Dia de Finados: entenda a origem e o significado do feriado

Instituído no século XI por Odilo de Cluny, o Dia de Finados é um ritual de despedida que ajuda a demarcar o estado de luto; entenda a origem da data

00:04 | Nov. 02, 2023

Por: Iully Fernandes
Dia de Finados traz à reflexão os eventos inexoráveis aos seres humanos: o nascimento, a vida e a morte; entenda como a data se constituiu (foto: @mikebirdy / Reprodução Pexels )

Em A Solidão dos Moribundos, do sociólogo Nobert Elias, ele afirma que “Só o homem, dentre os seres vivos, sabe que vai morrer”.

Nesse sentido, as implicações das manifestações humanas diante da morte para a vida dos indivíduos e da sociedade vem da reverberação de costumes e registros arqueológicos desde a Pré-História. As práticas de rituais fúnebres representam, portanto, eventos inexoráveis aos seres humanos: o nascimento, a vida e a morte.

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Não à toa, 2 de novembro é predominado pela celebração do Dia de Finados, um dos mais importantes rituais religiosos da tradição cristã em países ocidentais. Desde os tempos remotos, os rituais de despedida ajudam a demarcar um estado de enlutamento, de reconhecimento da importância da perda e do ente que foi perdido.

Mais abaixo, entenda mais sobre a morte e o morrer enquanto uma reflexão para o Dia de Finados e conheça a origem da data.

Dia de Finados: reflexões sobre a morte e o morrer

Exatamente pela consciência da própria morte, durante milênios, a proteção contra o aniquilamento próprio e da comunidade foi a função central de grupos humanos.

Há várias formas de os indivíduos lidarem com a ideia de finitude da vida: pode-se evitar a noção da morte através da mitologização do final da vida, do encobrimento da ideia indesejada, pela crença na própria imortalidade ou encará-la como um fato da existência e ajustar a vida diante tal realidade.

Para o estudioso Nobert Elias, na atualidade, há uma tendência à crença na própria imortalidade e ao afastamento da ideia da morte.

Comparada a outros momentos históricos, a expectativa de vida tornou-se mais elevada, através dos avanços da medicina, da prevenção e do tratamento das doenças. A vida tornou-se mais previsível, exigindo maior grau de antecipação e de controle.

Diferentemente de séculos anteriores, quando o espetáculo da morte era corriqueiro e familiar, a morte passou a ser ocultada por trás dos bastidores da vida social e da rotina cotidiana. Os sentimentos e sua expressão se transformaram em tabu e a morte deixou de ser tema frequente em conversas, como já o foi em outros tempos.

Dia de Finados: a morte na Idade Média e seu tabu na contemporaneidade

Elias explica como a morte foi transformada em tabu a partir da difusão e expressão social do tema da morte, como, por exemplo, na literatura e na pintura. O fato de textos de outros tempos tratarem mais abertamente da morte, da sepultura, do aspecto e da decomposição dos cadáveres não significa um interesse mórbido pelo tema, mas uma sensibilidade distinta da atual.

Durante muitos séculos, por toda a Idade Média europeia, a morte era entendida com naturalidade, fazendo parte do ambiente doméstico. Em tal contexto, morte e vida interagiam indiferenciadamente no mundo das aldeias e cidades medievais.

Nelas, os cemitérios geralmente ocupavam o centro da cidade, dominada pela presença da igreja católica. Enquanto os mortos socialmente importantes eram enterrados no interior da própria igreja, os dissidentes eram enterrados em um terreno ao lado.

Neste espaço, a população transitava, fazia comércio, brincava e participava de festas. Os mortos não eram considerados, como hoje, presenças inoportunas, uma completa oposição à vida.

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Dia de Finados: como se constituiu a data 

O feriado do Dia dos Fiéis Defuntos, Dia de Finados ou Dia dos Mortos, no qual os católicos rezam a fim de ajudar as almas no purgatório a obterem a paz celestial, teve sua data fixada em 2 de novembro durante o século XI por Odilo de Cluny (962-1049), na França.

Em tal contexto, foi se desenvolvendo a crença de que era possível, por meio das orações, das penitências e de outros atos de religiosidade dos vivos, fazer com que almas em estado de espera pudessem ser enfim recebidas por Deus.

Essas práticas também foram influenciadas por uma série de relatos místicos do fim da Antiguidade e começo da Idade Média, nos quais havia descrições de almas sofrendo uma série de punições no Além e pedindo que os vivos rezassem por elas.

O sepultamento dos mortos nas igrejas permitia à comunidade sentir a continuidade da presença dos seus entes nas suas vidas terrenas, ajudando a cimentar o conceito da Igreja enquanto comunidade peregrina (os vivos), sofredora (as almas em purificação no Purgatório) e triunfante (as almas santas no Paraíso).

A Nova Enciclopédia Católica afirma que "durante toda a Idade Média era popular a crença de que, nesse dia, as almas no purgatório podiam aparecer em forma de fogo-fátuo, bruxa, sapo, etc.". Odilo foi o primeiro a celebrar o Dia de Finados em 2 de novembro, estabelecendo que os fiéis deveriam jejuar, dar esmolas aos pobres e ir à missa.

O prestígio de Odilo e de sua comunidade em Cluny, uma das mais influentes da Europa na época, fez com que a prática se espalhasse de forma relativamente rápida pela cristandade.

Em essência, a doutrina atual da Igreja Católica ainda segue esses pressupostos. A recomendação é que os fiéis, nesse dia, façam a confissão e a comunhão e visitem um cemitério para rezar pelos defuntos, além de rezar também pelo papa.