Justiça determina afastamento de diretores de presídio em Itaitinga
Descumprimento a decisões judiciais e relatos de desrespeito a direitos de presos e advogados motivaram o afastamento dos dois profissionais
19:04 | Jul. 19, 2024
A Justiça determinou nessa quinta-feira, 18, o afastamento de dois diretores da Unidade Prisional Unidade Prisional Professor José Jucá Neto (UP-Itaitinga 3), localizada na Região Metropolitana de Fortaleza. A decisão é motivada por “reiterada desobediência às determinações judiciais”, afirma o juiz Raynes Viana de Vasconcelos, corregedor-geral de Presídios da Comarca de Fortaleza.
Conforme afirmado pelo magistrado na decisão, a qual O POVO teve acesso, os diretores desobedeceram ordens judiciais que diziam respeito à necessidade de justificar e individualizar a imposição de sanções aos presos, como o isolamento disciplinar cautelar. Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização (SAP) disse que respeita, mas "discorda" da decisão.
Além disso, os policiais penais também teriam violado prerrogativas de advogados de presos e desrespeitado direitos dos internos.
O juiz-corregedor narrou que estava em vigor uma medida cautelar determinando que diretores de presídios do Estado teriam de pagar R$ 1.000 por cada preso submetido a isolamento preventivo que não observasse normas legais.
Entre as questões que deveriam ser levadas em conta pelos policiais penais para aplicar o isolamento estão a comunicação, em 24 horas, do isolamento do preso à Justiça e à defesa dele. Na comunicação, o diretor teria que descrever e individualizar o motivo que levou à aplicação da medida, sendo que também não poderia privar o detento de outros direitos, como receber visitas, trabalhar e estudar.
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Entretanto, conforme o magistrado, na UP-Itaitinga 3, esses parâmetros não foram observados. Entre 19 de junho e 16 de julho deste ano, a unidade prisional aplicou o isolamento preventivo a 460 internos, número muito maior, por exemplo, que o registrado na Unidade Prisional Professor Sobreira Amorim, também em Itaitinga, cuja população prisional é semelhante e onde foram 20 detentos que receberam a sanção.
O magistrado ainda apontou que as justificativas apresentadas pelos diretores para o isolamento são, “em regra, genéricas” e não demonstram a "efetiva necessidade do recurso". Para embasar a decisão, o juiz listou casos como o da suspensão do direito à visitação de todos os 275 detentos da Ala C por um episódio de indisciplina ocorrido em 7 de julho.
“A informação remetida consta apenas genericamente sobre a aplicação da medida, sem sequer especificar os internos atingidos, as condutas individualizadas ou a necessidade da providência cautelar”, argumentou.
Desrespeito a direitos de presos e advogados
No que diz respeito à violação de prerrogativas da advocacia, a decisão menciona ofício da Ordem dos Advogados do Brasil — Seccional Ceará que denuncia a instalação de câmeras no parlatório da UP Itaitinga 3.
"A implantação de câmeras em local destinado ao atendimento dos presos por advogados descumpre normativas nacionais, consideradas cláusulas pétreas, bem como diplomas internacionais dos quais o Brasil é signatário", consta na decisão.
Em relação ao desrespeito aos direitos dos presos, o juiz descreveu que ter recebido "reiteradas reclamações" dos presos que diziam não serem levados ao banho de sol.
Também foi mencionado o caso de um detento que voltou de atendimento em hospital e, mesmo com recomendação médica de que ele deveria ser mantido em observação, foi novamente colocado em cela. “A apatia do interno e a necessidade de verificação sobre seu estado de saúde eram evidentes”, disse.
Por fim, o magistrado salientou que a existência de dez processos em trâmite perante a Corregedoria de Presídios para apuração de denúncias de maus tratos em tese perpetrados na UP Itaitinga 3 entre os anos de 2019 a 2024. Em alguns desses casos, os próprios diretores da unidade são investigados.
“Pois bem, como já posto, faz-se imperiosa a adoção de providências eficazes ao restabelecimento do estado de legalidade na UP Itaitinga 3, o que não vislumbra esse juízo ser possível com a permanência à frente da sua gestão dos atuais diretor e diretor adjunto, por todos os fatos acima expostos, que evidenciam reiterada desobediência às determinações judiciais, assim como a própria inépcia para atuar para a manutenção da ordem e disciplina no estabelecimento, mas também para a garantia de direitos básicos das pessoas ali privadas de liberdade”.
O afastamento tem duração prevista até decisão posterior mediante acompanhamento das investigações sobre as irregularidades apontadas. Enquanto isso, todas as sanções impostas aos presos estão suspensas.
Posicionamento da SAP
Em nota, a SAP afirmou que os presos lotados na UP-Itaitinga 3 "são pertencentes a diferentes organizações criminosas e respondem por diversos crimes". A pasta disse confiar "totalmente" na direção da unidade e que “espera que a Justiça possa reverter sua decisão no objetivo de contribuir no enfrentamento ao crime organizado e a paz almejada pela sociedade cearense”.