Quadrilha junina cearense homenageia Dandara dos Santos e minorias
"Dandara presente! Parem de nos matar! Eu sou Cíntia Freitas, sou mulher trans e eu faço parte desta sociedade", brada a rainha da quadrilha
19:02 | Jun. 02, 2018
[VIDEO1]Dandara dos Santos, travesti espancada até a morte ano passado no bairro Bom Jardim, está presente nas apresentações da quadrilha junina Girassol do Sertão, de Flores, distrito de Russas, interior do Ceará. Ela é representada pela mulher trans Cíntia Freitas, a rainha da quadrilha. A moradora de Limoeiro do Norte é uma das primeiras rainhas transsexuais de grupos tradicionais cearenses de festa junina.
Os últimos momentos da travesti que teve sua vida ceifada em março de 2017 aparecem na dança. Três homens cercam Cíntia e fazem gestos de violência. Ao fim do ato, um outro aparece com um carrinho de mão, ferramenta usada para carregar Dandara pouco antes de morrer. A rainha então volta, sobe em uma alegoria, já com novas vestes e brada: "Dandara presente! Parem de nos matar! Eu sou Cíntia Freitas, sou mulher trans e eu faço parte desta sociedade!"
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Com o tema "Minha manifestação cultural também é política", a Quadrilha Girassol do Sertão, que completa dez anos em 2018, levanta neste circuito junino temáticas político-sociais relacionadas às minorias em suas apresentações. Alex Xavier, presidente do grupo, avalia que as quadrilhas juninas também têm poder de transformar e formar opinião. "O movimento junino, um dos maiores do País e muito forte no Nordeste, não está alheio diante dessas transformações que o Brasil sofre. Neste ano, queríamos fazer uma temática atual e que manifestasse apoio às minorias."
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O presidente da Girassol do Sertão conta que de início houve muita dúvida e impasses. Xavier relata que, por ser um tema delicado e com uma rainha trans em destaque, julgamentos poderia acontecer. "Superamos até nosso próprio preconceito. Culturalmente, a figura da rainha é como se fosse a mulher mais bonita da festa. Escolher uma mulher trans era arriscado, ainda mais no interior e em um distrito pequeno, que é muito tradicional, mas aceitamos o desafio", relata.
A quadrilha estreou na última quinta-feira, 31, na quadra da Escola Maria de Lurdes em Flores. Na última sexta-feira, 1º, foi a vez de tomar a Praça de Flores durante a festa do Sagrado Coração de Jesus. Alex Xavier conta que a reação foi a melhor possível e diz ainda que no fim da apresentação o padre subiu ao palco e aplaudiu. "Foi uma surpresa. Por ser cidade de interior as pessoas ainda são muito conversadoras".
Em sua composição, a temática ainda aborda temas como a ditadura militar e a repressão policial sofrida no período. Com 40 pares dançantes, a Girassol do Sertão está entrando no circuito de competições a partir deste domingo, 3, na espera de contar pontos para representar o Ceará em uma competição regional em junho. No próximo dia 14, a quadrilha está com apresentação marcada no São de João de Maracanaú, um dos mais tradicionais no Estado.
Representatividade
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Cíntia Freitas, 26, começou a dançar em quadrilhas em 2009, mas não do jeito que sempre sonhou. Mulher trans, ela ainda não tinha começado a transição e dançava como homem. "Depois de idas e vindas do grupo, em 2014, eu já tinha começado a transição e falei que não dançaria mais de homem e acabei ficando só nos ensaios. Um dia precisaram de uma reserva e só tinha eu. Desde então danço como mulher", conta em entrevista ao O POVO Online.
"É uma honra pra mim representar toda a comunidade LGBT. Ser rainha de quadrilha sempre foi meu sonho. É muito difícil uma travesti ou uma trans dançar em quadrilhas tradicionais. A proposta surgiu e eu não tive como dizer não". A moradora de Limoeiro do Norte avalia que se sentiu em outra realidade quando começou a dançar como mulher nas festas.
Representando Dandara, ela se diz "honrada e muito feliz" de fazer parte do circuito deste ano. "Me sinto realizada", finaliza.
Confira vídeo completo da quadrilha apresentada na última quinta-feira:
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