Post engana ao confundir resultado fiscal com crescimento do PIB em 2021
É enganoso um post no Facebook segundo o qual o resultado fiscal obtido pelo governo brasileiro em 2021 gerou "crescimento positivo" do Produto Interno Bruto (PIB) naquele anoEnganoso: É enganosa a postagem no Facebook que cita notícia de um jornal televisivod para afirmar que o Brasil teve o segundo melhor resultado fiscal do mundo em 2021, “com crescimento positivo do PIB”. De fato, o resultado fiscal foi positivo, conforme mostram os dados do Banco Central e melhores do que outros países, em comparação com a projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI), como divulgado pelo jornal. Isso não significa, no entanto, que houve forte crescimento do PIB - este dado ainda não foi divulgado oficialmente.
Conteúdo verificado: Post que circula no Facebook traz uma imagem do Jornal da Band transmitido em 1º de fevereiro de 2022, com dados do FMI e do Banco Central sobre o resultado fiscal de diferentes países em 2021. O texto destaca que o Brasil teve o segundo melhor resultado na lista, “com crescimento positivo do PIB”, e afirma que isso deve ser celebrado.
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É enganoso um post no Facebook segundo o qual o resultado fiscal obtido pelo governo brasileiro em 2021 gerou “crescimento positivo” do Produto Interno Bruto (PIB) naquele ano. O dado sobre o resultado fiscal está correto, mas o PIB de 2021 ainda não foi divulgado.
A base do post verificado é uma imagem congelada de um telejornal da Band, no qual duas jornalistas mostram uma tabela de países listados conforme seu resultado fiscal. O Brasil aparece em segundo lugar, atrás do Egito. O texto que acompanha a imagem na postagem afirma que “apenas três países apresentaram resultado fiscal positivo” em 2021 e que “nosso Brasil foi o segundo lugar, com crescimento positivo do seu PIB”.
O resultado fiscal é o saldo do fluxo de caixa dos governos municipais, estaduais e federal e ele não tem interferência no PIB. Na tabela mostrada pela Band, o número está relacionado ao PIB porque esta é uma forma corriqueira de comparar dados de países diferentes, com diferentes moedas.
O Comprova classificou a publicação como enganosa porque mistura informações sugerindo um resultado que não é verdadeiro.
Como verificamos?
O primeiro ponto a ser investigado foi buscar o dia e o jornal em que a tabela aparecia para, na sequência, identificar o conteúdo completo da reportagem e todas as informações inseridas nela. O Comprova fez uma busca no Google usando termos que apareciam na tabela, como “resultado fiscal”, “FMI” e “Banco Central”.
Os resultados remeteram a notícias que repercutiram uma nota informativa da Secretaria de Política Econômica, do Ministro da Economia. A nota foi publicada no dia 1º de fevereiro e trazia dados sobre o desempenho fiscal do Brasil em 2021. Em seguida, a equipe buscou no Youtube a edição do Jornal da Band exibida dia 1º e encontrou a tela que aparece na postagem.
Depois de identificado o teor da reportagem, fomos buscar com especialistas e fontes oficiais o que era resultado fiscal, como ele era medido, quem divulgava e calculava e quais fatores poderiam interferir no resultado final.
Por fim, fomos atrás dos últimos dados disponíveis sobre o PIB e o crescimento econômico do país, o que dizem os especialistas e como ele estava ligado ao resultado fiscal positivo.
O Comprova também procurou o responsável pelo post verificado, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação.
Verificação
Resultado fiscal positivo
A publicação checada pelo Comprova apresenta uma tabela com os resultados fiscais de diversos países e associa a segunda colocação do Brasil nesse ranking ao crescimento do PIB. A informação é enganosa porque o que é chamado de resultado fiscal não tem relação com o PIB. Em 2021, as contas públicas tiveram um superávit de R$ 64,7 bilhões, o que equivale a 0,75% do PIB acumulado do ano (ainda não consolidado, portanto) — dado que é mostrado na imagem. Mas as contas isoladas do governo federal tiveram déficit de 35 bilhões de reais. A soma de todos os bens, serviços e riquezas do país, o chamado Produto Interno Bruto, é utilizado apenas como parâmetro para comparações, seja com outros países ou com anos anteriores, como explica o professor Joelson Sampaio, da FGV, doutor em finanças corporativas e mercado financeiro.
“A relação do resultado primário com o PIB é mais de comparação entre os países do que um resultado final para avaliar se a economia vai bem ou mal. Porque, em termos de desempenho econômico, é importante sim olhar outras métricas de desempenho. E a principal delas é o crescimento do PIB. Então, quando você olha o crescimento econômico, ele te dá uma medida importante para combater o desemprego, por exemplo.”
Doutor em teoria econômica pela USP, o professor Joelson também ressalta que o Brasil atingiu esse resultado devido a algumas ações que deverão ter consequências no futuro.
“Ter um superávit primário é um resultado positivo. Ele é, claro, um mérito do governo, mas não só: quando você tem um período de crise, você tem um congelamento de salário dos servidores públicos que contribui muito nesse papel, porque eles têm um peso importante no orçamento público. Então, provavelmente, em algum momento futuro, isso vai ter que ser revertido. E vai ter impactos também no resultado primário.”
Analisando os dados das contas públicas brasileiras em 2021 é possível ver que os responsáveis pelo resultado positivo foram os estados e municípios que terminaram com saldo positivo. Enquanto estados e municípios terminaram com 97 bilhões e 694 milhões de reais em caixa, o governo federal terminou com um saldo negativo de 35 bilhões e 872 milhões de reais. A soma de todos esses dados é um fluxo positivo nas contas públicas brasileiras de 64 bilhões e 727 milhões de reais em 2021, dado apresentado na reportagem utilizada na postagem checada pelo Comprova.
“O protagonista desse superávit primário foi, claramente, o conjunto dos governos subnacionais, estados e municípios, os quais ao longo de 2021 puderam arrecadar mais recursos, especialmente por meio de ICMS associado aos combustíveis. Estes, por sua vez, como sabemos, tiveram um aumento ao redor de 50% ao longo do ano em valor”, ressalta Fernando Ribeiro Leite, professor do Insper com experiência em macroeconomia da América Latina.
Resultado fiscal x PIB x crescimento econômico
A postagem checada faz uma analogia equivocada entre resultado fiscal, PIB e crescimento econômico. Apesar de todas serem importantes parâmetros da economia elas não são interligadas e dependentes umas das outras.
“O resultado fiscal considera as receitas e despesas primárias do governo. Basicamente é arrecadação contra despesa orçamentária. Ele é importante para o país porque dá uma ideia se o quanto o governo conseguiu gerar de receita foi suficiente para arcar com as suas despesas”, explica o professor Joelson Sampaio.
Já o PIB é a soma de todos os bens e serviços produzidos em uma determinada região ou país. E o crescimento econômico é medido pelo aumento no PIB ou, para comparações com outros países, mede-se o poder de compra do cidadão. Quando é feita a análise do resultado do crescimento econômico na qualidade de vida das pessoas, temos o chamado desenvolvimento econômico.
“O resultado fiscal é mais uma questão de finanças públicas, que é importante no sentido de equilíbrio das contas, mas o que a gente precisa mesmo é ter mais crescimento econômico para combater o desemprego, que está bem alto e tem afetado milhões de famílias. Melhorar a renda também, houve uma perda de renda na crise. Todos esses aspectos acabam afetando o bem-estar das famílias. E uma variável importante para combate ao desemprego e melhoria de renda é o crescimento econômico, do PIB”, explica o professor Joelson Sampaio.
Desempenho das contas ao longo dos anos
O ano de 2021 foi o primeiro com superávit das contas públicas, ou resultado fiscal positivo, desde 2013. Nos sete anos anteriores o resultado foi o chamado déficit primário, quando sai mais dinheiro das contas dos governos municipais, estaduais e federal juntas do que entra.
Já o PIB de 2021 ainda não foi divulgado, mas a projeção é que tenha um pequeno crescimento depois de uma queda acentuada no ano anterior. Assim como no resultado fiscal, estados e municípios têm importante papel no crescimento do produto interno bruto.
“A recuperação da atividade econômica em 2021 — ainda que o PIB cresça 0,3% e é pouco, ele se recupera de um tombo de 4,5% em 2020. Então, há uma retomada do crescimento econômico e há um processo inflacionário que ajuda os governos subnacionais a alcançarem o superávit primário. O governo federal registrou déficit.”, coloca o professor Fernando Ribeiro.
Dívidas e juros
Além do fluxo de caixa, outro problema nas contas públicas são as dívidas e os juros. Se o ano fechou com um saldo em conta equivalente a 0,75% do PIB acumulado do ano até aquele momento, ou 64 bilhões e 727 milhões de reais, o país ainda teve de pagar os chamados juros nominais da dívida pública equivalentes a 5,17% do PIB, ou 448 bilhões e 391 milhões de reais, deixando um saldo negativo, o chamado nominal, de 383 bilhões e 664 milhões de reais, ou 4,42% do PIB.
Por que investigamos?
O Comprova faz checagem de conteúdos suspeitos relacionados às políticas públicas do governo federal, pandemia e eleições que tenham viralizado nas redes sociais. O conteúdo verificado teve mais de 7 mil interações no Facebook em apenas 3 dias..
São comuns as postagens que usam informações enganosas para favorecer o governo Bolsonaro. O Comprova já verificou que uma tabela sobre pagamento do Bolsa Família foi editada e retirada de contexto e que um boato usa pesquisa falsa para dizer que Bolsonaro lidera em todos os estados. Também foi comprovado que obras nas pontes na BR-158 foram feitas durante o governo atual.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Este conteúdo foi investigado por CNN Brasil, Metrópoles, Nexo e Rádio Band News. A investigação foi checada por Jornal do Commercio, O POVO, CBN Cuiabá, O Popular e Estadão
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