Escala 4x3: perspectivas e desafios da proposta de semana de 4 dias
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para redução da jornada semanal de trabalho gera debate sobre produtividade, economia e saúde mental no BrasilA Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a redução da jornada de trabalho de 6x1 defende não só acabar com o modelo em que o trabalhador folga apenas um dia na semana como também adotar a “jornada de trabalho de quatro dias na semana”. Assim, o texto de autoria da deputada federal Erika Hilton (Psol-SP) propõe a escala conhecida como 4x3.
O diálogo que gira em torno dessa mudança envolve, a princípio, duas facetas. Uma pensa que a diminuição da escala de trabalho pode alterar os custos das empresas, gerar produtos menos competitivos, causar desemprego e redução na qualidade dos serviços.
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A outra vê pela perspectiva de que o descanso de três dias pode aumentar a produtividade e a oferta de emprego. Consequentemente, haveria uma melhora na economia, mas isso aconteceria gradativamente, como aponta o economista e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor) Ricardo Eleutério Rocha.
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Escala 4x3: há uma tendência mundial de redução da jornada de trabalho?
Ricardo Eleutério, que também é conselheiro titular do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE), explica que há controvérsias em torno da jornada de trabalho no modelo 6x1.
“A questão levantada é marcada por um forte embate entre capital e trabalho. De um lado, sindicatos patronais, federações de indústria e empregadores argumentam que o fim desse regime traria aumento nos custos de produção, tornando os produtos menos competitivos e possivelmente gerando desemprego”, afirma.
Por outro lado, há evidências de que avanços relacionados aos direitos dos trabalhadores, no Brasil, historicamente, enfrentam grande resistência política e econômica. Mas, quando são concretizadas, é possível notar que houve avanço social e econômico, mesmo que não de forma instantânea.
Exemplos dessa resistência incluem:
- o fim da escravidão, quando se dizia que o País entraria em colapso;
- a criação do salário mínimo, que supostamente seria insustentável; e
- a implementação do 13º salário e das horas extras, que também foram alvo de oposição sob o argumento de inviabilidade econômica.
No entanto, “isso não gera necessariamente desemprego, embora os setores respondam diferentemente às mudanças", argumenta o economista. Ao contrário, o conflito entre capital e trabalho foi sendo ajustado gradativamente, sem gerar o desemprego massivo que muitos previam.
Diante disso, observa-se uma tendência mundial de redução da jornada de trabalho, especialmente em países desenvolvidos. “Os países, à medida que vão avançando, vão reduzindo a jornada de trabalho. Nós estamos assistindo isso em vários países desenvolvidos, jornadas de 4x3, essa é uma tendência”, afirma Eleutério.
Escala de trabalho 4x3: como a mudança impacta na Economia?
O modelo 4x3 já é uma realidade em alguns países, como Islândia, Nova Zelândia e Japão. Agora, começa a ser testado por algumas empresas brasileiras que buscam um equilíbrio entre produtividade e bem-estar dos funcionários.
Um projeto piloto desenvolvido pela "4 Day Week Brazil" propôs a 20 empresas brasileiras continuar pagando o mesmo salário e manter a produtividade, apesar da carga horária reduzida. Após três meses, apontou que menos faltas e maior otimização das tarefas.
Para o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, os efeitos econômicos de acabar com regime 6x1 demandam estudos. “Precisamos olhar com muito mais cuidado. É evidente que ganhos de produtividade sempre facilitam esse processo. Eu acredito que os impactos econômicos também não são tão fáceis de estimar, e a própria evidência acadêmica e científica que se produziu é mista, nesse sentido. Ela não é conclusiva”, disse na discussão durante a apresentação do Boletim Macrofiscal, no dia 18 de novembro.
“Acho que a discussão da escala 6×1 é uma discussão que diz respeito muito mais diretamente ao bem-estar físico e mental dos trabalhadores, seu tempo de descanso em um mundo que sofre cada vez mais de ansiedades, depressões, problemas ligados à fadiga e ao burnout”, seguiu o secretário.
Quatro dias antes, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, o fim da escala 6x1 sem redução salarial. Segundo ele, essa jornada atual é "cruel". Marinho reiterou que o governo tem "grande simpatia" pela proposta e pediu serenidade no debate.
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Já para o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a proposta da deputada federal Érika Hilton é "bastante prejudicial" para os trabalhadores. "Ele vai aumentar o custo do trabalho, vai aumentar a informalidade e vai diminuir a produtividade", afirmou em evento do Instituto Líderes do Amanhã, em Vitória (ES).
Os setores industrias também são pessimistas en suas projeções. Estimativas da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) figuram que a redução da carga horária semanal pode resultar em uma perda de mais de R$ 8 bilhões para as indústrias brasileiras, e de R$ 38 bilhões para os setores produtivos de modo geral.
Já a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) é ainda mais temerosa e projeta impacto de quase R$ 116 bilhões ao ano para o setor no País. Segundo a Firjan, para o cálculo, foi considerada a carga horária média e os custos com salários e encargos trabalhistas, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Até o momento, ao que parece, são evidentes aos setores as melhorias para a qualidade de vida do trabalhador. Entretanto, há dúvidas sobre os impactos financeiros e temores quanto a aumentos nas folhas de pagamento e redução de lucros.
Escala 4x3: salários mantidos ou pagamento por hora?
O economista Ricardo Aquino Coimbra explica que essa incerteza ocorre devido à proposta de mudança de jornada trabalhista estar relacionada às tendências observadas em países desenvolvidos, onde há uma estabilização populacional e uma menor necessidade de mão de obra intensiva em razão de processos produtivos cada vez mais automatizados.
Nestes países, a redução da jornada de trabalho é acompanhada de uma redistribuição de empregos. Quando as horas de trabalho de um funcionário são reduzidas, o espaço deixado pode ser ocupado por outra pessoa, contribuindo para a inserção de mais indivíduos no mercado de trabalho e o equilíbrio da atividade econômica.
No entanto, essa abordagem muitas vezes está atrelada ao pagamento proporcional às horas trabalhadas. Assim, quem trabalha menos, ganha menos, enquanto outros são contratados para completar a carga horária, gerando um efeito compensatório.
Como funcionaria no Brasil?
No Brasil, conforme explica o economista Ricardo Coimbra, também conselheiro Corecon-Ce, a discussão atual gira em torno de reduzir a jornada de trabalho sem reduzir proporcionalmente os salários. Essa proposta, embora beneficie o trabalhador, implicaria em custos adicionais para os empregadores.
Por outro lado, se o sistema fosse ajustado para o pagamento por hora trabalhada, a redução de jornada poderia ser viabilizada sem elevação de custos ao direcionar a remuneração para novos contratados, ampliando a participação no mercado de trabalho.
Escalas de trabalho: como influenciam a saúde mental do trabalhador?
Outro aspecto relevante é a saúde mental dos trabalhadores. A redução da jornada de trabalho oferece mais tempo para o lazer, o ócio e o bem-estar, atendendo a uma necessidade humana de equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
Para Izabela Holanda, diretora da IH Consultoria e Desenvolvimento Humano e mestre em Felicidade no Trabalho, essa mudança representa mais que simplesmente reduzir a jornada semanal.
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“A adoção da semana de quatro dias é uma oportunidade para repensarmos como trabalhamos e como podemos ser mais felizes e produtivos ao mesmo tempo. Mas essa transição não é simples. Ela exige um novo olhar para a forma como as empresas organizam seu trabalho e como gerenciam as pessoas e as equipes", afirma Izabela.
A implementação de uma semana de quatro dias requer mais do que um simples ajuste de horário. Segundo Izabela, as empresas precisam, de fato, redesenhar seu modelo organizacional.
“É preciso pensar em como otimizar os processos, investir em tecnologias que aumentem a produtividade e, principalmente, criar uma cultura de confiança e flexibilidade”, explica. Essa mudança envolve uma transição cuidadosa que leva em consideração as necessidades de cada equipe e o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal.
Escala de trabalho 4x3: principais benefícios
- Aumento da produtividade: menos tempo no escritório não significa menos trabalho. Ao contrário, pode resultar em mais foco e concentração. "Quando as pessoas têm tempo para descansar de verdade, elas voltam ao trabalho com mais energia e criatividade", explica Izabela.
- Melhora do bem-estar e da saúde mental: reduzir a carga horária semanal permite que os colaboradores tenham mais tempo para dedicar à família, aos amigos ou a atividades pessoais. O impacto na saúde mental é considerável, com redução do estresse, da ansiedade e do esgotamento emocional.
- Retenção de talentos: o modelo de semana de quatro dias tem se mostrado uma excelente ferramenta para reter bons profissionais. Isso porque muitas pessoas hoje buscam empresas que entendam a importância do equilíbrio entre vida pessoal e profissional, e que ofereçam um ambiente de trabalho mais flexível e humanizado.
- Redução de custos operacionais: a redução de dias úteis também pode gerar uma diminuição de custos para as empresas, como com o uso de energia e outros recursos. Além disso, ao melhorar o clima organizacional, as empresas podem reduzir a rotatividade de funcionários, o que, por sua vez, diminui os custos com recrutamento e treinamento.
- Alta na satisfação e no engajamento: funcionários que sentem que seu tempo é valorizado tendem a ser mais satisfeitos e engajados no trabalho. Isso resulta em uma maior disposição para contribuir com os objetivos da empresa e também em uma redução de absenteísmo e rotatividade.
Escala de trabalho 4x3: desafios e cuidados ao implementar a semana de quatro dias
Como qualquer mudança significativa, a implementação da semana de quatro dias apresenta desafios que precisam ser cuidadosamente avaliados. Para Izabela, um dos maiores obstáculos é a resistência cultural, especialmente em empresas mais tradicionais, que ainda enxergam a carga horária como a principal medida de produtividade.
"Mudar a mentalidade de líderes e gestores sobre o que é um bom desempenho no trabalho não é fácil, mas é essencial para que essa mudança aconteça de forma bem-sucedida", destaca a especialista.
Outro desafio é a adaptação de empresas que precisam de cobertura contínua. “Setores como saúde, transporte e segurança, por exemplo, enfrentam dificuldades para reduzir a jornada de trabalho sem comprometer a qualidade dos serviços. Nessas áreas, a solução pode passar por ajustes no modelo de escalas de trabalho ou até mesmo pela incorporação de mais tecnologia e automação”, explica Izabela.
Além disso, se não for bem gerida, a redução de dias de trabalho pode acabar sendo acompanhada por uma cobrança excessiva sobre a performance diária.
“A chave está em encontrar o equilíbrio. A redução de horas não pode resultar em uma sobrecarga no tempo restante", alerta Izabela.
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