Anatel se coloca contra a construção de usina de dessalinização no Ceará

Cagece, no entanto, diz que cronograma segue inalterado e prevê inicio da construção em julho do próximo ano sem mudança no projeto

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) afirmou que é contra a construção da usina de dessalinização na Praia do Futuro, em Fortaleza. O motivo é a proteção dos cabos submarinos de fibra óptica instalados naquela região. A Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece), no entanto, assegura que não há riscos e mantém o projeto nos moldes atuais.

O conflito entre as operadoras e a Cagece existe há mais de um ano, desde que o local de construção da Dessal - Sociedade de Propósito Específico (SPE) formada entre a Cagece e o consórcio Águas de Fortaleza - foi definido. Veja as notas das empresas abaixo.

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O POVO adiantou o imbróglio quando a Anatel emitiu a primeira recomendação contrária à instalação da usina. Em seguida, grupos de debate foram formados e, ontem, desfeitos, após a saída das operadoras. Neste meio tempo, o projeto teve até a licença ambiental emitida, sem que a Anatel se manifestasse.

Os motivos da Anatel

Na nota emitida hoje, a Agência diz que "no projeto da SPE são ignoradas as possibilidades de influência, dos dutos marítimos da Usina que despejam (supõe-se, com força e alta pressão) os dejetos em maior concentração de sal ao mar após o processo de dessalinização, no leito marinho, portanto, não provendo qualquer segurança aos interessados do setor de telecomunicações".

"Estudos de avaliação do local da obra objeto da Concorrência Pública Internacional da Cagece previram a interferência nos cabos, todavia de forma subdimensionada. Existem outras opções para realização do projeto. O atual projeto apresentado pela SPE - Águas de Fortaleza não contém uma sessão sequer dedicada à analisar riscos e providências para com a infraestrutura terrestre e marítima associada aos cabos submarinos", completa.

Outro ponto mencionado é que a Cagece e o Consórcio Águas de Fortaleza não observaram recomendações do International Cable Protection Committee (ICPC).

Operadoras cobram maior distância para cabos submarinos

As operadoras de telecomunicações indicam que a operação da Dessal na Praia do Futuro vai interferir na operação dos 17 cabos submarinos que estão instalados na área.

Para evitar isso, inicialmente, as partes concordaram em aumentar em 500 metros a distância da captação da água e despejo do sal. Em seguida, as teles exigiram a mesma distância para o prédio da usina, e começou uma nova rodada de negociações.

O principal risco apontado pelas operadoras é de que pode haver um apagão de internet no Brasil caso haja um acidente, uma vez que Fortaleza é o ponto mais conectado da América do Sul e onde chegam todos os cabos internacionais que ligam o Brasil aos Estados Unidos, Europa e África.

O que diz a Cagece?

Ao O POVO, a Cagece afirmou que "as infraestruturas da Dessal do Ceará não apresentam nenhum risco para o funcionamento dos cabos submarinos de internet que operam na orla da Praia do Futuro. Essa afirmação está embasada e demonstrada tecnicamente em estudos divulgados amplamente".

Sobre as recomendações do ICPC, a Companhia diz que o distanciamento feito foi maior que o exigido, de 567 metros, e acrescenta que "essa distância não é respeitada nem mesmo pelas próprias empresas de telefonia e internet que possuem cabos submarinos na orla de Fortaleza. Inclusive, hoje existe cruzamento entre cabos submarinos dessas próprias empresas".

A respeito do cruzamento entre os cabos e as tubulações da usina em terra, a Cagece rebate os riscos apontados enumerando os 1.204 pontos de cruzamento entre redes da Cagece e das empresas de internet hoje. "Além disso, 285 pontos de cruzamento entre redes de gás e internet e outros 85 pontos de cruzamento com redes de drenagem da Prefeitura de Fortaleza, sem nunca ter havido nenhuma interferência ao funcionamento dos serviços das telefônicas. Atualmente, todas coexistem e funcionam normalmente", completa.

Seca se aproxima

O cenário de seca alertado pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) no mês passado foi lembrado pela Cagece como um dos pontos que tornam a Dessal ainda mais necessária para o abastecimento no Estado, em especial, na Capital.

"O equipamento irá possibilitar o incremento de 1000 litros de água por segundo no sistema de distribuição de água da capital, atendendo diretamente 720 mil pessoas. Esse incremento também possibilitará a preservação dos mananciais do interior de estado, que abastecem atualmente a capital", ressalta.

Entenda a questão

A instalação da primeira usina de dessalinização do Brasil na Praia do Futuro tomou conta do noticiário nos últimos meses depois que as empresas de telecomunicação elevaram o tom contra a instalação do equipamento sob o risco de derrubar a internet do País.

Mas o imbróglio se arrasta há um ano, desde setembro de 2022. O empreendimento tem investimentos previstos de R$ 3 bilhões, ao longo de 30 anos.

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A usina terá capacidade de produzir mil litros (ou 1 metro cúbico) de água potável por segundo, deve beneficiar cerca de 720 mil pessoas e teve o leilão para construção feito em março de 2021.

Distância para o cabos foi ampliada para 500 metros

Em 2022, após mais de seis meses de tratativas com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a Companhia de Água e Esgoto se disse surpreendida por um parecer contrário à instalação do projeto da usina de dessalinização na Praia do Futuro, em Fortaleza, em razão do impacto que a operação pode causar aos cabos submarinos de fibra óptica.

A medida travou o andamento do projeto e atrasou a entrega da usina, que estava prevista para iniciar as operações em 2025. Em um ano, o projeto de captação da água do mar foi refeito, afastando em 500 metros (antes eram 50) a distância dos cabos submarinos.

O motivo do afastamento é por causa da chegada de 17 cabos submarinos de fibra óptica, que conectam a capital cearense às américas Central e do Norte, à Europa e à África em estruturas revestidas de borracha, cobre e gel de silicone instaladas nos fundos dos oceanos.

Fortaleza é a segunda cidade no mundo em número de cabos submarinos e as empresas de telecom afirmam que a captação da água do mar próxima dos equipamentos pode causar algum prejuízo à conexão.

Declaração deflagrou a polêmica

Mas o aumento da distância não satisfez as empresas de telecom. Em Fortaleza no último dia 25, o vice-presidente de Relações Institucionais da Claro, Fábio Andrade, deflagrou uma crise que foi notícia em todo o País. Ao O POVO, ele afirmou que o projeto de construção de uma usina de dessalinização na Praia do Futuro pode ‘parar a internet’ no Brasil.

"“Isso aí vai acabar com a internet e se isso ocorrer o Brasil vai parar, o sistema financeiro, o sistema de saúde, etc. Porque em três locais que têm a sobreposição dos cabos com a usina pode haver uma queda na internet e como foi dito (por palestrante que citou o tempo necessário para fazer manutenção em um cabo danificado no Rio de Janeiro), vai ser no mínimo 50 dias para arrumar”, disparou Andrade, ao criticar a terceira versão do projeto da usina de dessalinização.

A preocupação seguinte das empresas era de que as obras físicas da usina causassem rompimento das fibras que estão enterradas naquela região da Capital.

Respostas duras

Desta vez, no entanto, Cagece e o Consórcio Águas de Fortaleza não cederam e afirmaram que, na verdade, as empresas de telecomunicações querem criar uma reserva de mercado na Praia do Futuro.

"A escolha pela Praia do Futuro não é por capricho nosso! É porque ali é onde você tem as correntes marinhas adequadas e onde você tem capacidade de captar a melhor água, a mais adequada", afirmou Renan Carvalho, presidente do Consórcio Águas de Fortaleza.

“Argumento técnico para não ser feita a obra não existe. Só se eles inventarem”, disse Neuri Freitas, presidente da Cagece.

O governador Elmano de Freitas também se manifestou sobre a questão depois de provocado, e criticou a postura das empresas de telecom: "As empresas de cabos e internet querem ser donas da Praia do Futuro", disparou, mostrando que não deve mudar o projeto por conta das recomendações.

Prazos

De posse da licença ambiental e dos recursos para a SPE seguir em frente, a Cagece reafirma que as obras da usina devem começar em julho do próximo ano, sem que haja um novo prejuízo ao projeto.

As obras previstas para começar nos primeiros meses de 2024 foram atrasadas em cerca de um ano e seguem cronograma independente das operadoras de telecom. Novas audiências públicas, inclusive, foram feitas com os habitantes do entorno do Vicente Pinzon, onde se pretende instalar os dutos de captação.

Uma nova temporada de seca prevista para ter início no próximo ano é apontada como mais um motivo para acelerar as atividades da Dessal.

Nota da Anatel

A Anatel reitera oposição à obra de construção da usina de dessalinização na Praia do Futuro, localizada em Fortaleza, Ceará, nos termos do atual projeto, e recomenda alteração do projeto de construção para outro local dentre as opções avaliadas como possíveis.

Os cabos submarinos são infraestrutura essencial ao funcionamento das telecomunicações e da internet no Brasil e também para o fluxo de informações internacional. Esses cabos estão ali ancorados há décadas, desde antes da privatização do setor de telecomunicações.

Falhas nos cabos provocam danos, e seu reparo decorre de atividade lenta e complexa, envolvendo navios de enorme tamanho, mergulhadores e equipamentos subaquáticos. A adição de riscos, portanto, é indesejável e imprudente.
Estudos de avaliação do local da obra objeto da Concorrência Pública Internacional da CAGECE previram a interferência nos cabos, todavia de forma subdimensionada. Existem outras opções para realização do projeto.

O atual projeto apresentado pela SPE - Águas de Fortaleza não contém uma sessão sequer dedicada à analisar riscos e providências para com a infraestrutura terrestre e marítima associada aos cabos submarinos.

No projeto da SPE são ignoradas as possibilidades de influência, dos dutos marítimos da Usina que despejam (supõe-se, com força e alta pressão) os dejetos em maior concentração de sal ao mar após o processo de dessanilização, no leito marinho, portanto, não provendo qualquer segurança aos interessados do setor de telecomunicações. O projeto SPE não trata das 11 recomendações do International Cable Protection Committee (ICPC) informadas pela Agência, que não se limitou a requerer distanciamento de 500 metros em nenhum documento.

Não há no projeto atual qualquer estudo, previsão, planejamento e detalhamento das medidas que serão adotadas para garantir que os dutos terrestres da Usina não provocarão interferências nos cabos.

Os cabos têm vida útil e há aumento anual de demanda de tráfego de internet, que tendem a requerer ao longo dos anos a substituição de cabos e/ou expansão.

Recai aos interessados em construir a usina nas proximidades a adoção de postura diligente, cuidadosa, com empenho de estudos técnicos de credibilidade que estabeleçam e delimitem quais especificamente são os riscos, em quais condições e cenários de curto, médio e longo prazos, não só quanto ao período de construção, mas também de operação e manutenção das infraestruturas.

Nota da Cagece

A Companhia de Água e Esgoto do Ceará Cagece (Cagece) informa que o cronograma de construção da Planta de Dessalinização de Água Marinha permanece inalterado. O início das obras ocorrerá após a emissão da licença de instalação da mesma e está previsto para julho de 2024. Na oportunidade, a companhia destaca que o encerramento do grupo de trabalho, criado para a busca de uma solução consensual sobre a construção da planta, bem como o parecer contrário à construção do equipamento, demonstram, mais uma vez, o desinteresse das empresas de telefonia pela segurança hídrica da população do Ceará. A companhia informa ainda que foi comunicada sobre o encerramento das atividades do grupo pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O encerramento foi motivado pela falta de interesse das empresas de telefonia na continuidade dos trabalhos, se recusando a entrar em consenso com a Cagece.

Vale destacar também que as infraestruturas da Dessal do Ceará não apresentam nenhum risco para o funcionamento dos cabos submarinos de internet que operam na orla da Praia do Futuro. Essa afirmação está embasada e demonstrada tecnicamente em estudos divulgados amplamente pela Cagece durante todo o processo de discussão desse projeto, que teve início em 2017. Hoje, a estrutura de captação de água marinha encontra-se a 567 metros de distância dos cabos submarinos, distância maior que a recomendação do Internacional Cable Protection Committee (ICPC), órgão que atua na proteção de cabos submarinos e de infraestruturas subaquáticas no mundo todo. Essa distância não é respeitada nem mesmo pelas próprias empresas de telefonia e internet que possuem cabos submarinos na orla de Fortaleza. Inclusive, hoje existe cruzamento entre cabos submarinos dessas próprias empresas.

Em relação à parte terrestre, atualmente diversas outras estruturas, de diferentes serviços, já cruzam as redes das empresas de telefonia e internet. Hoje, na área terrestre de Fortaleza, existem 1.204 pontos de cruzamento entre redes da Cagece e das empresas de internet. Além disso, 285 pontos de cruzamento entre redes de gás e internet e outros 85 pontos de cruzamento com redes de drenagem da Prefeitura de Fortaleza, sem nunca ter havido nenhuma interferência ao funcionamento dos serviços das telefônicas. Atualmente, todas coexistem e funcionam normalmente.

A Cagece sempre conduziu o processo de implantação do projeto na praia do futuro de forma responsável, com total compromisso com a transparência e ampla divulgação de todas as etapas nos meios de comunicação oficiais, imprensa e demais instrumentos de participação democrática. As empresas de internet nunca manifestaram interesse em participar das consultas e audiências públicas realizadas. Além disso, cabe ressaltar que esse processo sempre levou em consideração toda a legislação pertinente, buscando sempre as orientações e deliberações emitidas por órgãos competentes.

Cabe lembrar ainda que, diante de um cenário anunciado de El Niño, com previsão de redução de chuvas e escassez hídrica no Ceará, a Cagece ratifica a importância da construção da Planta de Dessalinização para a continuidade do abastecimento de água da capital Fortaleza, bem como para a segurança hídrica de todo o estado. O equipamento irá possibilitar o incremento de 1000 litros de água por segundo no sistema de distribuição de água da capital, atendendo diretamente 720 mil pessoas. Esse incremento também possibilitará a preservação dos mananciais do interior de estado, que abastecem atualmente a capital.

Para a Cagece, o cenário construído por meio de um discurso que não possui sustentação técnica, exige também uma reflexão crítica sobre os reais interesses dessas empresas. Ao que parece, elas querem privatizar a Praia do Futuro, formando uma reserva de mercado, em nome de um lucro futuro, com pouca preocupação com o social. Por fim, nunca é demais lembrar que os interesses privados jamais poderão estar acima dos interesses públicos, ainda mais quando se trata de acesso à água em um estado Semiárido e diante de mais um ciclo crítico de escassez hídrica que se anuncia.

Nota do Consórcio Águas de Fortaleza

O projeto da usina de dessalinização não traz qualquer ameaça aos cabos e nem aos data Center que existem na Praia do Futuro.

Isso está claramente demonstrado, razão pela qual mais de 20 pareceres de órgãos técnicos ambientais aprovaram a Licença Prévia para a execução do projeto.

O governo e o povo cearense, que convivem com o problema da falta de água, não devem aceitar um parecer sem base técnica, manifestamente parcial, que atende apenas a interesses privados.

A Anatel não tem poder de veto no projeto e está apenas sendo porta-voz de empresas interessadas em privatizar a Praia do Futuro.

Enquanto agência reguladora tem apresentado comportamento eivado, de rigor desnecessário no Estado do Ceará, sua conduta destoa de outros Estados, quando fez vistas grossas para os cabos existentes no Rio de Janeiro e do litoral paulista. Será que a Anatel não conhece o que revelam as cartas náuticas desses lugares?

Estamos diante de uma ação coordenada por um grupo econômico, com auxílio do órgão regulador utilizado a reboque, para tentar retirar do povo cearense, em nome de interesses privados, o direito básico do acesso à água.

A SPE Águas de Fortaleza mantém a posição de seguir o cronograma da obra.

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