Dois anos após tragédia em Milagres, 20 policiais estão sendo processados
Uma tentativa de assalto a dois bancos no município de Milagres, distante 482,5 km de Fortaleza, terminou com 14 pessoas mortas em dezembro de 2018Há dois anos, a pequena cidade de Milagres, com aproximadamente 30 mil habitantes, no interior do Ceará, era marcada por sua maior tragédia. Uma tentativa de assalto a dois bancos naquele 7 de dezembro terminou com 14 pessoas mortas. De lá pra cá, quase 20 policiais estão sendo processados por envolvimento na chacina e cinco pessoas foram denunciadas por crime de fraude.
Naquela madrugada, um grupo criminoso fez reféns na tentativa de assaltar agências do Banco do Brasil e do Bradesco no município localizado na região do Cariri por volta das 2h17min. Conforme a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) informou no mesmo dia, 14 pessoas morreram após troca de tiros intensa. Dessas, seis eram reféns e as outras seriam criminosas.
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A Polícia Rodoviária Federal (PRF) informou que o grupo criminoso roubou um caminhão, usado para interditar a BR-116, no Km 495, trecho entre os municípios de Brejo Santo e Milagres no sentindo de atrasar ações policiais. A via só foi liberada durante o dia.
O então titular da SSPDS, André Costa, chegou a anunciar a prisão de três pessoas suspeitas de participação no crime. Na época, a polícia afirmou que já investigava a quadrilha interestadual de ataque a bancos. No mesmo dia, o prefeito Lielson Landim disse que duas crianças estavam entre os mortos.
A rotina na cidade mudou. Conforme moradores relataram na época da tragédia, a normalidade só voltou a se desenhar depois de cerca de três semanas. Marcas dos tiros ainda eram visíveis em postes de energia da cidade e moradores evitavam circular à noite nas ruas. Houve inclusive quem gastasse com câmeras de vigilância.
Denúncia
No dia 20 de maio de 2019, o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) ofereceu denúncia contra 19 policiais e o vice-prefeito de Milagres, Abraão Sampaio de Lacerda. Quinze policiais foram acusados de homicídio qualificado. Outros quatro, além do vice-prefeito, foram acusados de fraude processual.
Ação do MPCE mostra que os ferimentos que causaram as mortes de cinco reféns foram provocados por disparos de fuzil. Esses disparos, conforme a ação, foram efetuados por policiais. Na época da denúncia, a Justiça retirou o sigilo da investigação.
"Não há como negar que, ao efetuarem três dezenas de tiros de fuzis contra pessoas indefesas, num momento em que não existia confronto entre assaltantes e policiais, e em que os reféns tentavam se abrigar por trás de um poste, os denunciados assumiram conscientemente o risco de produzir as suas mortes, devendo, portanto, receber as sanções pela prática de cinco crimes de homicídio por dolo eventual", cita a Ação.
O que diz a Justiça
A Ação Penal ainda tramita na Vara Única da Comarca de Milagres. Em setembro de 2019, o Juízo da Comarca determinou aos réus a proibição de realização de serviço externo ou ostensivo e de participação em operações policiais. Os policiais continuam afastados das atividades.
Em nota, o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) informou que cinco acusados não haviam apresentado defesa preliminar e o fizeram apenas em abril deste ano, após o Juízo nomear dois defensores para defendê-los. "Em julho deste ano, em decisão monocrática, foi denegado o Mandado de Segurança Criminal impetrado por um dos acusados", diz a nota.
O processo contra 20 acusados é complexo, contendo mais de três mil páginas. "Apenas após a apreciação de todos os recursos cabíveis, se for mantido e decidido que o processo deverá seguir para a competência do Tribunal de Júri, o Juízo da Vara Única de Milagres irá deliberar por pronunciar os réus ou proferir outra decisão cabível conforme a prova produzida sob o crivo do devido processo legal, ampla defesa e do contraditório", completa o TJCE.
Também em nota, a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD) informou que "os processos disciplinares para apuração na seara administrativa referente ao caso ocorrido no município de Milagres encontram-se na fase de instrução processual, conforme portarias publicadas no Diário Oficial".
A CGD também confirmou que os policiais militares envolvidos na tragédia continuam afastados da função operacional.
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