a sociedade brasileira.
PARA ENTENDER um pouco mais sobre o assunto, a reportagem de O POVO “O que está em jogo com a falência do monopólio dos Correios” faz uma análise aprofundada da possibilidade de privatização do referido Estado.
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