"Violinista Chavosa": musicista usa violino para tocar funk no metrô de SP
Maria Luiza estuda violino desde os 11 anos e toca o instrumento clássico com uma roupagem de funk no metrô de São Paulo. Atualmente, também está trabalhando em um projeto solo
16:25 | Abr. 28, 2022
Por vezes, a música clássica encontra obstáculos em sua popularização por ser considerada erudita. Maria Luiza Kaluzny, de 23 anos, quer quebrar esse bloqueio. Conhecida como "Violinista Chavosa", ela mistura instrumental de violino com funk e faz sucesso nos vagões do metrô de São Paulo. Ao O POVO, Maria Luiza conta um pouco de sua trajetória e seus planos para o futuro.
A jovem nasceu na Cidade Industrial de Curitiba, no Paraná. Moradora da Vila Brasilândia, na Zona Norte de São Paulo, a instrumentista viaja cerca de uma hora dentro dos ônibus até chegar ao local de trabalho: a estação de metrô mais próxima.
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A gíria "chavosa" indica uma pessoa "de atitude, estilosa" e é usada principalmente entre os funkeiros e comunidades da periferia. Luiza começou a ser chamada de "Violinista Chavosa" ainda durante seus estudos, em Curitiba. Em algumas aulas, ela aparecia com roupas mais urbanas, bem diferente do estilo de vestuário mais clássico das apresentações. E, o que antes era apelido, se tornou sua marca.
Talento desde pequena
Maria Luiza toca violão desde o 7 anos, mas também aprendeu a cantar, tocar flauta doce e piano na faculdade de Música. Entretanto, sua formação profissional é focada no violino.
Quando era criança, ela recebeu dinheiro de um parente musicista que acreditou em seu seu talento. Com o valor, seus pais compraram o seu primeiro violino. A partir daí, Luiza fez aula de violino na Fundação Cultural de Curitiba como bolsista. Depois, ingressou na Escola de Música e Belas Artes do Paraná.
"Quando você estuda um instrumento erudito, todo o material que tem pra ele é de música clássica. Aí a gente se prende nessa cultura de séculos atrás e acaba não tendo esse incentivo para estudar músicas atuais", aponta a violinista.
Em pouco tempo, Maria Luiza conseguiu uma boa visibilidade no cenário do funk de Curitiba, após alcunhar o nome 'Violinista Chavosa'. Pensando em expandir público, ela buscou apoio local com uma rifa para ajudá-la a ir para São Paulo. Em apenas dez dias visitando a capital paulista e divulgando seu trabalho, a musicista conheceu quem viria a ser seu futuro empresário.
Entretanto, após desavenças pessoais, Luiza saiu da tutela do produtor e recebeu ajuda de um amigo que morava na cidade. Com muito trabalho, conseguiu alugar um apartamento e se estruturar em uma das cidades com custo de vida mais caro do País. "Eu sentia que aqui era meu lugar. Eu tive essa impressão desde a primeira vez que vim pra São Paulo".
Trabalhando no metrô
Maria Luiza conheceu um amigo ainda em sua antiga produtora. E quando a jovem se viu sem opções, após deixar de ser empresariada, foi ele quem deu a ideia de fazer música nos vagões de metrô. No começo, a violinista apenas o acompanhou. Depois, ela foi se acostumando com a experiência, já que a ocupação não só a ajudaria a divulgar seu trabalho, diferente de um emprego comum de 8 horas, como traria retorno financeiro imediato.
"Ele me ensinou como funcionavam as linhas, quais os melhores horários, os melhores vagões e apresentou a outros artistas de metrô", diz.
A jovem afirma que a única desvantagem de fazer música no metrô é que, em São Paulo, a profissão não é regulamentada. "Quando você vive isso todos os dias, você acaba se acostumando", explica. Para ela, o que realmente afeta os artistas de rua é a aceitação do público.
"No Brasil, a gente ainda não tem essa cultura de saber apreciar um instrumentista, parando, olhando o que ele está fazendo e aplaudindo. Existem ainda muitos vagões em que isso não acontece. E eu fico: 'Será que eu tô tocando mal?' E as vezes as pessoas encaram você fazendo música como 'ah, tá pedindo dinheiro, tá incomodando'. Então pra lidar com isso você tem que saber quem você é e por que está ali. Eu sou uma artista e eu me apresento pra eles", reflete a artista.
Quanto a tocar funk no metrô, a Maria Luiza fala que ainda há certa resistência ao gênero. Por isso, foca em apresentações exclusivamente instrumentais e comerciais, como Bruno Mars, Ed Sheeran e Alicia Keys. Dependendo do público, ela pode tocar funk ou um eletrônico.
"Geralmente, eu tô com camisa de time e óculos juliet. As pessoas que vão até o meu Instagram e me conheceram como violinista, vão ter essa ponte para um conteúdo focado para o funk", afirma, ressaltando que, enquanto estiver vivendo disso, precisa mesclar os estilos.
Projetos "chavosos"
Internacionalmente, existem artistas que misturam instrumentos clássicos com a música popular, como a violinista Lindsey Stirling e até a cantora americana Lizzo, que insere flauta às suas músicas. Maria Luiza acredita que o violino tem muitas chances de se firmar como parte integrante da música popular. Por isso, está trabalhando no seu primeiro EP, que conta com parcerias com artistas do funk.
Nesse projeto, a musicista deve trazer músicas autorais, que também devem ter a presença de outros instrumentos tido como eruditos. Entretanto, como todo o seu sustento vem do seu trabalho diário no metrô, o projeto está sendo produzido aos poucos. A previsão de lançamento é para este ano ainda.
Maria Luiza quer ter músicas viralizando e que seu sucesso a possibilite de gravar com grandes artistas. A sua maior meta é que a ideia da 'Violinista Chavosa' se espalhe dentro das periferias.
"Que a gente se aproprie desses espaços que dizem que não é pra gente, como violino, piano, violoncelo, flauta, teatro e dança. Que a gente use isso na nossa expressão. O funk muda vidas, assim como o rap e o trap salvou a vida de muita gente na quebrada, afastando de coisa errada. E acho que isso é só mais um braço para abraçar as pessoas e colocá-las num caminho da hora".