Facções cobrariam até R$ 60 mil para permitir campanhas em bairros de Sobral
Candidatos a vereador no município afirmaram à Polícia Federal haver uma lista de políticos "permitidos" a fazer campanhas em bairros dominados por organizações criminosas
18:39 | Set. 24, 2024
As polícias Civil e Federal investigam relatos de postulantes à Câmara Municipal de Sobral, na Região Norte do Estado, denunciando que facções criminosas estariam restringindo campanhas nos bairros onde agem. O POVO teve acesso a depoimentos feitos por candidatos a vereador à PF ao longo deste mês de setembro. Dois deles afirmaram que as facções cobram R$ 60 mil para permitir campanhas eleitorais nesses territórios.
Alguns dos candidatos disseram desconhecer a situação. Já outros chegaram a afirmar que há, até mesmo, uma lista de políticos “liberados” para pedir votos nos territórios. Diversos políticos disseram que, por causa das ameaças, estão limitando suas campanhas.
Em uma das oitivas, um candidato a vereador disse que, há alguns meses, estava em um bairro da periferia de Sobral, mas não fazendo campanha, quando foi interpelado por um jovem. Este disse que “haviam mandado” que ele fosse embora. Após a ameaça, o candidato disse ter deixado o local.
Depois de “um tempo”, o candidato conta que recebeu recado de um desconhecido em que este afirmava ser preciso pagar R$ 60 mil para que a campanha dele no bairro fosse liberada. Por causa dessas ameaças, o político afirmou só estar fazendo campanha através das redes sociais ou, então, quando acompanhado da candidatura majoritária que apoia.
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Um outro candidato disse não ter testemunhado nenhuma interferência em campanhas eleitorais, mas que ouviu diversos rumores nesse sentido. Inclusive, ele afirmou que, na comparação com a campanha de 2020, tem notado “bem menos” candidatos fazendo campanha nos bairros Padre Palhano e Sumaré.
Em um terceiro depoimento, um candidato disse que um outro postulante lhe contou ter sido proibido de fazer campanha em seu próprio bairro. Nenhum candidato confessou ter efetuado pagamentos a faccionados nos depoimentos obtidos por O POVO.
Candidatos que apareceram na suposta lista de campanhas “liberadas” disseram desconhecer o porquê de seus nomes constarem nela. Um deles afirmou à PF que acredita que o trabalho social que faz nos bairros o permite ter livre trânsito nesses territórios.
Estariam praticando essas ameaças as facções criminosas Comando Vermelho (CV) e Primeiro Comando da Capital (PCC) — esta última organização, a partir de uma célula denominada “Irmãos Coragem”, grupo criminoso que age em Sobral desde os anos 2000. Em um dos depoimentos, um candidato afirmou que os Irmãos Coragem já haviam apoiado um candidato nas eleições de 2020, sendo que ele conseguiu eleger-se.
Ameaças contra candidatos a prefeitos de Sobral
Em Sobral, dois candidatos disputam o Executivo Municipal: Izolda Cela (PSB) e Oscar Rodrigues (UB). Ambas as candidaturas já relataram episódios de violência, supostamente, praticados por facções.
Um candidato a vereador afirmou à PF que um evento de Oscar Rodrigues no bairro Vila União foi cancelado em razão de ameaças feitas por criminosos. Já Izolda, chegou a ter atos de campanha impedidos após pessoas não identificadas dispararem fogos de artifício contra os participantes do ato.
Também houve o caso de um homem que foi preso após postar ameaças a Izolda em uma rede social. Kevin Henrique Lopes Cavalcante, de 36 anos, foi preso em 2 de setembro último.
Nesta terça-feira, 24, a Polícia Civil anunciou a prisão de mais dois homens suspeitos de ameaçarem a ex-governadora. As ações ocorreram em Sobral e em Itaitinga (na Região Metropolitana de Fortaleza) e ainda resultaram em uma prisão em flagrante por tráfico de drogas. Os nomes dos suspeitos não foram divulgados.
Foram expedidos, ao total, cinco mandados de prisão e 17 de busca e apreensão. Dois dos alvos estão no Rio de Janeiro (RJ) e seguem sendo procurados.
"Havia um grupo de WhatsApp criado com o objetivo específico de atacar os eleitores da candidata que participavam de comícios”, afirmou, em entrevista coletiva realizada nesta terça, o delegado Marcos Aurélio Elias de França, diretor da Polícia Civil no Interior Norte.
No dia 13 de setembro, já havia sido deflagrada a operação Demote, que também mirava ameaças a políticos feitas por facções em Sobral. Na ocasião, foram cumpridos 20 mandados de busca e apreensão, não só em Sobral, mas também em Fortaleza e Caucaia (Região Metropolitana de Fortaleza). Com duas mulheres, foram apreendidos R$35.067,00 e R$ 19.365,00 em espécie.